Por:
Marta Magalhães (Ponto de Contacto Urbano nacional da EUI)
A urbanização transformou o território na Europa, com um aumento de superfícies impermeáveis que intensificam o escoamento das águas pluviais e amplificam os riscos de inundação. Combinados com os impactos das alterações climáticas, como uma maior frequência de precipitações extremas, secas prolongadas e subida do nível do mar, estes fatores representam desafios complexos. O envelhecimento das infraestruturas, práticas ineficazes de gestão da água e a fragmentação da governança somam-se às dificuldades que se colocam à sustentabilidade hídrica urbana.
É para ajudar a encontrar soluções para estes desafios que surge a Parceria ‘Cidades Sensíveis à Água’ (Water Sensitive City) da Agenda Urbana para a União Europeia (UAEU), coordenada pela Comunidade Intermunicipal (CIM) Região de Coimbra e empenhada no desenvolvimento e implementação de ferramentas, medidas e mecanismos de governança que favoreçam a criação de sistemas de drenagem urbana sustentável, a reutilização de água, a instalação de sistemas de armazenamento para a conservação hídrica, a construção de modelos de gestão urbana sensível à água e a promoção de abordagens integradas.
Alicerçada nos Acordos de Gijón de 2023 e formalmente validada em 27 de novembro de 2024, na reunião dos Diretores-Gerais para os Assuntos Urbanos dos Estados-Membros da União Europeia, realizada em Budapeste, a Parceria ‘Cidades Sensíveis à Água’ encontra-se agora a dar os primeiros passos do seu desenvolvimento e implementação.

À semelhança das demais parcerias temáticas da Agenda Urbana, esta nova Parceria estrutura-se em torno do fortalecimento dos três pilares fundamentais das políticas da União Europeia: melhor regulação, melhor financiamento e melhor conhecimento. Para concretizar estes propósitos na transformação da gestão hídrica em áreas urbanas, a Parceria ‘Cidades Sensíveis à Água’ prioriza:
- Simplificar políticas e regulamentações para incentivar práticas urbanas sustentáveis, integrando a gestão da água com sectores estratégicos, como o planeamento urbano, a biodiversidade, a habitação e a economia circular;
- Mobilizar recursos financeiros por meio de programas como o Horizonte Europa, LIFE, Interreg e outros instrumentos relevantes, assegurando financiamento para soluções integradas e ajustadas às necessidades locais;
- Reforçar o conhecimento através de redes de aprendizagem entre pares, estratégias baseadas em dados, ferramentas digitais e ações de capacitação, promovendo a eficiência e a adoção de medidas inovadoras, especialmente em cidades de pequena e média dimensão.
A Parceria destaca também a relevância de soluções colaborativas e de uma abordagem de governança multinível, promovendo a articulação de esforços aos níveis local, regional e nacional, para abordar os desafios da gestão hídrica de forma integrada. O processo de seleção dos parceiros foi cuidadosamente delineado para garantir uma composição diversa e representativa, reunindo 22 parceiros provenientes de diferentes Estados-Membros, abrangendo autoridades nacionais, autoridades urbanas, organizações de âmbito nacional e europeu, bem como instituições europeias e entidades técnicas especializadas.
Entre este vasto leque de parceiros, encontram-se cidades como Haia (Países Baixos), Turim (Itália) e Elche (Espanha), que trazem experiência prática na gestão urbana da água. Autoridades nacionais, como o Ministério do Desenvolvimento Regional da Chéquia e o Ministério do Clima da Estónia, representam o compromisso governamental com a sustentabilidade hídrica. Organizações europeias, como o Conselho de Municípios e Regiões da Europa (CEMR), fortalecem a troca de boas práticas e promovem a cooperação intermunicipal. Instituições da Comissão Europeia, como a Direção-Geral da Energia (DG ENER) e a Direção-Geral do Ambiente (DG ENV), asseguram a coerência com os enquadramentos políticos e estratégicos europeus. Entidades especializadas, como a Empresa Municipal Águas e Energia do Porto (Portugal) e o Centro Tecnológico da Água (Espanha), fornecem a sua experiência em soluções inovadoras e tecnológicas.
Enquanto coordenadora, a CIM Região de Coimbra assume um papel central na operacionalização das metas da Parceria, integrando abordagens integradas e inovadoras nos seus projetos regionais e promovendo colaborações estratégicas que ampliam o impacto da iniciativa em Portugal e na Europa. Este papel permite à CIM liderar pela implementação de abordagens que interligam biodiversidade, ordenamento do território, economia circular e planeamento urbano, posicionando a região como um exemplo em gestão sustentável da água e reforçando também o alinhamento das suas ações com os objetivos mais amplos da União Europeia em matéria de sustentabilidade urbana.
