Por:
Gonçalo Crisóstomo e Marta Magalhães (Ponto de Contacto Urbano nacional da EUI)
A Parceria para a Alimentação da Agenda Urbana para a União Europeia, coordenada pela Área Metropolitana de Lisboa (AML) e pelo Município de Milão, é uma iniciativa inovadora que procura ajudar a transformar os sistemas alimentares urbanos na Europa. Iniciada em 2023, reúne um vasto leque de parceiros, incluindo autoridades nacionais, cidades, redes transnacionais, universidades e instituições europeias, todos empenhados em criar uma visão partilhada e sustentável para os sistemas alimentares. O propósito é ambicioso: promover mudanças sistémicas, aproveitando a colaboração e a liderança das cidades para enfrentar os desafios contemporâneos e futuros dos sistemas alimentares, com um impacto positivo em várias esferas, desde a saúde pública até à sustentabilidade ambiental.
Ao defender o alinhamento de políticas e a partilha de recursos, a Parceria para a Alimentação visa impulsionar a transformação sistémica na União Europeia, contribuindo para objetivos mais amplos, como o Pacto Ecológico Europeu e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. A parceria sublinha também a necessidade de uma legislação abrangente e de práticas inovadoras para garantir a resiliência e a justiça alimentar, esforçando-se por influenciar a regulamentação e o financiamento europeus, com enfoque nos desafios locais para ligar e reforçar as capacidades das cidades, apoiando transformações positivas nos sistemas alimentares.
A sustentabilidade e a eficácia da parceria são asseguradas através de uma organização multinível que aumenta a visibilidade e os contributos das cidades, permitindo o envolvimento de várias autoridades locais com base nas competências específicas e nos contributos necessários. Diversas ferramentas digitais para recolha, análise e visualização de dados facilitam perspetivas abrangentes sobre os sistemas alimentares, permitindo contribuições colaborativas, construção de cenários comparativos e tomada de decisões informadas. Tirando partido destas ferramentas, a parceria pretende apoiar as cidades na liderança da transformação para sistemas alimentares sustentáveis.
Transformar Sistemas Alimentares Urbanos na Europa
Para alcançar estes objetivos, a Parceria para a Alimentação alicerça-se num conjunto de valores críticos que orientam as suas atividades de monitorização. Estes valores incluem a manutenção de uma perspetiva de sistema alimentar, o apoio à governança multinível, a consideração do preço real dos alimentos (incluindo as externalidades) e o reconhecimento da alimentação como um direito humano e um bem comum. Para promover sistemas alimentares sustentáveis e equitativos, a parceria aborda temas-chave como a agroecologia, a justiça alimentar, o acesso ao solo e a gestão pública de solo, salientando a importância de localizar os sistemas alimentares, incorporar os custos externos da produção alimentar nos preços e incentivar a aquisição pública de alimentos locais e biológicos.
Integrando uma ampla gama de perspetivas e esforços de um conjunto diversificado de parceiros, a parceria promove uma abordagem integrada à transformação dos sistemas alimentares. Para além da AML e do Município de Milão, esta rede colaborativa inclui, entre outros parceiros, a Direção de Sistemas Alimentares de Malta, o Conselho Nacional Francês para a Resiliência Alimentar, a cidade de Ghent, a Eurocities, o Secretariado Europeu do ICLEI e várias Direções da Comissão Europeia. Cada parceiro contribui com conhecimentos e recursos únicos, aumentando a capacidade da parceria para enfrentar desafios complexos e implementar soluções eficazes para promover mudanças significativas nos sistemas alimentares na Europa.
A Parceria para a Alimentação deu já início a vários projetos e atividades destinados a promover sistemas alimentares sustentáveis. Por exemplo, um recente evento conjunto em Liège, na Bélgica, reuniu os membros da parceria para um intercâmbio intensivo sobre contratos públicos para alimentos locais, sazonais e sustentáveis. A reunião da Parceria para a Alimentação, seguida do EU City Lab, coorganizado pela Iniciativa Urbana Europeia (European Urban Initiative, EUI) e pelo URBACT, destacaram a importância de ferramentas práticas, oportunidades de aprendizagem entre pares e soluções colaborativas para promover a sustentabilidade do sistema alimentar.
Olhando para o futuro, a Parceria para a Alimentação irá centrar-se em temas relevantes como a segurança alimentar, a sustentabilidade do sistema alimentar, a resiliência alimentar, a sensibilização e educação dos consumidores, os contratos públicos sustentáveis, a agroecologia, a justiça alimentar, o acesso ao solo e a governação através de estratégias alimentares e conselhos alimentares. Focando-se nestes objetivos, a parceria pretende capacitar as autoridades locais para implementar e apoiar sistemas alimentares e paisagens saudáveis. Ao promover práticas sustentáveis e inclusivas, a parceria visa criar um impacto duradouro, garantindo que as comunidades urbanas possam prosperar com alimentos seguros, nutritivos e ambientalmente responsáveis.
