Com a promessa de “derrubar todas as barreiras que surjam à concretização de ideias”, a nova estratégia nacional para o empreendedorismo – programa Startup Portugal – acaba de ser lançada, pondo em marcha 15 motores de estímulo a projectos empresariais. O que pensarão as start-ups nacionais já instaladas no mercado sobre este novo boost governamental para tirar ideias do papel e que prioridades identificam?
A criação de uma Zona Franca Tecnológica – para o teste de carros que dispensam condutor, a título de exemplo; vouchers para incubação de empresas; um programa de aceleração público; a promoção das start-ups portuguesas em grandes eventos tecnológicos a nível gobal; o combate à burocracia entre a Administração Pública e as start-ups, através do programa Simplex; ou o lançamento de linhas de cofinanciamento com Business Angels e com fundos de capital de risco são algumas das medidas que fazem parte do programa Startup Portugal.
A par destas, estão ainda incluídas outras políticas, tais como a regulamentação de novas formas de financiamento – equity crowdfunding e peer-to-peer -, o lançamento dos programas Semente (para a criação de um regime fiscal mais favorável de tributação das mais-valias obtidas através do investimento em start-ups), e Momentum (para que recém-licenciados bolseiros possam usufruir de apoios para começar um negócio).
A iClio, por exemplo, considerada uma das 100 start-ups mais inovadoras da Europa graças aos seus guias turísticos “muito storytelling”, encara a iniciativa do Governo como uma forma de “enaltecer a visão de um ecossistema nacional, não apenas de alguns centros, porque há vida e inteligência em diferentes áreas do conhecimento em todo o território nacional, regiões autónomas e diáspora”; bem como um sinal de que “é vontade de Portugal continuar a apoiar os sonhos dos empreendedores”, como explica, à Smart Cities, Alexandre Pinto, CEO da iClio.

Uma vez que o país tem sido palco de “grandes iniciativas” de empreendorismo, nos últimos anos, a Supertech Portugal, empresa que desenvolveu um dispositivo “que reduz até 75% de gases emitidos para o ambiente e diminui até 12% o consumo de combustível”, vê esta estratégia como um passo lógico. “Torna-se uma exigência permanente existirem orientações actuais e estratégicas para que Portugal se destaque como um país que é, de facto, empreendedor”, realça Jorge Pires, director-geral da empresa. “Temos a iniciativa, a vontade e a visão, mas todos estes requisitos necessitam de ser alimentados com uma orientação próxima”, elucida.
As start-ups bem-sucedidas que se foram revelando nos últimos tempos e que ganharam vida num momento de “especial complexidade”, com recursos limitados, levam o CEO da iClio a concluir que, a partir de agora, “só podemos ambicionar mais sucesso com a melhoria das condições económicas e o reforço das medidas de apoio à inovação, transferência de tecnologia e internacionalização em diferentes áreas de negócios”.
Mas, atenção, alerta Alexandre Pinto, “há que valorizar uma cultura que não penalize os que deram o seu melhor mas não tiveram sucesso, porque esses, em grande medida, fazem parte de um contexto de aprendizagem, que melhora com os erros, amadurece com a experiência e educa com o exemplo de resiliência, abrindo horizontes que serão alvo das conquistas dos bem sucedidos”.
“Estamos confiantes que este novo programa tem em consideração todo o trabalho desenvolvido nos últimos anos por entidades que apoiam o empreendedorismo a nível nacional, algumas delas reconhecidas internacionalmente”, sublinha Clara Gonçalves, directora executiva do UPTEC – Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, que já apoiou o desenvolvimento de mais de 370 projectos empresariais de base tecnológica, científica e criativa. “Destas estruturas já emergiram empresas com elevado valor acrescentado, que transitaram para a fase de scale up, enfrentando actualmente novos desafios”, ressalva.
Necessidades de última hora
Lançados os dados da nova estratégia, quais são, então, as maiores necessidades das incubadoras e empreendedores que devem ser visadas? Vendo esta estratégia com “bastante optimismo e expectativa”, Paulo Santos, director executivo da incubadora de empresas do Instituto Pedro Nunes (IPN), lembra que são precisos estímulos “adequados e sustentados” ao nível do financiamento e fiscalidade, tal como se prevê nesta estratégia, mas também ao nível da qualificação e profissionalização das entidades de apoio aos empreendedores. Além disso, destaca, o sector “precisa, e muito, que o Estado e os seus organismos e instituições funcionem muito melhor em vários domínios: gestão e pagamentos de sistemas de incentivos, regulamentação económica, ambiental, laboral, etc”.
As necessidades não se extinguem, no entanto, por aqui. Para Paulo Santos são precisas “muito melhores condições de trabalho para as instituições públicas que apoiam os empreendedores no financiamento e execução dos seus projectos, que se vêem inundadas com enormes quantidades de trabalho e projectos para analisar sem terem os meios físicos e humanos adequados”. Mas há mais: é necessário, também, “nalguns casos, técnicos de instituições públicas de apoio ao empreendedor com outra atitude, que sejam mais amigos do investimento, que saibam realmente o que é uma empresa e um empreendedor e que tenham conhecimento e disponibilidade para distinguir o que é realmente importante do que é acessório, o que é uma decisão racional de gestão”, enumera Paulo Santos.
Do lado das start-ups, a iClio adianta que “o que os empreendedores mais precisam é de tempo” e, por essa razão, as medidas “mais sensatas” devem passar por “apoiar os períodos de incubação e aceleração, associados a crédito que possa ser utilizado em formação”, isto aproveitando as “redes de incubadoras e aceleradoras já instaladas e distribuídas pelo território nacional”.
Também a componente da formação, assim como a consultoria e acção orientada pelos “melhores especialistas das várias áreas necessárias” são, para a Supertech Portugal, ingredientes base para que cada negócio se possa desenvolver “de forma sustentada e competitiva”. Enquanto para o UPTEC, é “fundamental que esta estratégia contemple não só a nova geração de empresas, como também todo o património industrial em renovação, e aproveite o seu potencial a favor do programa Startup Portugal”.
A iClio, por seu turno, destaca também a necessidade de “aumentar o capital de risco disponível, por forma a que mais empresas, em fases distintas da sua evolução, possam ser apoiadas com maior intensidade, aumentando as suas taxas de sucesso, e potenciarem o retorno aos seus investidores”. Seria também relevante, na opinião de Alexandre Pinto, “a criação de vales que permitissem aos empreendedores obterem formação especifica complementar em universidades ou ensino politécnico, ou técnicos especializados”.
Recorde-se que, neste âmbito, a nova estratégia inclui dois sistemas de vales, o “Startup Voucher”, que visa apoiar jovens com formação universitária no desenvolvimento de projectos de negócio; e a distribuição de vales de incubação e de aceleração de empresas, nos próximos quatro anos, num montante de 10 milhões de euros – uma iniciativa que passou por uma tentativa de implementação sem sucesso no passado, como lembrou IPN.
Notícia actualizada às 16:55.