Perante a guerra na Ucrânia, o presidente da câmara municipal (CM) do Fundão, Paulo Fernandes, sublinha, em entrevista à Smart Cities, que a resposta de acolhimento e solidariedade aos refugiados não só é “humanitária”, mas é também uma “resposta ao maior desafio que o país atravessa, que é demográfico”. “Se queremos ser mais competitivos, sejamos territórios de acolhimento”, afirma o autarca, defendendo a priorização desta questão nos municípios portugueses.
A guerra na Ucrânia já trouxe para Portugal mais de 33 mil pessoas, segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), entidade que adianta também que, pelo menos, 2448 já saíram de território nacional. “Há sempre alguma flutuação – pessoas que estão a chegar e outras que partem”, diz o autarca do Fundão. À data de 21 de Abril, havia cerca de 150 pessoas nestas condições no Fundão, sendo que, formalmente – isto é, ao abrigo de pedido de protecção temporária – estavam a ser acolhidos, neste município, 131 refugiados ucranianos.
Para o Fundão, o acolhimento não é apenas uma questão de solidariedade. “Tínhamos uma obrigação extra”, afirma Paulo Fernandes, evocando o mote do concelho enquanto “terra de acolhimento” de migrantes de diversas origens, incluindo refugiados.
Actualmente, 10% da população do concelho é de origem estrangeira, num total de 67 nacionalidades. O posicionamento é estratégico para o município, que, marcado pela diáspora, se vê confrontado com a crise demográfica. “Até há cinco, seis anos, nós tivemos sempre saldos migratórios muitíssimo negativos. (…) Essa curva começou a inverter-se fruto da estratégia [de inovação e de acolhimento] que fomos desenvolvendo”. Neste sentido, numa situação de crise de refugiados, o autarca aproveita para lembrar que os programas de acolhimento no paradigma municipal são, além de uma resposta “humanitária”, uma “resposta ao maior desafio que o país atravessa, que é demográfico”.
Reforçando que, “independentemente destas crises de refugiados, que são obviamente tão gravosas, há um problema demográfico em todo o território nacional”, o representante da CM Fundão apela aos municípios portugueses, “sobretudo aos mais pequenos, mais rurais, mais no interior do país”, para que planeiem o acolhimento de migrantes.
“Recebemos mais do que [aquilo que] damos quando recebemos refugiados (..) [nomeadamente pelo] salto que damos em internacionalização, na capacidade de entender o mundo, na capacidade das nossas instituições e empresas e na sua percepção da importância da responsabilidade social como forma de serem mais competitivas, nas questões de requalificação e de carência de mão-de-obra”, refere, sendo perentório: “se queremos ser mais competitivos, sejamos territórios de acolhimento.”
Total disponibilidade para “partilhar e aprender com os outros”
Entre as respostas em várias vertentes que o acolhimento de refugiados vindos da guerra na Ucrânia exige aos municípios, o caminho do Fundão tem passado pela mobilização de recursos municipais e da população fundanense, promovendo desde corredores humanitários e um programa de acolhimento baseado num programa de inovação de IT, à criação de bolsas de acolhimento, de ofertas de emprego, passando ainda por acções de apoio psicológico e de integração de crianças e jovens nas escolas e por acções de formação e capacitação de adultos.
A nível de infraestruturas, o município dispõe ainda de um centro de apoio às migrações, com uma valência, entre outras, de apoio directo a refugiados, que estão a receber há pelo menos quatro anos. O centro, que estava a sofrer intervenções, entretanto aceleradas com a guerra na Ucrânia, disponibilizou uma ala para cerca de 120 desalojados ucranianos. Estes, explica, “estão a ser apoiados directamente a partir do seminário”, por uma equipa multidisciplinar, não só nas necessidades básicas, mas também em termos de “empreendedorismo e formação” para que se possa, assim, acelerar os processos de autonomia destas pessoas.
Além deste centro de migrações, que acolhe refugiados, estudantes provenientes do estrangeiro e trabalhadores temporários, sobretudo agrícolas, o edifício do antigo Seminário é também a casa do Centro de Capacitação para Nacionais de Países Terceiros, criado em 2021 para promover a integração no mercado de trabalho e a inclusão social destes indivíduos. No âmbito deste novo centro, a autarquia conseguiu obter, no ano passado, uma comparticipação de 636,3 mil euros, por parte da secretaria-geral do ministério da Administração Interna para financiar um programa de capacitação, formação e acolhimento na cultura portuguesa para migrantes.
Acreditando que a experiência prévia tem sido uma vantagem nesta situação de acolhimento massivo, o presidente da CM do Fundão mostrou-se, por fim, totalmente disponível para “partilhar e aprender com os outros [municípios]”, realçando a oportunidade para se operacionalizar a rede de municípios para que possa haver uma aprendizagem mútua.