A Portugal voltou a acolher a maior cimeira de exploradores do planeta e, pelo segundo ano consecutivo, na cidade de Angra do Heroísmo, Açores. “O medo não deve superar a curiosidade” foi a tónica dos discursos de muitos dos oradores que passaram pelo palco da quinta edição da GLEX Summit. Uma cimeira que destacou a importância de a exploração ser uma ferramenta essencial para o progresso humano e a conservação do nosso planeta.
A “Davos” da exploração voltou a receber mais de uma centena dos mais reputados exploradores, cientistas e astronautas do planeta para discutir a importância e o futuro da exploração. Quatro dezenas deles (de 18 nacionalidades) partilharam as suas experiências e descobertas, no palco montado pela portuguesa Expanding no Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo.
Em memória de TITAN, um ano depois da implosão do submersível
O segundo dia da cimeira foi muito marcado pela memória de TITAN. Richard Garriott, recordou que, há um ano, Hamish Harding estava na GLEX Summit, na ilha da Terceira, e preparava-se para viajar a bordo do submersível TITAN para explorar o Titanic, no dia seguinte. O desfecho dessa história já é conhecido. “Algumas das pessoas que tentaram ajudar no resgate do submersível estão hoje aqui nesta sala”, afirmou, emocionado, o presidente do The Explorers Club.
Um astronauta que é uma lenda viva
Mike Massimino é um ex-astronauta da NASA e autor bestseller do New York Times. Veterano de duas missões no Vaivém Espacial e de quatro caminhadas espaciais, para além de ter sido a primeira pessoa a tweetar do espaço, detém o recorde da mais prolongada caminhada espacial numa única missão de Vaivém e completou, com sucesso, a mais complicada missão alguma vez realizada para reparar o Telescópio Espacial Hubble. Na GLEX Summit, o norte-americano admitiu: “Eu tinha medo de alturas e praticamente de tudo quando era pequenino. Mas queria ser como o Neil Armstrong! Tinha seis anos quando aterrámos na Lua, mas lembro-me bem desse momento e do quanto fiquei impressionado. Queria fazer o mesmo”. Mas para concretizar o sonho da infância foram muitos os obstáculos que teve de ultrapassar: “A NASA rejeitou-me três vezes, duas por carta e uma por ter falhado os testes de visão. Na época, ouvi falar de uns testes experimentais para melhorar a visão e fui falar com um optometrista. A princípio não me quis ajudar por a experiência ser só para crianças, mas eu insisti dizendo que era muito infantil (risos). Resultou, e consegui entrar no programa da NASA”.
Famoso paleoantropólogo Lee Berger revelou as origens da humanidade
Lee Berger é um famoso e premiado paleoantropólogo, cujas explorações sobre as origens humanas em África, Ásia e Micronésia, ao longo das últimas décadas, resultaram em muitas novas descobertas, incluindo as de duas novas espécies de antigos parentes humanos – Australopithecus sediba e Homo naledi. Estas descobertas científicas são consideradas das mais importantes deste milénio. Na GLEX Summit, admitiu: “Fui o primeiro humano no mundo a reconhecer a escrita de pré-humanos numa gruta, provavelmente um registo dos mortos colocados naquele lugar”. Uma câmara subterrânea onde estavam os crânios, dentes e ossos de uma espécie desconhecida de pré-humanos – Homo naledi –, com 2 milhões a 2.5 milhões de anos. A primeira vez na História que se encontrou uma tão grande quantidade das ossadas dessa espécie. “Hoje em dia o foco do meu trabalho está na África do Sul, pois é aí que se acredita que começou a humanidade”, reconhece Lee Berger.
O aumento da população humana está a afetar a vida selvagem
O trabalho de Andrea Presotto foca-se na cognição e na deslocação de primatas e elefantes. O seu principal objetivo é compreender como os animais se deslocam na natureza e quais os aspectos da paisagem que afetam as suas deslocações diárias. Em Angra do Heroísmo, a investigadora brasileira alertou: “As diferenças na paisagem afetam a deslocação dos animais selvagens. O aumento da população humana afetou mais do que nunca a forma como os animais selvagens lidam com a sua paisagem, as deslocações das espécies”.
Uma cientista que se apaixonou pelas vespas
A cientista Seirian Summer também integrou o painel de oradores da GLEX Summit, conhecida pelo trabalho desenvolvido a estudar os insetos, mas sobretudo vespas, até com o objetivo de mudarmos a nossa perceção em relação à espécie. Nesse sentido, fundou o Big Wasp Survey e publicou o livro “Endless Forms: Why You Should Love Wasps”. Na GLEX Summit, invocou sete motivos para gostarmos de vespas: “a diversidade (estão identificadas mais de 100.000 espécies de origens e famílias distintas); o serem assassinas (matam de mil formas diferentes e há uma espécie que mata baratas); por fazerem papel (poderão ter sido elas a ensinar-nos essa arte); serem seres sociais; serem fonte de medicamentos e de comida (há venenos de vespa que têm benefícios médicos e que têm potencial para tratamentos para o cancro, os seus ninhos de argila têm imensos benefícios nutricionais, tanto que, em África, as mulheres grávidas e as crianças arrancam os ninhos e comem-nos; controlam pestes e são polinizadoras”.
