Na cidade de Viana do Castelo, o antigo Matadouro Municipal — edifício devoluto há mais de três décadas — prepara-se para ganhar uma nova vida como espaço de cocriação artística, científica e tecnológica. O projeto Viana STARTS, o único vencedor português da 1.ª edição do Concurso para Ações Inovadoras da Iniciativa Urbana Europeia (European Urban Initiative, EUI), é uma ambiciosa proposta nacional de regeneração urbana com financiamento europeu. Inspirado nos princípios da Nova Bauhaus Europeia — sustentabilidade, inclusão e estética —, o projeto visa transformar um espaço patrimonial abandonado num polo multifuncional de inovação, criatividade e participação cidadã, posicionando Viana do Castelo como laboratório urbano de referência a nível europeu.

Com um prazo de execução estimado de 420 dias, o Viana STARTS aposta numa intervenção exemplar em termos de sustentabilidade ambiental e eficiência energética. A obra inclui o uso de materiais naturais e locais — como a cortiça e o cânhamo —, a reutilização de 90% dos resíduos produzidos, a incorporação de materiais reciclados e a produção de energia através de fontes renováveis (solar, eólica e hídrica). Entre os aspetos mais inovadores, está a instalação de um sistema pioneiro de armazenamento de energia excedentária sob a forma de hidrogénio verde — uma estreia em edifícios públicos em Portugal —, que permitirá responder de forma eficaz a flutuações na produção energética e reforçar a resiliência urbana.

A reabilitação respeita a identidade arquitetónica do edifício, introduzindo soluções técnicas que asseguram um melhor desempenho térmico e hídrico, como caixilharias em alumínio e madeira reciclada. O espaço será reconfigurado para acolher múltiplos usos — coworking, exposições, restauração e lazer — promovendo o encontro entre artistas, investigadores, empresários e cidadãos. A componente de comunicação estratégica será central para assegurar uma abordagem aberta e inclusiva, que inspire a criação de novos modelos de negócio, o desenvolvimento artístico e o empreendedorismo local.

O projeto conta com uma forte rede de parceiros locais e nacionais, incluindo o Instituto Politécnico de Viana do Castelo, o Dinamo10 Creative Hub, a Associação Empresarial do Distrito de Viana do Castelo, o Itecons, a INOVA+ e a Associação Juvenil de Deão. A dimensão internacional do projeto é igualmente relevante, promovendo a transferência de conhecimento através da colaboração com cidades como Brest (França), Brescia (Itália) e Las Palmas (Espanha), reforçando o impacto europeu da iniciativa.

O Viana STARTS integra um conjunto mais vasto de projetos inovadores cofinanciados pela Iniciativa Urbana Europeia. A EUI apoia atualmente 56 Ações Inovadoras em 19 Estados-Membros, com um cofinanciamento até 80% dos custos elegíveis, num máximo de 5 milhões de euros por projeto, através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). Para além da implementação local, os projetos selecionados incluem componentes de transferência de conhecimento, promovendo a partilha de soluções com outras cidades europeias, em especial aquelas que enfrentam desafios mais exigentes no caminho para um futuro urbano sustentável.

Portugal tem vindo a afirmar-se na inovação urbana europeia, com quatro projetos vencedores no âmbito das Ações Inovadoras da EUI, entre centenas de candidaturas apresentadas a nível europeu. A par do Viana STARTS, foram já selecionados outros três projetos portugueses. Na 2.ª edição do Concurso, o projeto selecionado COIMBRA ST LLM, promovido pelo Município de Coimbra, aposta na aplicação de inteligência artificial para a gestão de fluxos turísticos, visando um turismo mais sustentável e inteligente. Já na 3.ª edição, cujos resultados foram recentemente conhecidos, destacaram-se mais dois projetos portugueses: Co.nTe, do Município de Câmara de Lobos, centrado na agricultura urbana sustentável, na segurança alimentar e na mitigação de riscos climáticos; e MOVES-IT, do Município de Matosinhos, que propõe soluções digitais inovadoras para melhorar os serviços públicos e reforçar os mecanismos de participação cidadã.

A abertura da próxima edição do Concurso para Ações Inovadoras da EUI está prevista para meados de 2026, com temas e calendário a anunciar. A iniciativa continuará a incentivar o ensaio de soluções urbanas transformadoras, com impacto real e potencial de replicação noutras cidades europeias. Para além de um financiamento relevante, a EUI proporciona um enquadramento favorável à experimentação urbana, promovendo o acesso ao conhecimento, a capacitação institucional e a constituição de parcerias sólidas entre autoridades urbanas, empresas, centros de investigação, sociedade civil e cultura.

A experiência de Viana do Castelo pretende demonstrar, de forma concreta, que a regeneração urbana pode ser um poderoso instrumento de inovação e transformação social. Ao reconverter um edifício devoluto num espaço de convergência entre arte, ciência e sustentabilidade, o Município não apenas revitaliza o seu património edificado, como também projeta a cidade no debate europeu sobre os modelos urbanos do futuro. Este percurso evidencia o papel que as autoridades urbanas podem desempenhar na dinamização de ecossistemas locais de inovação, capazes de gerar valor económico, cultural e ambiental de forma integrada.

