Se tiver arranjo, há de sair a funcionar. Se não foi possível, também não vai para logo para o lixo. Primeiro, reutiliza-se, reaproveita-se, recicla-se. No Repair Café Almada, põe-se a economia a circular com meia dúzia de ferramentas, dois dedos de conversa e um encontro em comunidade onde não custa nada ser circular.

João Catarino e Tiago Catarino, pai e filho, não descansaram enquanto não descobriram o que se passava com a velha aparelhagem de Fernando Dias, que de um dia para o outro ficou muda e calada. O mais novo ainda nem era nascido quando aquele modelo apareceu, mas isso pouco importava. Chaves de fendas para aqui, parafusos para ali e, afinal, era… só trocar uns fios. Não fossem os dois voluntários do Repair Café Almada e, provavelmente, o aparelho teria acabado na rua, ao lado de um qualquer contentor e engrossando as 50 mil milhões de toneladas de lixo elétrico e eletrónico que se produz por ano no mundo. Menos sorte teve uma televisão, também de Fernando Dias, onde um circuito queimado mostrou logo que não havia nada a fazer. Ou havia? Claro que sim. Mesmo sem arranjo possível, no final do dia foi levada para um eletrão da cidade, onde são aproveitados todos os seus componentes com valor. Em ambos os casos, a economia circular funcionou: fechou-se o círculo, combateu-se a cultura do descartável e cumpriram-se os princípios essenciais da economia circular: Reduzir, Reutilizar e Reciclar.

Também se concretizou a missão do Repair Café Almada, que quase todos os meses abre portas num espaço da cidade para ajudar a população a reparar os seus objetos avariados ou sem uso. Umas vezes com mais pessoas, outras com menos (neste dia só apareceu Fernando), mas sempre de forma totalmente gratuita e com o apoio de técnicos especializados. A organização é da Câmara Municipal e da Oficina d`Almada (ODAM), uma associação local dedicada à promoção ambiental e à divulgação das novas tecnologias, sobretudo nas áreas da eletrónica, desenho assistido e fabricação 3D. Foi este know-how que lhe permitiu, por exemplo, fabricar algumas das primeiras viseiras que os serviços de saúde do concelho utilizaram durante a pandemia.

Nos vários repair cafes que já dinamizaram oito repair cafes, foram muitos os aparelhos que ganharam uma segunda vida, como torradeiras, ventoinhas, máquinas de café ou placas de indução. “A maioria das pessoas nem vem cá por questões financeiras, mas por razões ambientais, mesmo que não saiba exatamente o que significa o conceito de economia circular. E é isso que tentamos explicar-lhes, mostrando que o lixo não é um fim inevitável e que com as peças de alguns objetos conseguimos reparar outros”, diz João Catarino, fundador e coordenador da ODAM.

Agradecem os almadenses, como Fernando Dias, que além da aparelhagem a dar som, também levou para casa uma importante mensagem, como fez questão de dizer: “tal como as pessoas, também os objetos merecem uma segunda oportunidade. Porquê deitá-los fora se ainda podem ter muito para dar?”


Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 41 da Smart Cities – Outubro/Novembro/Dezembro 2023.