A partir dos laboratórios da Universidade de Coimbra nasceu um projeto inovador que ajuda a melhorar a sustentabilidade do setor têxtil, um dos mais poluentes do mundo. Chama-se AgroBioTex e foi criado por investigadores portugueses, apostados em valorizar resíduos agroindustriais e produzir biotêxteis sustentáveis.

Com esta tecnologia, é possível extrair pigmentos naturais de diversos tipos de biomassa vegetal e depois aplicá-los em lanifícios, como a lã de ovelha, através de um processo sustentável e circular. “Até agora temos utilizado, sobretudo, resíduos agroindustriais, como as águas russas do azeite ou as borras do vinho, mas também já fizemos testes com a clorofila da erva e de microalgas, sempre com sucesso”, revela Alexandre Jorge, do Departamento de Engenharia Química, em entrevista à Smart Cities. Com ele têm trabalhado mais dois investigadores, Helena Ribeiro e Joaquim Pinto, e o professor Jorge Pereira, líder da equipa de investigação.

Juntos conseguiram desenvolver uma solução que reduz significativamente o impacto ambiental da etapa de extração dos pigmentos naturais, uma vez que evita o uso de solventes em 80%, além de promover a substituição de corantes sintéticos e outros aditivos químicos habitualmente usados no tingimento têxtil. “Todos os solventes e compostos que usamos são de base biológica e podem ser recuperados e reutilizados com elevada eficiência, daí a circularidade e sustentabilidade de todo o processo, o que ajuda a evitar graves problemas ambientais e sanitários, bem como custos no tratamento de efluentes industriais”, explica a equipa.

Embora a solução utilizada ajude a melhorar a fixação do corante natural e a durabilidade das cores, mais investigação é necessária para obter resultados totalmente comparáveis com os corantes sintéticos comparáveis com os corantes sintéticos. Este desígnio de sustentabilidade acaba, assim, por incentivar uma mudança generalizada nos consumidores. “Sabemos que a aceitação de cores mais ténues, que se vão desgastando ao longo do tempo, implica uma adesão e consciencialização dos clientes, mas é claro que o pigmento natural tem sempre a vantagem de ser mais ecológico e que acreditamos ser parte do futuro sustentável da indústria têxtil”, sublinha Alexandre Jorge, para quem esta transição será lenta, mas possível.

AgroBioTex venceu desafio europeu realizado no do Parque Científico da Universidade de Valladolid

E porquê a escolha da lã de ovelha? Apesar de também terem realizado testes em tecidos de algodão, com resultados idênticos, os investigadores preferiram focar-se num material com tradição no país, contrariando a atual subvalorização do mercado. “No fundo, além de querermos apresentar uma forma inovadora de tingir os tecidos, reaproveitando os pigmentos naturais de resíduos agroindustriais, também procuramos valorizar um recurso nosso que, de momento, está algo desaproveitado”, justifica o investigador.

Em novembro do ano passado, o AgroBioTex venceu o concurso “Bioeconomia Circular no Sudoeste da Europa”, realizado em Espanha, no âmbito do projeto europeu BioRural, que integra dois parceiros portugueses: o Centro de Biomassa para Energia e Universidade de Coimbra. O galardão valeu um bilhete para a final europeia, marcada para maio, em Bruxelas, e mentoria personalizada do Parque Científico da Universidade de Valladolid, mas ajudou também a divulgar esta investigação: “o mais importante é mostrar às pessoas destes ecossistemas que é possível ter práticas de tingimento mais sustentáveis, seja a jusante ou a montante do processo, e conseguir colaborações que nos permitam aumentar a maturidade e o interesse destas tecnologias para chegar ao mercado”.

Para já, o interesse da indústria começa a surgir e os contactos têm sido vários. Os criadores do projeto acreditam, por isso, que esta tecnologia “Made In Portugal” tem tudo para mostrar viabilidade e, mais cedo ou mais tarde, chegar às etiquetas das marcas mundiais.

 

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