Muito mais que um caminho para criar cidades inteligentes e eficientes. Na opinião de Giorgia Rambelli, diretora da Urban Transitions Mission (UTM), uma organização global dedicada à descarbonização urbana, a digitalização também pode e deve contribuir para a sustentabilidade das cidades. Por ocasião do Digital With Purpose Global Summit, que decorre até quinta-feira em Cascais, a responsável da UTM lembrou que a tecnologia traz uma oportunidade única para as cidades e metrópoles.
“As soluções digitais, os dados e a inteligência artificial são ferramentas que podem ajudar a desbloquear todo o potencial da nossa transição, apoiando a descarbonização e a resiliência das comunidades, centradas nas pessoas, mas também ajudam a criar novos mercados que são uma oportunidade para novas soluções prosperarem”, afirmou Giorgia Rambelli no primeiro dia do evento, que tem a Smart Cities como parceiro de media.
Ainda assim, não deixou de lembrar que “as oportunidades devem chegar a todos”, e não apenas aos países ricos, sublinhando que é “importante pensar não só no Norte global, mas também no Sul global e nos desafios que estes diferentes mercados enfrentam quando estão a tentar aprender a usar a digitalização”.
E que desafios são esses? Giorgia Rambelli identifica três principais: melhorar a governança e as parcerias entre instituições; obter recursos que permitam desenvolver planos de ação; e conseguir aceder a dados de qualidade. Isto porque “muitas cidades não conseguem ter acesso a eles” e, mesmo estando disponíveis, “é preciso ter recursos para comprar uma ferramenta que ajude a analisar toda a informação”. A especialista reiterou, por isso, a necessidade de se disponibilizarem pilotos e soluções acessíveis a todos, até porque “este tipo de ferramentas tem um potencial incrível e pode criar um impacto real na vida das pessoas”.
Agir, mudar e ser mais rigoroso
Além das cidades inteligentes, a cimeira global Digital With Purpose (DWP) debate ainda outros três grandes temas: biodiversidade, educação e finanças sustentáveis. E também eles deram azo a vários alertas por parte dos especialistas. Helena Freitas, professora, Chair da UNESCO e investigadora na área da biodiversidade, lembrou que “vivemos tempos perigosos”, que reforçam a urgência de se proteger ecossistemas e restaurar habitats. “Temos de agir já, e depressa”, apelou, defendendo também “uma agenda digital que envolva uma relação eficiente entre a conservação da biodiversidade e o progresso tecnológico, assegurando que as ferramentas digitais e as inovações são realmente utilizadas nos esforços de conservação”.
Já no debate sobre educação, Veerle Vandeweerd, cofundadora da COVID Education Alliance (COVIDEA), também defendeu uma necessidade de mudança, isto “se quisermos preparar as nossas crianças para um futuro que será digital”. Para tal, “temos de dotá-las de conhecimento e ferramentas, e elas até já existem em muitas formas, até com o gaming”, acrescentou.
A especialista acredita ainda que é fundamental fazer mudanças no sistema bancário, de forma a evitar o greenwashing, um tema que Lucas Arangüena, do banco Santander, não deixou de abordar no mesmo painel. Para o gestor, este problema é real e existe em grande escala, por isso é preciso “ser mais rigoroso no modo de medir as finanças sustentáveis e na forma de catalogar uma empresa como ‘verde’ ou sustentável.”
O potencial da digitalização para os ODS
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) foram o denominador comum da sessão de abertura do DWP, com o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa a lançar o mote para a discussão. De acordo com ele, a digitalização tem grande potencial para gerar ganhos de produtividade e pode contribuir para acelerar “uma trajetória que está lenta”. “A digitalização, nomeadamente a inteligência artificial, oferece oportunidades que não existiam há 10, 20, 30 anos para o desenvolvimento sustentável”, afirmou o chefe de Estado numa declaração gravada em que também defendeu a necessidade de combater as desigualdades de acesso ao digital “ajudando os países mais pobres”.
Por sua vez, Luís Neves, CEO da Global Enabling Sustainability Iniatiative (GeSI), a entidade que organiza a cimeira, acredita que esta terceira edição venha a ser “um momento de ação”. Na opinião do responsável, a atual trajetória do mundo revela-se insustentável, mas é possível invertê-la, por exemplo através “do potencial que a digitalização pode trazer ao desenvolvimento sustentável”. E para isso, conclui, é preciso priorizar as necessidades humanas no processo de sustentabilidade global.
O Digital With Purpose prossegue esta quarta-feira (10/07) no Centro de Congressos do Estoril com dezenas de apresentações, debates e workshops. Cidades interconectadas e eficientes em recursos, o impacto das tecnologias digitais no clima e a inteligência artificial generativa são alguns dos temas em análise, no dia em que também será lançado o Portugal Blue Digital Hub. Já na quinta-feira (11/07) serão abordadas questões como as cidades inclusivas, a proteção da Amazónia ou a utilização de drones e da inteligência artificial no combate aos fogos florestais.