Até 31 de dezembro do ano passado, todos os municípios portugueses deveriam ter implementado um sistema de recolha seletiva de biorresíduos (ou fazer a separação e reciclagem na origem), mas o processo está atrasado em diversas autarquias e outras ainda não começaram a fazê-lo, como determina a Diretiva-Quadro sobre Resíduos da União Europeia. A garantia é da associação ambientalista Zero que, mesmo sem dados oficiais, já identificou alguns casos de incumprimento.

“Sabemos que há quem não tenha começado. Temos conhecimento de municípios nas ilhas que ainda não o fizeram e mesmo no continente deve haver alguns na mesma situação, embora, para já, ainda não conseguimos dizer quais”, afirmou Ismael Cassotti Rienda , que encontra várias razões para o atraso. Entre elas está a falta de infraestruturas disponíveis que, em algumas situações, impossibilita a concretização da recolha seletiva de biorresíduos: “por exemplo, a AMCAL [Associação de Municípios do Alentejo Central] está a construir uma central de compostagem, por isso até ela estar pronta, o que pode demorar alguns meses, não vão recolher biorresíduos porque não vai haver destino para eles”. Noutros casos, “alguns municípios ainda podem estar em finalização de empreitadas, com os cadernos de encargos por terminar ou em fase de aquisição de viaturas, o que acaba por bloquear a implementação”, acrescenta o especialista da Zero em declarações à Smart Cities.

Segundo a associação, muitos municípios já começaram a implementar sistemas de recolha, embora boa parte o faça apenas de forma parcial, através de projetos piloto em algumas freguesias ou zonas do concelho. O problema é que “nem todos estão a correr bem ou a ser feitos da melhor forma”, defende Ismael Cassotti Rienda: “embora haja muitos contentores de biorresíduos pelas ruas, a verdade é que eles estão bastante vazios, com quantitativos pouco representativos e, enquanto isso, a recolha continua e os custos são elevadíssimos”.

Para ele, várias autarquias acabaram por tomar decisões precipitadas, nomeadamente na escolha do sistema a implementar, por isso o resultado final poderá acabar por ser contraproducente: “alguns municípios apressaram-se só para cumprir [a Diretiva Europeia], e efetivamente cumprem-na porque fazem a recolha de biorresíduos numa parte da cidade, mas o caminho escolhido nem sempre foi o mais acertado”.

As associações ambientalistas e especialistas do setor alertam para a grande importância da recolha seletiva de biorresíduos no contexto das metas de reciclagem, uma vez que estes representam quase 40% do total de lixo produzido no país.

Municípios comprometidos e apoios por aproveitar

Contactada pela Agência Lusa, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) diz que ainda não tem dados sistematizados sobre o número de municípios que já implementou (ou não) um sistema de recolha seletiva de biorresíduos, mas acrescenta que pretende “reunir essa informação através dos Planos de Ação de Resíduos Urbanos dos Municípios e Sistemas de Gestão de Resíduos Urbanos, que ainda estão a ser entregues, bem como do registo de dados no Mapa Integrado de Registo de Resíduos Urbanos referente ao ano de 2023”.

Também a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) desconhece o ponto atual da situação. Ainda assim, numa entrevista à Smart Cities realizada no final do ano passado, a presidente Luísa Salgueiro reconheceu que havia “necessidade de acelerar a implementação da recolha seletiva de biorresíduos”, nomeadamente “através da contentorização e de circuitos de recolha nos sistemas em baixa, mas também maximizando o uso da capacidade”. De qualquer forma, garantia que os municípios “estão comprometidos com este desígnio nacional, como evidenciam as experiências e os projetos implementados por todo o território nacional”.

Também nessa altura, a propósito de um artigo publicado na edição n. º 41 da revista, o ministro do Ambiente e Ação Climática, Duarte Cordeiro, admitia que o processo estava atrasado e lembrava a importâncias de “os municípios que não tenham iniciado percebam que estão a perder. Porque não terão tantos apoios como aqueles que, entretanto, o fizeram”. Uma alusão aos incentivos financeiros disponibilizados pelo Governo para que as autarquias desenvolvam sistemas de recolha seletiva, nomeadamente através da Taxa de Gestão dos Resíduos (TGR). Além disso, Duarte Cordeiro lembrou também que em 2024 haverá um aumento da “percentagem da taxa de que o município vai beneficiar em volume”, bem como uma simplificação de processos “para que todos os municípios saibam que têm aquele benefício” disponível.

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