Uma onda verde tecnológica chegou finalmente às nossas cidades. A tecnologia foi trabalhada anos a fio, na “sombra”, e, muitos milhares de milhão de investimentos depois, eis que o resultado começa a povoar o espaço urbano. Trotinetas e carros eléctricos são apenas dois exemplos que qualquer um de nós reconhece como fruto da onda tecnológica verde. Para muitos, um cenário impensável há pouco mais de uma década.
Não quero falar no que muitos já sabem ou pensam que sabem. O óbvio é, por vezes, subjectivo e resultado de rótulos ditos ecológicos que nos são vendidos e ditam modas que muitos de nós acabam por seguir sem parar para pensar no assunto de uma forma integrada. O discernimento e a ponderação tornaram-se algo quase acessório num mundo refém da tecnologia que potencia a rapidez. Seria vantajoso termos em Portugal um movimento low technology forte…
Mas vamos a uma questão quente: será que mudar de um carro a combustão para um eléctrico muda o paradigma? Não, de todo! O ciclo de vida dos materiais é como o algodão, não engana. Os problemas são basicamente os mesmos, mesmo na questão climática, agora tão em voga graças à jovem activista Greta Thunberg.
“Num planeta com recursos limitados é pouco prudente deixar o comodismo prevalecer sobre a racionalidade”.
Valerá a pena degradar paisagens naturais que nos são queridas só para alimentar algo de supérfluo? O lítio é a questão do momento em Portugal e a extracção de recursos geológicos também o deveria ser, já que esta onda verde tecnológica só é possível devido à existência, finita, de recursos geológicos por baixo dos nossos pés. Extrair apenas os recursos que sejam realmente necessários deveria ser o mote, contudo e infelizmente, não é.
Mas, voltando aos carros eléctricos, fiquei perplexo ao ver uma publicidade de uma seguradora que anunciava que a compra de um dístico verde possibilitava, em Lisboa, nas zonas reguladas pela EMEL, estacionamento sem limites de tempo para todo o ano por uns meros 12 euros. Tudo isto à boleia do termo “eco”. Lamento desiludir-vos, mas o paradigma muda-se com menos carros nas cidades e mais transportes públicos, bem como privilegiando os modos suaves. O paradigma não muda trocando simplesmente de carro, seja ele movido a gasolina, seja movido a electricidade. Chega de greenwashing!
Focando a atenção agora nas trotinetas eléctricas, há umas semanas ia numa via pedonal ciclável e fui ultrapassado por um estudante universitário num destes veículos da moda. Não tenho nada contra as trotinetas eléctricas, a questão foca-se apenas no absurdo que é deixar de andar a pé ou de bicicleta para andar de trotineta. Num planeta com recursos limitados é pouco prudente deixar o comodismo prevalecer sobre a racionalidade. Já agora, as bicicletas são mais ecológicas do que as trotinetas eléctricas, sabiam? Se calhar até sabiam, mas nunca pararam para pensar nisto…
A lição que devemos retirar disto é que é essencial destrinçar o essencial do supérfluo. O essencial acarreta muito menos impactos negativos do que o supérfluo e essa é a questão basilar que nos vai condicionar nas próximas décadas.
#CIDADÃO é uma rubrica de opinião semanal que convida ao debate sobre territórios e comunidades inteligentes, dando a palavra a jovens de vários pontos do país que todos os dias participam activamente para melhorar a vida nas suas cidades. As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.