1. SOBRE A UTILIZAÇÃO DE DADOS E A MENÇÃO AO RASARP

É alegado que os dados apresentados pela ZERO referentes a 2024 se baseiam no RASARP de 2023, o que não é correto. A nossa análise utiliza dados de 2024 fornecidos diretamente pelos municípios ou obtidos através de fontes públicas, conforme explicitado no relatório. O que pode ter levado a confusão é a menção a 2023, mas tal como explicado no comunicado, apenas se usaram os dados de 2023 (publicados pela ERSAR) para comprovar quais são os municípios que alegadamente recolhem mais biorresíduos. Especificamente, para Cascais, os valores de 3.500 toneladas de biorresíduos alimentares e uma população de 190.000 habitantes foram calculados com base nas informações disponíveis à data da análise (notícias e a publicação de janeiro de 2025 do jornal do próprio município), considerando a população abrangida pelo sistema de
recolha.

Reconhecemos que a população total de Cascais em 2023 era de 219.000 habitantes (INE), mas a capitação foi calculada com base na população efetivamente abrangida pelo sistema, que, segundo os dados disponíveis, não cobria 100% do território. Se o objetivo é avaliar a eficiência do sistema de recolha, não teria muito sentido considerar a população total. De qualquer forma, se preferirem fazer o cálculo para a população total, terão de dividir 3500 toneladas por 219.000 habitantes, obtendo um resultado ainda pior.

2. SOBRE A INCLUSÃO DE RESÍDUOS VERDES

O foco principal da nossa análise foi a recolha de biorresíduos alimentares, uma vez que estes representam o maior desafio em termos de gestão. Por um lado, uma das novidades da Diretiva Quadro de Resíduos, transposta para o direito português mediante o RGGR (Regime Geral de Gestão de Resíduos), é a obrigatoriedade de recolher seletivamente os biorresíduos alimentares, não sendo estes englobados nos resíduos verdes. Por outro lado, considerando que a percentagem de resíduos verdes é muito inferior aos biorresíduos alimentares (10,51 vs 37,58%), será muito pouco provável que qualquer município consiga cumprir as metas europeias de preparação para reutilização e reciclagem (55% em 2025, 60% em 2030) apenas recolhendo os verdes. Mais uma razão para analisar separadamente estas duas frações é a metodologia de cálculo da ERSAR, que separa os “Biorresíduos alimentares recolhidos seletivamente pela entidade gestora” (indicador PdRU042b) dos “Biorresíduos recolhidos seletivamente” (PdRU043b).

Adicionalmente, a tabela apresentada inclui os resíduos verdes apenas para os municípios onde tal informação era comparável. No caso de Sintra e de Cascais, a ausência de informações pormenorizadas sobre resíduos verdes nas fontes públicas consultadas para o ano de 2024, levou à sua não inclusão.

3. SOBRE A EFICÁCIA DO MODELO DE CO-COLEÇÃO COM SACOS ÓTICOS

Apesar dos esforços de sensibilização e investimento realizados pelos quatro municípios, é verificado através da análise que o modelo apresenta limitações que comprometem a sua eficácia em comparação com sistemas porta-a-porta. A nossa análise, baseada em dados de 2024, demonstra que os municípios com PaP alcançam capitações de biorresíduos alimentares até oito vezes superiores (e.g., Guimarães com 144 kg/hab vs. Cascais com 18 kg/hab). A ausência de controlo sobre a deposição correta no modelo de sacos óticos, aliada à falta de incentivos financeiros diretos (como o PAYT) ou penalizações, resulta em taxas de captura inferiores, conforme evidenciado pelos dados apresentados. O maior problema deste modelo é que a população não é levada a mudar os seus hábitos de forma radical, não havendo qualquer penalização financeira, ou qualquer entrave logístico à entrega de resíduos indiferenciados, o que sim acontece no caso da recolha porta-a-porta.

