Comemorou-se no dia 12 de Abril, e pela quarta vez, o Dia Nacional do Ar. Instituído em 2019 com o objetivo de destacar a importância da qualidade do ar e sensibilizar a população para a necessidade de conhecer e atuar com vista à proteção e melhoria deste recurso indispensável à vida, assinalou-se o Dia Nacional do Ar. Neste sentido, a ZERO alerta novamente para o papel de uma mobilidade sustentável, na medida em que o setor dos transportes, em particular o transporte rodoviário, é a principal causa de poluição do ar nos centros urbanos portugueses.

Qualidade do ar na Avenida da Liberdade em Lisboa em 2023, pior que a média em 2022

As concentrações de dióxido de azoto nas estações de tráfego com maior poluição estão abaixo da média anual de 2022 em Porto e Braga, mas aumentaram na Av. da Liberdade em Lisboa.

Em 2020 e 2021, a forte redução das deslocações na área metropolitana de Lisboa levaram ao cumprimento imediato dos indicadores de qualidade do ar, como é o caso das partículas finas (PM2.5) e dióxido de azoto. Infelizmente, em 2022 voltámos a ter as excedências às quais estávamos erroneamente habituados antes da pandemia. Os valores de dióxido de azoto (NO2), um poluente atribuído principalmente à combustão dos motores a diesel, superaram os valores limite anuais estipulados na legislação europeia de 40 μg/m3 bem como as recomendações de 10 μg/m3 estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Nos primeiros três meses de 2023 (1 janeiro a 6 de abril), os dados, ainda sujeitos a validação final, da estação de monitorização da Avenida da Liberdade em Lisboa, apontam para um valor médio de dióxido de azoto de 48 μg/m3, 3 μg/m3 acima da média registada em 2022, enquanto as estações de medição em locais de tráfego, com valores habitualmente mais elevados, no Porto (Praça Sá Carneiro) e Braga, apontam para valores médios de aproximadamente 36 e 35 μg/m3, respetivamente. Estes valores são substancialmente mais elevados que os limites propostos para a nova Diretiva Quadro do Ar que se aproximam dos valores sugeridos pela OMS (20 μg/m3). Nesse cenário, o número de estações de medição da qualidade do ar que incumprirão poderá aumentar drasticamente, levando à necessidade de atuar o mais cedo possível.

O dióxido de azoto, em concentrações elevadas, tem efeitos que vão desde a irritação dos olhos e garganta até à afetação das vias respiratórias, provocando diminuição da capacidade respiratória, dores no peito, edema pulmonar e lesões no sistema nervoso central e nos tecidos. Grupos como as crianças, os idosos, os asmáticos e as pessoas com bronquites crónicas são os mais afetados. Este poluente pode ainda fazer aumentar as reações a alergénios de origem natural. Em Portugal, a poluição do ar é responsável pela morte prematura de cerca de seis mil pessoas todos os anos.

Que medidas foram tomadas em Lisboa?

A Diretiva Quadro do Ar (Diretiva 2008/50/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Maio de 2008) exige que, para aquelas zonas que tenham problemas de incumprimento dos parâmetros de qualidade do ar, haja Planos de Melhoria de Qualidade do Ar e Programas de Execução. Em Lisboa, o Plano de Melhoria da Qualidade do Ar da Região de Lisboa e Vale do Tejo foi aprovado em 2019 mediante a Portaria 116-A/2019, de 4 de Fevereiro, mas até à data não foi publicado nenhum Programa de Execução. O Estado não exige às autarquias a implementação das medidas necessárias e estas têm mostrado inação face aos problemas de qualidade do ar que afetam a várias zonas do país.

A Zona de Emissões Reduzidas de Lisboa não é atualizada desde 2015, mantendo, portanto, apenas regras de acesso ligadas a tecnologias obsoletas (Euro 3 para a zona mais poluída e Euro 2 para a zona mais abrangente). Os carros que podem entrar na zona mais poluída são os mais recentes, enquanto os proprietários de veículos mais velhos ficam excluídos e sem garantias de ter uma rede de transportes públicos alternativos para todas as suas deslocações. Uma fraca campanha de sensibilização e fiscalização tem contribuído para o agravamento da situação.

Espanha muito à frente de Portugal no esforço de redução de emissões

Na vizinha Espanha, tem havido um investimento massivo na criação das Zonas de Emissões Reduzidas, com uma dotação financeira de 500 milhões de euros dos fundos Next Generation EU (2022), que se somam a outros 1000 milhões dedicados à descarbonização e digitalização da mobilidade urbana. O enquadramento legal necessário veio com a Lei do Clima e Transição Energética (Ley 7/2021, de 20 de Mayo, de Cambio Climático y Transición Energética) que obriga à criação de ZER (em Espanha designadas como ZBE – Zonas de Baixas Emissões) em mais de 150 cidades, nomeadamente aquelas que superam os 50 mil habitantes ou territórios insulares e cidades de mais de 20 mil habitantes cujos índices de poluição superem os limites atuais.  A primeira ZER foi implantada em Barcelona a 1 de Janeiro de 2020, abrangendo uma área de 95 km2 e outros quatro municípios da área metropolitana. De segunda a sexta-feira, entre as 7h e as 20h, os carros com motor a combustão (gasóleo e gasolina) anteriores à normativa Euro 5 não poderão entrar na cidade. Outras regras aplicam-se a veículos ligeiros de mercadorias (Euro 3 gasolina e Euro 4 gasóleo), e uma série de moratórias para veículos profissionais e exceções para viaturas de serviço público essencial. Em contrapartida, foram introduzidos incentivos fiscais, bonificações para estacionamento, acesso a faixas prioritárias de alta ocupação BUS/VAO) e transporte público gratuito durante três anos para quem abata veículos excluídos na ZER.

A entrada em vigor destas novas medidas, que afetam à condução em áreas urbanas, foi acompanhada por uma reforma do Código da Estrada (Ley de Tráfico) em Março de 2022, que permitiu a introdução da nova sinalética e do regime sancionador a aplicar. Em Portugal, será igualmente necessária uma atualização do Código no sentido de introduzir os instrumentos legais que garantam o correto funcionamento da normativa das ZER.

O que defende a ZERO?

A ZERO defende a atualização da Zona de Emissões Reduzidas de Lisboa ou, desejavelmente, a criação de uma Zona Zero Emissões, quer em Lisboa, quer no Porto, abrangendo os centros das cidades. Nestas Zonas Zero Emissões, apenas poderão circular transportes públicos, veículos de residentes e veículos sem emissões de forma limitada. Da mesma forma, defende uma aposta firme na mobilidade suave, onde os peões possam circular em condições favoráveis, e com uma boa integração com ciclovias e transportes públicos fiáveis e acessíveis. O papel do Estado é fundamental para evitar a inação das autarquias, às quais deve ser exigida a criação dos Planos de Melhoria da Qualidade do Ar e a consequente implementação dos Programas de Execução.

Para ultrapassar a representatividade limitada das estações de medição da qualidade do ar, é necessário efetuar medições complementares nas diferentes cidades para detetar outras situações que até o momento têm sido ignoradas.

O texto acima é da responsabilidade da entidade em questão, com as devidas adaptações.