Mais do que um caso isolado, o Viana STARTS constitui um exemplo inspirador para outras cidades portuguesas e europeias, demonstrando que é possível conceber e implementar soluções estruturadas, com impacto local e potencial de transferência para outros contextos. Num momento em que a transição verde e digital exige respostas cada vez mais colaborativas, criativas e orientadas para as necessidades reais das populações, este tipo de iniciativa torna-se particularmente relevante.

Assim, o percurso de Viana do Castelo pode servir de referência a outras as autoridades urbanas que ambicionam liderar a transformação dos seus territórios em cidades mais resilientes, inclusivas e inteligentes. Com o apoio da Iniciativa Urbana Europeia, e beneficiando de redes de conhecimento e financiamento especificamente concebidas para apoiar projetos inovadores, as cidades portuguesas têm à sua disposição uma oportunidade concreta para testar novas abordagens, reforçar as suas capacidades institucionais e contribuir ativamente para os objetivos de coesão territorial e desenvolvimento sustentável definidos à escala europeia.

Nesta entrevista do Ponto de Contacto Urbano nacional da EUI ao Vereador Ricardo Rego, responsável pela Administração Geral, Transição Digital e Inovação na Câmara Municipal de Viana do Castelo, aprofundamos os marcos já alcançados pelo Viana STARTS, os próximos passos previstos e o impacto local e europeu esperado deste projeto inovador.

  1. Da visão à obra: o arranque da transformação

O Viana STARTS já passou por etapas importantes, incluindo a assinatura do auto de consignação da empreitada de execução. Que marcos principais já foram alcançados e quais são os próximos passos para concretizar a visão deste projeto?

O Viana STARTS tem percorrido um caminho sólido rumo à sua concretização, desde os finais de 2023. No dia 1 de março, assinalámos o primeiro ano do projeto e, com a apresentação do relatório, percebemos o imenso e importante trabalho feito. Desde logo, a auscultação à população e ao grupo de stakeholders em diferentes momentos e temáticas, porque, para nós, é vital a participação cívica para nos permitir afinar a estratégia e envolver a comunidade local.

Para o início da ‘construção’ do Viana STARTS, nas componentes material e imaterial, um dos marcos mais significativos foi a assinatura do auto de consignação da empreitada de execução. Este foi um passo verdadeiramente determinante para concretizar a visão do projeto, que passa pela reconstrução do antigo matadouro municipal, devoluto há 34 anos, para se tornar no futuro coração do Viana STARTS. Esta será uma reconstrução inspirada nos princípios da Nova Bauhaus Europeia e que vai implementar várias soluções inovadoras na obra.

O compromisso com a sustentabilidade está no centro do projeto e, durante a reabilitação do edifício, até final deste ano serão desenvolvidas e testadas pelo menos 20 novas soluções inovadoras com enfoque na eficiência energética e na economia circular. Algumas dessas soluções poderão, no futuro, servir outros edifícios aqui ou em qualquer outra parte do mundo.

Os próximos passos programados incluem o avanço das obras de requalificação do espaço, a instalação das infraestruturas tecnológicas e o desenvolvimento do Plano Estratégico. Vamos começar a promover as primeiras ações em cocriação com os nossos parceiros e desenvolver programas que vão fomentar a interação entre os setores da arte, ciência e tecnologia. O próximo passo será, pois, direcionado para o objetivo maior: apresentar e cimentar o Viana STARTS como um polo de inovação e criatividade.

  1. Um ecossistema criativo para o futuro da cidade

O Viana STARTS posiciona-se como um polo inovador que cruza arte, ciência e tecnologia. Que transformações estruturais e dinâmicas locais espera que este projeto desencadeie na cidade a médio e longo prazo?

A médio prazo, o Viana START irá impulsionar a modernização do ecossistema criativo da cidade, fomentando colaborações entre artistas, cientistas e empreendedores. Esta abordagem multidisciplinar será um catalisador para novas oportunidades de negócio, investigação e experimentação artística e tecnológica.

A longo prazo, espera-se que o projeto contribua para a afirmação de Viana do Castelo como uma referência na inovação e na criatividade. A criação de um ambiente propício ao desenvolvimento de projetos que possam responder às necessidades empresariais e sociais terá um impacto direto na economia local, estimulando a atração de talento, a fixação de novas empresas e pessoas, o que contribuirá para a projeção deste território no cenário europeu da inovação.

  1. Envolver para inovar: parcerias e redes

A criação de redes e parcerias é fundamental para o sucesso de um projeto desta natureza. Como está a autarquia a articular-se com a comunidade artística, científica e empresarial para garantir um envolvimento ativo e sustentável?

