Por:
Gonçalo Crisóstomo e Marta Magalhães (Ponto de Contacto Urbano nacional da EUI); Maria João Matos, Maria José Efigénio (Ponto URBACT Nacional)
Ações Inovadoras, das UIA à EUI
As Ações Urbanas Inovadoras (Urban Innovative Actions, UIA), uma iniciativa da União Europeia no período 2014-2020, promoveram 86 projetos-piloto para o desenvolvimento urbano sustentável por toda a Europa, disponibilizando às cidades recursos para colocar em prática soluções inovadoras e até aí não testadas para enfrentar desafios urbanos complexos. Com um orçamento total de 372 milhões de euros do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), as UIA permitiram às cidades empreender projetos e soluções urbanas arrojadas e inventivas, para criar um verdadeiro ‘laboratório urbano europeu’.
Destacam-se os projetos UIA portugueses ‘Aveiro STEAM City’, uma rede urbana envolvendo 34 empresas de tecnologias de informação e comunicação na Região de Aveiro, para melhorar competências e aumentar o valor acrescentado do emprego através da transformação digital; e ‘Lisbon VoxPop’, uma rede de partilha de processos e de tecnologias, para acelerar a transição digital do sistema de mobilidade urbana da cidade de Lisboa e criar soluções de mobilidade centradas nas pessoas.
No período de programação 2021-2027, a Comissão Europeia reforça o investimento no desenvolvimento urbano sustentável e lança a Iniciativa Urbana Europeia (European Urban Initiative, EUI), que conta com um orçamento total indicativo de 450 milhões de euros de Fundos Europeus Estruturais e de Investimento. A EUI promove a inovação e desenvolvimento de novas soluções para os desafios urbanos relevantes para a União Europeia, mas também a capacitação e acesso a conhecimento por parte das autoridades urbanas.
Na esteira das UIA, as Ações Inovadoras da EUI visam identificar e promover o ensaio de soluções urbanas inovadoras, transferíveis e escaláveis, com vista a promover as capacidades de inovação e a aquisição de conhecimento das cidades europeias, para integrar soluções inovadoras de desenvolvimento urbano sustentável na Europa.
As Ações Inovadoras da EUI, oportunidades para as cidades
Cada projeto para Ações Inovadoras da EUI pode receber até 5 milhões de euros de cofinanciamento do FEDER e terá um prazo máximo de execução de 3,5 anos. Podem candidatar-se autoridades urbanas com pelo menos 50.000 habitantes e associações de autoridades urbanas (com ou sem estatuto legal de organização) cuja população total combinada represente pelo menos 50.000 habitantes. Os projetos são incentivados a mobilizar complementarmente um conjunto de parceiros locais relevantes, a fim de contribuir com conhecimentos especializados e temáticos sobre o desafio urbano específico a abordar. Estas parcerias devem ser tão diversas quanto possível, idealmente integrando autoridades públicas, empresas, academia e sociedade civil.
O 1.º Concurso para Ações Inovadoras da EUI, lançado em outubro de 2022, com um orçamento total de 65 milhões de euros do FEDER, gerou um forte interesse em toda a UE, tendo sido recebido um total de 99 candidaturas oriundas de 21 Estados-Membros. Destas, foram selecionados 14 projetos com elevado valor de inovação e potencial de transferibilidade, baseados nos três valores fundamentais da Nova Bauhaus Europeia (New European Bauhaus, NEB): Sustentabilidade, Inclusão e Estética.
A cidade portuguesa de Viana do Castelo lidera um dos projetos vencedores, ‘Viana S+T+ARTS Centre’. O Centro S+T+ARTS parte da reutilização criativa do antigo matadouro municipal de Viana do Castelo, que será um espaço de cocriação dedicado a atividades participativas em diversos domínios artísticos, científicos e tecnológicos, apostando na transformação da cidade num centro de inovação azul e de atração de jovens talentos.
O segundo concurso, lançado em maio de 2023, com um orçamento total de 120 milhões de euros do FEDER, superou o primeiro em número de candidaturas, com um total de 112 oriundas de 21 Estados-Membros, centradas em três domínios temáticos: ‘Cidades Verdes’, ‘Turismo Sustentável’ e ‘Cativação de Talento em Cidades em Declínio Demográfico’. Portugal registou o segundo maior número de candidaturas, com 14 projetos de ações inovadoras. Os projetos selecionados serão anunciados no final de abril de 2024.
A abertura do 3.º Concurso para Ações Inovadoras da EUI está prevista para o início de maio de 2024, contando com um orçamento total de 90 milhões de euros do FEDER, para financiar projetos inovadores, transferíveis e escaláveis em contextos reais, no âmbito dos temas: ‘Transição Energética’ e ‘Tecnologia nas Cidades’. A EUI procura soluções inovadoras para redes energéticas locais economicamente viáveis, mais inteligentes e mais integradas, sem emissões de carbono e orientadas para a procura; e soluções inovadoras para melhorar os serviços prestados aos cidadãos e reforçar as capacidades das autoridades locais para oferecerem esses serviços. Estas experiências devem poder ser reproduzidas a uma escala mais alargada com o apoio da Política de Coesão.
