A partir do primeiro dia de 2025, todo os Estados-membros da União Europeia terão de assegurar a recolha seletiva de têxteis e Portugal não é exceção. De modo a cumprir a diretiva de Bruxelas, o Regime Geral da Gestão de Resíduos (RGGR) estabelece que até essa data os municípios devem disponibilizar uma rede destinada a este tipo de resíduos urbanos, bem como às frações do mobiliário e resíduos perigosos de pequenas quantidades.
Mas estão os municípios preparados para começar já a operacionalizar, de forma eficaz, a recolha seletiva de têxteis? A pouco mais de uma semana do prazo estabelecido, não são conhecidos dados oficiais, mas a associação ZERO acredita que ainda há muito trabalho por fazer. “É provável que muitos municípios não tenham conseguido ainda implementar”, disse Ismael Casotti Rienda à Smart Cities, embora ressalvando que esta recolha já existe em muitos pontos do país graças aos contentores colocados por várias entidades, como a Humana ou a Cáritas. Face a este cenário, “os municípios têm de se preocupar desde logo em implementar mais contentores de roupa e depois bater à porta destas entidades pedindo informações e números sobre as quantidades recolhidas”, defende o ambientalista.
Ainda assim, Ismael Casotti Rienda diz estar mais preocupado com o tratamento destes têxteis do que propriamente com a recolha, uma vez que se trata de um fluxo difícil de gerir, ou seja, em que nem sempre há interesse em garantir-lhes uma nova vida, por exemplo, através da reutilização ou da reciclagem. “Como tal, é bom que a indústria, aos poucos, se desenvolva no sentido de tratar estes têxteis, senão vamos acabar por entupir aterros e incineradoras, tal como estamos a fazer agora”, acrescenta.
A associação Zero aconselha os municípios a apostar na prevenção e reutilização, nomeadamente através de parcerias com entidades que já estão a trabalhar no setor. Uma delas é a Humana que, no mês passado, organizou um evento sobre “Economia Circular dos Têxteis”, onde foi debatida esta questão. Durante o encontro, lembrou-se que “apenas cerca de 15% dos resíduos têxteis são recolhidos seletivamente em Portugal” e que a reutilização é a estratégia com maior retorno económico e benefício ambiental.
“O principal desafio é a capacidade dos municípios para assegurar o serviço de recolha e processamento dos têxteis. Há um hiato entre esta obrigatoriedade e a operacionalização do esquema de responsabilidade alargada do produtor, que permitirá obter financiamento dos produtores para financiar estas atividades”, concluiu a organização sem fins lucrativos no final do evento.
Recolha de biorresíduos a passo lento
Desde 1 de janeiro de 2024 que os municípios também devem assegurar a recolha seletiva de biorresíduos mas, quase um ano depois, esta obrigatoriedade está longe de ser cumprida por todos. Para Ismael Casotti Rienda, “o processo não está como deveria estar”, apesar de vários bons exemplos mostrarem o melhor caminho a seguir. “Alguns apostaram em sistemas de alta eficiência e estão a conseguir bons números, como Guimarães, Maia, São João da Madeira, Fornos de Algodres, Silves ou Seixal, mas também há outros que decidiram fazer um investimento mínimo e, por isso, têm um retorno mínimo”, defende o especialista. “Um dos problemas está relacionado com a falta de informação dos municípios sobre as melhores práticas a seguir”, acrescenta.
Várias entidades oficias têm reconhecido que não está a ser fácil cumprir as metas estabelecidas no Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos 2030 (PERSU2030). Por exemplo, um relatório da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), publicado em junho, revelou uma “fraca implementação da recolha seletiva de biorresíduos”. Isto porque apenas 79 das 185 autarquias responderam a um inquérito sobre a recolha seletiva de biorresíduos e, destas, a maioria indicou que o sistema “não abrange toda a sua área de intervenção”.
Perante esta realidade, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) tem lembrado que a falta de apoio financeiro dificulta a tarefa dos municípios, por exemplo para a aquisição de viaturas, mas sublinha que a baixa adesão dos cidadãos também é um entrave ao cumprimento das metas. Problemas que, acrescenta a ANMP, poderão estender-se, ou mesmo agravar-se, no caso dos novos fluxos.
Fotografia de destaque: © CM Vouzela