Como preparar Lisboa para os eventos climáticos extremos que ameaçam a cidade? Para a Agência de Energia e Ambiente de Lisboa, a resposta também passa por juntar soluções de base natural a comunidades envolvidas e informadas. Conheça três projetos que querem tornar a capital mais resiliente.

Ondas de frio e calor, chuvas torrenciais, inundações e tempestades são ameaças cada vez mais recorrentes às cidades de todo o mundo e Lisboa não é exceção. O problema é complexo e global, ou não tivesse ele associado às alterações climáticas, mas as respostas locais que envolvem diretamente as pessoas também podem ser parte da solução. São os casos de três projetos em que a Lisboa E-Nova – Agência de Energia e Ambiente de Lisboa está envolvida, ainda em fase de candidatura a financiamento, mas com potencial para fazerem a diferença junto dos cidadãos.

Um deles chama-se NESTED e junta 33 parceiros de vários países europeus, entre eles quatro cidades – Lisboa, Izmir (Grécia), Tallin (Estónia) e Sint Niklaas (Bélgica) – com o objetivo de trabalhar a cocriação e a coconstrução de espaços públicos em diferentes comunidades, tendo sempre como pilar base as Soluções Baseadas na Natureza (SbN). É aqui que entra a renaturalização, cada vez mais importante para a resiliência das cidades face aos efeitos climáticos extremos. “É a solução. Não há dúvidas que é a solução a longo prazo para muitos dos problemas a eles associados, seja porque ajuda a mitigar os efeitos adversos da precipitação intensa, através de um aumento da permeabilidade e retenção de água pelos solos, ou porque a sombra das árvores é fundamental para combater as ondas de calor”, afirma Luis Cruz, climate expert da Lisboa E-Nova.

No caso português, o projeto propõe-se a intervir nas zonas envolventes ao Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) e futuros campus universitários. A ideia passa por criar estruturas, fundamentalmente verdes, que tornem os espaços públicos mais confortáveis e, ao mesmo tempo, ajudem a reduzir consumos energéticos e a permeabilizar os solos, facilitando a absorção da água. “Não é por acaso que o fazem. Atualmente, o ISEL tem um parque de estacionamento com uma elevada área impermeabilizada e aquando da ocorrência de chuvas intensas, a água acaba por inundar a estação do metro [Chelas] ali próximo, devido aos fenómenos de escoamento, explica Luís Cruz. “Isso prejudica as populações, o que leva a outro objetivo do projeto: envolver a comunidade de Marvila e gerar responsabilidade social, estando o ISEL, como parceiro deste projeto, muito interessado em melhorar o seu campus com o objetivo de promover uma gestão mais eficiente do espaço urbano, gerando impactos positivos tanto a nível ambiental como social”, acrescenta. “É por isso que se chama NESTED, porque pretende ser um ´ninho` onde todos se sentem mais seguros e confortáveis”.

Se a escola não vai à Natureza, vai a Natureza à escola

Levar os benefícios da Natureza até às comunidades escolares, ajudando-as a tornarem-se mais resilientes perante efeitos climáticos extremos é também o objetivo do NatureScape, outro projeto com intervenção da Lisboa E-Nova. Neste caso, trata-se de uma iniciativa mais académica, que parte de espaços já existentes e, através de pequenas alterações, avaliam-se os efeitos que produzem na comunidade. “A ideia é ver como conseguimos criar um ambiente mais confortável para os alunos, professores e outros atores da comunidade escolar – e convém não esquecer que alguns permanecem 12 horas na escola por dia – com vista a criar um road map que permita servir de exemplo a outras escolas, para que também elas consigam replicar estes projetos positivos”, revela Luís Cruz.

Estes espaços intervencionados pretendem tornar-se também num polo agregador da comunidade local, servindo inclusivamente de abrigo para os moradores em caso de calor extremo. “Embora tenhamos identificado as ondas de calor, porque é um dos casos que provoca mais impacto pessoal e social, a verdade é que uma solução de base natural que esteja pensada para as necessidades das comunidades, à partida, também poderá dar resposta a outras intempéries”, lembra o especialista. Ao mesmo tempo, pretende-se que o projeto seja catalisador de uma sociedade mais justa e inclusiva, permitindo, por exemplo, o acesso de crianças invisuais ou com dificuldades de locomoção aos espaços naturalizados.

Mapa revela a distância das escolas de Lisboa a espaços verdes com mais de 2 hectares

O envolvimento da Lisboa E-Nova neste projeto teve como ponto de partida o estudo “Bosque Escolar”, desenvolvido por Luís Cruz. Este levantamento procurou evidenciar os benefícios e a viabilidade de programas forest schools em Lisboa, à semelhança do que já existe noutros países da Europa, e que, na sua essência, promovem a aprendizagem ao ar livre, em contacto com a natureza. Para isso, o trabalho avaliou a proximidade das escolas lisboetas a elementos e a espaços verdes. Os dados obtidos foram representados num conjunto de mapas (ver imagem ao lado) que revelam, por exemplo, uma distância média de 90 metros (m), entre uma escola e a árvore mais próxima sendo que, em alguns casos, essa distância pode superar os 500 metros. Já em relação à distância média a qualquer espaço verdes, a distância é de 279 m, mas se forem tidos em conta espaços verdes maiores, com mais de 20 hectares, a distância média já passa para 1386 m. Há ainda escolas localizadas a quase 3,5 quilómetros de uma área verde com esta dimensão.

Bairros mais resilientes, para todos

CLIMAQUITY é o nome de outro projeto que envolve a Lisboa E-Nova, neste caso com a Gebalis, empresa responsável pela gestão de imóveis de habitação municipal. O principal objetivo é trabalhar com comunidades desfavorecidas na adaptação do espaço público com vista à mitigação de fenómenos climáticos extremos. “Queremos perceber como os dados conseguem ajudar a prever o que poderá acontecer com estes eventos e de que forma as pessoas podem mudar a sua atitude em casa e também no bairro, de modo a melhorarem o seu conforto e a estarem menos suscetíveis aos seus efeitos adversos”, explica Luís Cruz.

O tipo de abordagem será definido numa fase posterior do projeto, mas o climate expert ensaia um exemplo prático do que poderá suceder: “Imaginemos que o IPMA lança um aviso de onda de calor. A partir daí, as pessoas poderão receber em casa uma notificação, por exemplo através de uma app ou de um painel informativo junto ao prédio, com conselhos e informações práticas que as ajudem a perceber e a atuar perante estas situações, conforme as características da sua habitação”.

Desta forma, os dados serão o ponto de partida para a sensibilização, formação e capacitação das comunidades mais desfavorecidas. “Queremos que a tecnologia seja acessível a todos, servindo de alavanca social, especialmente diante de mais um desafio, neste caso, o clima extremo que, tantas vezes, se manifesta de forma inesperada”, conclui Luís Cruz.

 

Fotografia de destaque: © ISEL

ESTE ARTIGO CONTA COM O APOIO DA LISBOA E-NOVA, AGÊNCIA DE ENERGIA E AMBIENTE DE LISBOA E FOI ORIGINALMENTE PUBLICADO NA EDIÇÃO DE OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO DE 2024 DA SMART CITIES.