Transferência de Ações Inovadoras através do URBACT
O programa europeu de cooperação URBACT tem vindo a apoiar, desde 2002, a colaboração e partilha de boas práticas entre cidades e vilas europeias através de redes temáticas, facilitando a capacitação das partes interessadas, ao nível local, para a concepção e implementação de políticas integradas e participadas, promotoras de um desenvolvimento urbano sustentável.
O URBACT IV, correspondente ao período de programação 2021-2027, contempla Redes de Transferência de Inovação (Innovation Transfer Networks, ITN), que consistem na transferência de um projeto realizado no âmbito das UIA, concluído com sucesso, que será adaptado pelos parceiros da rede aos seus contextos locais. Os parceiros elegíveis para as ITN são cidades ou vilas dos Estados Membros da UE, da Noruega e da Suíça, bem como de países do Instrumento de Assistência de Pré-Adesão (IPA). A fase de candidatura terminou em março de 2024, tendo sido Portugal o país com mais cidades a concurso, num total de 15. As redes iniciarão os trabalhos em setembro de 2024, após um processo de seleção.
O caminho percorrido até à consolidação deste modelo de redes começou no anterior período de programação, no contexto dos preparativos para a colaboração entre o URBACT e a EUI, que incluiu a testagem de um modelo para a transferência de práticas UIA através de cinco redes-piloto, designadas como Mecanismo de Transferência URBACT UIA (URBACT UIA Transfer Mechanism, UTM). Vila Nova de Gaia participou nesta experiência, como parceiro da rede ‘NEXT AGRI’, que tinha Milão como líder. Esta rede URBACT teve como objetivo ajudar as cidades a conceber ações para futuros investimentos no sector da agricultura periurbana.
A experiência das UTM permitiu verificar o sucesso do método adotado para a replicação dos projetos UIA, desenvolvidos em cidades de maior dimensão, para outras escalas e diferentes contextos, bem como identificar os aspetos a melhorar no funcionamento das novas ITN.
O programa de trabalhos das ITN, com a duração de dois anos, estrutura-se em três fases: compreender, adaptar e reutilizar, refletindo os princípios subjacentes ao processo de transferência. A primeira etapa consiste essencialmente no estudo de transferibilidade, com a recolha e análise de informações relacionadas com o tópico do projeto UIA. Segue-se a modularização do projeto inicial, facilitando a sua adaptação e reprodução. As cidades aprendem em conjunto a melhor forma de enfrentar os desafios locais, através do intercâmbio de conhecimentos, boas práticas e processos adequados.
Nas ITN, compete às cidades UIA atuar como parceiros líder e transferir a sua experiência às outras cidades que integram as redes. Utilizando o método URBACT, cada cidade desenvolve um plano de investimento e implementa uma versão adaptada do projeto original. Tal é concretizado com o apoio de peritos URBACT e o envolvimento de partes interessadas locais no Grupo Local URBACT (URBACT Local Group, ULG). Por outro lado, a cidade líder elabora um plano de consolidação e ampliação do seu projeto UIA. Destacam-se ainda duas novidades: a possibilidade de testar ações antes de as incluir no plano de investimento e de integrar cidades ucranianas nas redes, após o início dos trabalhos.
EUI e URBACT, coordenar esforços para a sustentabilidade urbana
As sinergias entre a EUI e o URBACT desenvolvem-se em várias frentes, indo para além da transferência de ações inovadoras. O trabalho conjunto no âmbito dos Laboratórios de Políticas Urbanas da União Europeia (EU City Labs) revela esta tendência de estreita colaboração, como o demonstram os dois já realizados, em Viladecans (Espanha), e em Mouans-Sartoux (França), dedicados aos temas ‘Transição Energética’ e ‘Sistemas de Alimentação Local’, respetivamente. Cada laboratório constitui uma oportunidade única para conhecer as boas práticas das cidades EUI e URBACT, partilhar experiências e conhecimento. Mais se seguirão este ano, incluindo um sob o mote da alimentação sustentável, em Liège (Bélgica), nos dias 29 e 30 de maio.
A organização de eventos conjuntos de divulgação EUI e URBACT tem vindo a ser também, cada vez mais, prática corrente em vários Estados-Membros da UE, incluindo Portugal. Vila Nova de Famalicão acolhe, nos dias 8 e 9 de maio de 2024, as primeiras ‘EUI & URBACT Infosessions’ nacionais, dedicadas ao 3.º Concurso para Ações Inovadoras EUI e ao Concurso de Boas Práticas URBACT. Este evento é promovido pela Direção-Geral do Território (DGT), na qualidade de Ponto de Contacto Urbano nacional da EUI e de Ponto URBACT Nacional, em conjunto com a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão.
Os pontos de contacto nacionais constituem contactos diretos para as autoridades de gestão da EUI e do URBACT e partes interessadas nacionais, incentivando as autoridades urbanas a beneficiarem das oportunidades para as cidades e vilas portuguesas. A colaboração e articulação entre ambos visa coordenar esforços e garantir a coerência entre estes dois instrumentos para o desenvolvimento urbano sustentável. Através destes esforços coordenados pretende-se contribuir para o sucesso da implementação de objetivos comuns às políticas de coesão e de cooperação territorial em Portugal, bem como da implementação da EUI e do URBACT IV a nível europeu.
Este artigo resulta de uma parceria com a DIREÇÃO-GERAL DO TERRITÓRIO e foi originalmente publicado na edição n.º 43 da Smart Cities – abril/maio/junho 2024, aqui com as devidas adaptações.
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