Para além disso, é necessário contextualizar os valores monetários poupados e os supostos benefícios ambientais. A recolha porta-a-porta, embora mais intensiva em recursos, permite taxas de captura superiores a 60% (e.g., Guimarães), reduzindo significativamente a deposição de biorresíduos em aterro, o que conduz a menores impactos ambientais a longo prazo, incluindo a diminuição de emissões. Uma vez que uma entidade municipal ou equivalente escolhe alterar o sistema para o modelo porta-a-porta, terá de aumentar automaticamente a comunicação dirigida à população, existindo vários momentos de interação com o utente: entrega dos kits e materiais (sacos, contentores, chaves eletrónicas, etc), eventuais queixas dos munícipes sobre o novo sistema, altura em que recebe uma explicação sobre o funcionamento do novo modelo, durante a recolha caso haja uma entrega indevida recebendo um alerta com a recusa da recolha do contentor. Isto é, o modelo porta-a-porta implica que haja uma sensibilização reforçada que leva a acelerar a mudança de hábitos causada pelo novo sistema.

4. SOBRE A TRANSPARÊNCIA E A COBERTURA POPULACIONAL

Embora o Residómetro represente uma iniciativa de transparência e segundo as informações na mensagem enviada a cobertura do sistema de sacos óticos tenha atingido toda a população de Cascais no final de 2023, a cobertura total não assegura, por si só, elevada adesão ou captura no que diz respeito aos biorresíduos alimentares. A natureza voluntária do sistema, sem mecanismos de controlo ou incentivos financeiros, limita a participação ativa dos munícipes, como demonstrado pelas capitações de 18 kg/hab em Cascais e 20 kg/hab em Sintra, muito inferiores às de outros modelos.

Olhando para os dados disponibilizados pela ERSAR, a EMAC (Cascais Ambiente) recolheu 2031 toneladas de biorresíduos alimentares no conjunto de 33466 toneladas de biorresíduos totais. Os valores suscitam muitas dúvidas, pois são incongruentes com os valores publicados pela própria entidade em vários artigos na internet (referidos neste texto), indicando possíveis incongruências no reporte de dados entre a entidade em baixa e a ERSAR.

5. SOBRE O CONTRIBUTO PARA AS METAS DE 2030

É indicado que os quatro municípios atingiram 43% do objetivo de recolha seletiva de biorresíduos para 2030, com uma capitação média de 76 kg/hab/ano. Embora possa constituir um progresso, está abaixo do necessário para cumprir as metas europeias, que exigem uma redução significativa da deposição de resíduos urbanos biodegradáveis em aterro. O modelo de co-coleção, por depender da adesão voluntária, enfrenta dificuldades para escalar a recolha de forma a atingir os 100% da população com taxas de captura elevadas, ao contrário do que se observa em sistemas PaP.

Em Portugal, a diferença de outros países da União Europeia, não existem metas vinculativas para a taxa de captura de biorresíduos, embora existam indicações da Agência Portuguesa do Ambiente sobre o contributo que cada município e cada SGRU terá de dar, sem caráter vinculativo. Para o cumprimento das metas europeias em matéria de reciclagem (preparação para reutilização e reciclagem) deveremos aumentar sensivelmente, ao nivel nacional, não só a taxa de captura dos recicláveis (embalagens) mas também a taxa de captura dos biorresíduos alimentares.

No que diz respeito aos valores indicados na carta de pedido de esclarecimento (43% do objetivo definido para 2030 de biorresíduos), é com muita perplexidade que olhamos para os números disponíveis online (APA, ERSAR, notícias), detectando uma forte incongruência geral na apresentação dos mesmos, além não ser possível verificar aquele valor de 43%.

O relatório da APA relativo a 2023 (RARU), indica que os 4 municípios da Tratolixo têm uma produção total de RU de 490 mil toneladas (face às 422 mil toneladas referidas pela ERSAR). A caraterização física dos resíduos indica que 37.58% dos RU (176609 ton) corresponde a biorresíduos alimentares e 10.51% (49392) a biorresíduos verdes, perfazendo um total de 226 mil toneladas. Se os objetivos para 2030 (Metas intercalares APA) correspondem a uma captura de 70% dos biorresíduos disponíveis no sistema (158 mil toneladas), as atuais 58 mil toneladas recolhidas seletivamente perfazem apenas 29% do total, e não 43%.

Mesmo assim, para efeitos da análise sobre o desempenho de um sistema de recolha, torna-se enviesador utilizar os valores recolhidos de resíduos verdes, com um sistema próprio de recolha (https://ambiente.cascais.pt/pt/servicos/recolha-cortes-jardim) que pouco tem a ver com o sistema de recolha por sacos óticos. Por isso, a ZERO considera correto considerar apenas os biorresíduos alimentares recolhidos seletivamente, excluindo os resíduos verdes.

O texto acima é da responsabilidade da entidade em questão, com as devidas adaptações.