Este projeto, liderado pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, já nasce em parceria com outras entidades de diferentes áreas: com a Associação Juvenil de Deão, o Itecons – Instituto de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico para a Construção, Energia, Ambiente e Sustentabilidade, a INOVA+, o Dinamo10 – Creative Hub, a Associação Empresarial do Distrito de Viana do Castelo e o Instituto Politécnico de Viana do Castelo. Temos adotado uma abordagem integradora, promovendo encontros, debates e workshops que envolvem representantes do meio artístico, científico e empresarial. A criação de redes colaborativas é uma prioridade e por isso temos uma rede de stakeholders locais e nacionais que também contribuem para ampliar e enriquecer o Viana STARTS.

Para além disso, temos três cidades parceiras de transferência: Brest, em França, Brescia, em Itália, e Las Palmas, em Espanha, o que reforça o compromisso conjunto na implementação de soluções inovadoras e sustentáveis.

O nosso modelo de cooperação assegura um envolvimento ativo e sustentável da comunidade, permitindo que o Viana STARTS se torne num espaço vivo e dinâmico.

  1. Atrair talento, gerar investimento

O Viana STARTS tem um forte compromisso com a inovação e a criatividade. De que forma a autarquia pretende atrair talento e investimento para consolidar este espaço como um espaço de referência no contexto nacional e europeu?

A estratégia passa por três eixos principais: criação de condições infraestruturais de excelência, oferta de programas diferenciadores e promoção internacional do projeto.

A nível infraestrutural, o Viana STARTS contará com espaços de experimentação, proporcionando um ambiente propício à criatividade e inovação. No que diz respeito aos programas, serão promovidos desafios e residências artísticas e científicas que incentivem a investigação aplicada e a prototipagem de novas ideias, permitindo também testar soluções com potencial de mercado.

Para reforçar a projeção internacional, está em curso uma estratégia de comunicação e networking que inclui a participação em eventos de relevo, visitas de trabalho a outras cidades e espaços ou organizações que estejam vocacionadas para estas áreas, candidaturas a projetos complementares nacionais e europeus e a criação de sinergias com hubs de inovação e criatividade. O objetivo é tornar Viana do Castelo num destino preferencial para talentos e investidores interessados em projetos que cruzam arte, ciência e tecnologia.

  1. Inovar com rigor: governança e participação

A componente participativa e cocriativa do projeto coloca desafios específicos, tanto a nível institucional como na relação com os cidadãos. Que estratégias estão a ser adotadas para equilibrar os requisitos formais e administrativos com a flexibilidade necessária à inovação?

A inovação exige flexibilidade, mas também rigor. Para equilibrar estes aspetos, o Viana STARTS está a adotar um modelo de gestão ágil, que permite responder rapidamente às necessidades emergentes, sem comprometer os procedimentos administrativos.

A nível institucional, estão a ser simplificados processos burocráticos para facilitar a participação de criadores e investigadores. Ao mesmo tempo, são promovidos espaços de diálogo contínuo com a comunidade, garantindo que o projeto se mantém alinhado com as expectativas dos cidadãos e com os agentes das ciências, da tecnologia e das artes. Além disso, serão implementadas plataformas digitais que facilitarão a submissão de ideias e propostas, incentivando uma participação ativa e transparente.

Como referimos, o modelo ainda está a ser desenhado e estamos agora na fase de networking, de conhecer exemplos do que já se faz, perceber as tendências e as necessidades desta área. No plano de trabalho do projeto, esta é a fase que temos para conhecer e absorver informação para construir o nosso plano.

  1. Comunicar para inspirar

Num momento em que a comunicação é uma peça-chave para a consolidação de qualquer projeto inovador, qual será a abordagem estratégica para garantir que o Viana STARTS se afirme como um exemplo inspirador dentro e fora de Portugal?

A estratégia de comunicação deste projeto é feita em patamares diferentes porque temos públicos distintos, mas assenta em três pilares: o envolvimento, a promoção e o reconhecimento.

A nível de visibilidade, serão desenvolvidas campanhas de divulgação que destacarão o caráter inovador do projeto, utilizando diversos canais, desde redes sociais a publicações especializadas. A organização de eventos de lançamento, de momentos-chave do projeto, a participação em conferências e/ou encontros nacionais e internacionais também contribuirão para a notoriedade do Viana STARTS.

O envolvimento da comunidade será assegurado através de iniciativas que vamos promovendo e também na comunicação contínua de todos os momentos, para que todos estejam a par. Posteriormente, iremos promover visitas guiadas, workshops abertos e atividades de experimentação com diferentes públicos. O objetivo passará sempre por criar uma ligação emocional entre o público e o projeto.

A obtenção de reconhecimento passa pela captação de parcerias estratégicas e pelo posicionamento do Viana STARTS em redes europeias de inovação e cultura. A meta é que este projeto seja verdadeiramente inspirador para outras cidades.


Este artigo resulta de uma parceria com a DIREÇÃO-GERAL DO TERRITÓRIO.