A importância dos oceanos e da arqueologia
Com mais de 25 anos de experiência, David Gallo tem estado na vanguarda da exploração oceânica, testemunhando o desenvolvimento de novas tecnologias e descobertas científicas que moldam a nossa visão do planeta Terra. “São os oceanos que nos dão o oxigénio, a água e a comida que precisamos. Não importa onde vivemos no mundo, são os oceanos que permitem viver como vivemos, mesmo que não os consigamos ver da nossa casa”. O americano não se coibiu de partilhar a sua inspiradora história de vida: “Quando andava na escola, fui diagnosticado com transtorno de défice de atenção e não tinha notas que me qualificassem para ser um cientista. Trabalhei em vendas, mas um dia estava a ver a revista National Geographic e uma imagem motivou-me a tentar novamente”. Voltou a estudar, entrou na universidade com o objetivo de explorar os oceanos e, hoje, é uma referência na área. Justin Walsh é professor de história da arte, arqueologia e estudos espaciais na Universidade Chapman e há quase uma década que é um dos membros do Projeto Arqueológico da Estação Espacial Internacional, uma iniciativa pioneira que investiga a cultura material dos habitats espaciais, em colaboração com Alice Gorman. Em Angra do Heroísmo, sublinhou: “É importante entender que a arqueologia não serve apenas para descobrir artefatos antigos, mas sobretudo para compreender como é que os humanos viviam”.
A destruição da Amazónia equivale a 45 ilhas da Terceira
Lvcas Fiat é designer naturalista, artista visual, conservacionista e explorador da National Geographic. Nascido no Brasil, é especialista em fotografar as noites escuras da Floresta Amazónica. Nas fotografias, este palestrante procura novos e raros louva-a-deus, além de testemunhar a beleza da vida selvagem ao lado de seu marido Leo Lanna. A missão do casal é proteger todas as espécies de louva-a-deus, por isso, tem cerca de 100 em casa – cuidando individualmente de cada um. Na GLEX Summit, Lvcas Fiat alertou: “O que estão a destruir da Amazónia é o equivalente a 45 ilhas da Terceira e tudo por causa da exploração da carne e da madeira”.
Um invisual que há 20 anos grava sons da natureza
O engenheiro bioacústico cego nascido no Uruguai, Juan Pablo Culasso trabalha há mais de 20 anos na gravação e divulgação de sons da natureza. Já publicou mais de 15 obras que retratam os sons de aves das Américas e dá palestras e cursos sobre natureza, turismo acessível e aves. Na GLEX Summit 2024, apresentou alguns dos mais fascinantes sons que capturou e partilhou a sua paixão pela natureza e os seus sons, e lembrou a audiência que devemos aprender a escutá-la, amá-la e preservá-la. Juntamente com a mulher, está a trabalhar para tornar trilhos e lugares na natureza acessíveis a pessoas invisuais, para que todos possam desfrutar da magia da natureza. E convidou a plateia a passear pela natureza, fechar os olhos e desfrutar da magia dos seus sons. “Todos nós, enquanto sociedade, temos de estar alerta sobre tudo o que estamos a perder na natureza. Todos nós perdemos com isso”.
A importância da curiosidade, das memórias e das distrações
Justin Fornal é um explorador, escritor e nadador de maratona. A sua investigação de campo centra-se sobretudo em rituais, têxteis indígenas e alimentação tradicional. “Viajo para lugares para onde os media não viajam, onde há muitas histórias para contar, muito para descobrir e preservar. Quando me dizem que não devo ir a algum lado, respondo que nunca vou deixar que o meu medo supere a minha curiosidade”.
Brendan Hall é um cineasta documental que conta histórias sobre o mundo natural. Na GLEX Summit, destacou a importância dos legados: “Na sala do meu avô, descobri que ele também viajou pelo Alasca, como eu. Foi então que percebi: queremos preservar os sítios que gostamos, para que os nossos filhos e netos, as próximas gerações, também possam desfrutar deles. É também por isso que contamos histórias”.
Karim Iliya é um fotógrafo, cineasta e guia de natação com baleias, com base na Islândia e no Havai. Na ilha da Terceira, confessou: “Sempre me distraí com facilidade. E sempre me disseram que devia focar-me e não seguir cada borboleta que aparecia no meu caminho. Mas eu acredito que é importante entregarmo-nos às distrações e que as pequenas maravilhas da natureza têm muito para nos ensinar sobre o mundo”.
A moda a criar pontes no mundo
Rebecca Hui foi uma das oradoras que passou pelo palco da GLEX Summit. Quando a sua avó perdeu totalmente a memória, Rebecca decidiu que era tempo de explorar as suas origens. Viajando pelas suas raízes, e apaixonada por moda, percebeu que os gigantes da indústria da moda procuram constantemente inspiração em pequenos produtores, na arte tribal e étnica. Por isso, promoveu parcerias entre as grandes marcas e os pequenos produtores, para que estes conseguissem trabalhar de forma justa e isso triplicou os seus ganhos. “Numa época de tanta polarização, a moda pode ser uma forma de criar pontes no mundo”, sublinhou.
Com a família com origens em Portugal, Joe Rohde foi o criador do Animal Kingdom do parque da Disneyland em Orlando, nos EUA. Um espaço onde os visitantes vivem uma verdadeira experiência na savana. Na GLEX Summit, reconheceu que o sucesso do trabalho que desenvolveu se deveu ao facto de ser “um apaixonado por natureza. Quando era criança passava o tempo na natureza, atrás de insetos e animais. E como a minha mãe era atriz e o meu pai trabalhava no cinema, isso fez com que a minha infância fosse recheada de filmes e incentivos à criatividade”.
A GLEX Summit foi organizada pela portuguesa Expanding, com a chancela e a curadoria do nova-iorquino The Explorers Club.
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