CIM Região de Coimbra como parceiro-coordenador
O nosso país tem registado uma forte participação nas parcerias temáticas da Agenda Urbana, com municípios, comunidades intermunicipais e outras entidades portuguesas a integrarem 10 do total de 20 parcerias criadas desde 2016. A CIM Região de Coimbra participa não apenas como coordenadora da Parceria ‘Cidades Sensíveis à Água’, mas também como parceiro nas Parcerias ‘Cultura e Património Cultural’ e ‘Turismo Sustentável’, contribuindo com a sua experiência regional e reforçando o intercâmbio de boas práticas e a construção de redes colaborativas no espaço europeu.
Nesta nova Parceria, a CIM pretende mobilizar o conceito de ‘Water Sensitive City’ de forma integrada na sua estratégia para a Região de Coimbra, incorporando-o nos instrumentos de política pública desenvolvidos para promover a sustentabilidade hídrica e a resiliência climática no território, como o Plano Intermunicipal de Adaptação às Alterações Climáticas (PIAAC) e a Estratégia Integrada de Desenvolvimento Territorial (EIDT). Das iniciativas em curso, destaca-se a Gestão da Bacia Hidrográfica do Rio Ceira, financiada pelo Programa EEA Grants, que promove a resiliência hídrica através da requalificação de margens e açudes, da gestão sustentável dos recursos hídricos e da implementação de soluções baseadas na natureza.
Acrescem os investimentos realizados no anterior período de programação europeu, no âmbito do Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR), que têm contribuído para a modernização de redes de abastecimento e drenagem, bem como para a redução de perdas de água, com recurso a sistemas inteligentes de monitorização. No atual quadro comunitário, o Programa Regional do Centro (Centro 2030) oferece novas oportunidades de financiamento, que permitirão reforçar estas ações com um enfoque na resiliência climática e na eficiência hídrica.
De acordo com Jorge Brito, Secretário Executivo Intermunicipal da CIM Região de Coimbra, «O conceito de ‘Cidade Sensível à Água’ orientará ações que promovam a resiliência hídrica através do desenvolvimento e aplicação de soluções baseadas na natureza, maior eficiência no uso da água e a sua integração no planeamento urbano e territorial». Estas iniciativas têm como objetivo não apenas melhorar a capacidade do território em responder a desafios climáticos, mas também sensibilizar as comunidades para a importância de uma gestão sustentável da água, «com benefícios tanto a nível local quanto nacional, criando exemplos replicáveis noutras regiões».
A CIM Região de Coimbra identificou já três desafios prioritários: a escassez hídrica, a modernização das infraestruturas e a necessidade de uma maior articulação entre diferentes níveis de governança. Para superá-los, aposta num modelo de governança multinível e colaborativo, envolvendo municípios, entidades regionais e partes interessadas. «A CIM alinhará a estratégia territorial com programas europeus, para garantir acesso a financiamento, troca de conhecimento técnico e partilha de boas práticas», sublinha o Secretário Executivo Intermunicipal.
A coordenação da CIM Região de Coimbra na Parceria ‘Cidades Sensíveis à Água’ representa simultaneamente um reconhecimento pelo trabalho já desenvolvido nestes domínios e uma plataforma estratégica para afirmar a região como referência em inovação na gestão sustentável da água e na resiliência climática.
Apoio da Iniciativa Urbana Europeia
Neste período de programação 2021-2027, o apoio prestado pela Iniciativa Urbana Europeia (European Urban Initiative, EUI) abrange todas as fases de implementação das parcerias temáticas da Agenda Urbana, desde a criação da nova Parceria até à implementação eventual de formas de cooperação ad hoc, culminando na execução do Plano de Ação da Parceria. Este apoio visa garantir uma implementação eficiente da Parceria, fortalecer capacidades e promover a colaboração entre as diferentes partes interessadas.
A Direção-Geral do Território (DGT), na qualidade de Ponto de Contacto Urbano (UCP) nacional da EUI, facilita a conexão entre as iniciativas da Agenda Urbana e as partes interessadas nacionais. O UCP Portugal apoia também os coordenadores e parceiros nacionais envolvidos nas parcerias, promovendo a disseminação de informações relevantes sobre os avanços e os resultados alcançados. Um dos objetivos centrais é ampliar o alcance destas parcerias temáticas, sensibilizando outras cidades e entidades portuguesas para as oportunidades disponíveis e assegurando que os benefícios e as atividades sejam amplamente promovidos e disseminados
Ao integrar este conjunto de recursos e apoios, a Parceria ‘Cidades Sensíveis à Água’ encontra-se mais bem preparada para enfrentar os desafios da sua implementação. A sua abordagem integrada e multissectorial e o alinhamento com as prioridades estratégicas da União Europeia, como o Pacto Ecológico Europeu e a Política de Coesão, reforçam o compromisso de criar cidades hidricamente mais resilientes e sustentáveis.
Este artigo resulta de uma parceria com a DIREÇÃO-GERAL DO TERRITÓRIO e foi originalmente publicado na edição n.º 46 da Smart Cities – janeiro/fevereiro/março 2025, aqui com as devidas adaptações.
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