Metade da população mundial vive actualmente em zonas urbanas, estimando-se que esse número aumente para 60% em 2030. Este facto coloca enormes desafios ao fornecimento seguro de água doce e potável, nomeadamente ao nível das fontes, do tratamento, do armazenamento e da distribuição, a que se encontram também associados enormes consumos de energia.

Por outro lado, tendo em conta as alterações climáticas, estima-se que uma parte significativa da Terra e também da Europa, em particular a Península Ibérica, venha a sofrer de stress hídrico com cada vez maior frequência nas próximas décadas. Também os fenómenos extremos, como inundações, ou a subida do nível do mar colocam questões relativamente à resiliência dos sistemas de abastecimento.

De um modo geral, cerca de 80% da água potável consumida (150 litros diários per capita em Portugal) é devolvida ao sistema sob a forma de águas residuais, sejam águas de lavagens (as denominadas águas cinzentas), em cerca de 60%, sejam águas de sanitas (águas negras), os restantes 20%. Praticamente toda a água que utilizamos em nossas casas é água potável, o que significa que utilizamos água própria para beber, inacessível ainda em muitas regiões do nosso planeta, para descargas de sanitas. Determinados usos, nas nossas casas ou ao nível dos municípios e mesmo das empresas, como as descargas de  sanitas, mas também lavagens de pavimentos e de frotas automóveis ou a rega de jardins, poderiam perfeitamente ser realizados reutilizando essas águas cinzentas das lavagens.

Também as águas pluviais são completamente desaproveitadas. Nas nossas cidades, de um modo geral, não existem redes separativas, pelo que estas águas pluviais são encaminhadas junto com as águas residuais para as ETAR. A separação das redes de águas pluviais nos sistemas municipais permitiria, por um lado, a devolução dessas águas, não contaminadas, aos sistemas naturais (águas superficiais ou subterrâneas), diminuindo assim também os riscos de inundações urbanas, e, por outro, a possibilidade de se captar essas águas e as reutilizar para usos menos nobres, como os mencionados anteriormente em relação às águas cinzentas.

O Programa de Reabilitação Urbana, lançado recentemente pelo Governo, constitui uma oportunidade para se repensar a forma como utilizamos a água em nossas casas. Também os investimentos ao nível das infraestruturas de abastecimento e saneamento, que podem ser realizados em sede de POSEUR, deveriam contemplar estas questões.

A publicação deste artigo faz parte de uma colaboração entre a revista Smart Cities e a Associação ZERO.