Perspetivas da Área Metropolitana de Lisboa
Como cocoordenadora da Parceria para a Alimentação, a Área Metropolitana de Lisboa tira partido da sua posição estratégica para promover mudanças sistémicas nos sistemas alimentares urbanos. O seu envolvimento destaca-se pelo forte enfoque na disseminação de informação, partilha de boas práticas e identificação de oportunidades de financiamento. A AML procura articular e coordenar as plataformas de disseminação da Agenda Urbana para a União Europeia com as específicas da região, posicionando-se como um ponto focal para a troca de informação.
A AML está também empenhada em organizar iniciativas conjuntas que destacam as melhores práticas desenvolvidas pelos parceiros europeus. Esta abordagem não só apoia a capacitação dos atores do ecossistema urbano, como também amplia o conhecimento conjunto, incluindo o cruzamento de informação entre a sua Estratégia para a Transição Alimentar da AML e outras estratégias europeias semelhantes, para promover uma compreensão abrangente e a adoção de práticas sustentáveis.
Uma das iniciativas emblemáticas é a ‘AML Oportunidades – Ecossistema Metropolitano de Oportunidades de Financiamento’. Esta iniciativa identifica oportunidades de financiamento para os atores da Área Metropolitana de Lisboa, disponibilizando atualizações semanais e organizando sessões com entidades gestoras e promotoras. Focando-se em programas de desenvolvimento urbano, a AML reforça as capacidades financeiras dos atores locais, promovendo um ambiente propício ao desenvolvimento sustentável.
A Parceria para a Alimentação sublinha a importância de sistemas alimentares sustentáveis e equitativos, incluindo a promoção da agroecologia e a aquisição pública de alimentos locais e orgânicos. A AML integra estas preocupações no seu planeamento urbano e políticas de aquisição, esforçando-se por melhorar a justiça alimentar e o acesso a alimentos sustentáveis. A Estratégia Regional de Lisboa AML 2030, desenvolvida em colaboração com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), incorpora quadros estratégicos para a sustentabilidade e segurança alimentar. A estratégia identifica a ‘Sustentabilidade Ambiental e Alimentar e a Mitigação de Riscos Naturais’ como uma das suas cinco dimensões estratégicas.
A AML é uma das entidades coordenadoras da rede ‘FoodLink’, uma plataforma colaborativa que visa planear e gerir o sistema alimentar metropolitano de forma sustentável. Adicionalmente, a AML coordena o projeto ‘AML Alimenta’ juntamente com a A2S, a ADREPES e a DRAP-LVT, centrado na promoção de uma alimentação saudável na área metropolitana. Este projeto, integrado no Plano Nacional para uma Alimentação Equilibrada e Sustentável, envolve diversas entidades locais e promove ações de sensibilização e educação das comunidades para o consumo alimentar saudável e sustentável. Filipe Ferreira, secretário metropolitano da Área Metropolitana de Lisboa, destaca os esforços de colaboração da rede ‘FoodLink’ e do projeto ‘AML Alimenta’, sublinhando que «estas iniciativas são essenciais para a promoção de uma economia local circular e resiliente. Para além de promoverem práticas sustentáveis, criam oportunidades de emprego e melhoram a saúde pública».
A AML encontra-se igualmente a desenvolver, conjuntamente com a CCDR-LVT, a Estratégia para a Transição Alimentar na Área Metropolitana de Lisboa, uma política fundamental para o estabelecimento de um sistema alimentar sustentável e resiliente. Esta estratégia tem como objetivo criar modelos de negócio inovadores, melhorar a saúde e o bem-estar, e garantir a justiça social e ambiental. A estratégia dirige-se a todos os atores do sistema alimentar metropolitano, promovendo a produção de alimentos saudáveis, adequados e seguros, tendo em conta a justiça social e ambiental.
Acresce a promoção de processos de compras públicas sustentáveis, nomeadamente nos serviços de alimentação escolar. Em colaboração com os municípios e a CCDR-LVT, a AML define critérios para integrar a sustentabilidade e a resiliência nos sistemas alimentares locais. Esta iniciativa garante que as compras públicas apoiam os agricultores locais e as práticas alimentares sustentáveis. O Secretário Metropolitano sublinha a importância destas iniciativas: «O nosso objetivo é criar um sistema alimentar resiliente e sustentável que possa resistir aos desafios futuros, promovendo simultaneamente a saúde e o bem-estar. Ao integrar a sustentabilidade nos nossos processos de contratação pública, estamos a dar um exemplo a seguir por outras regiões», observa.
As experiências e lições apreendidas pela AML ilustram os benefícios práticos e o poder transformador dessas iniciativas, destacando a importância de um envolvimento contínuo e de uma colaboração estreita entre as cidades europeias. O compromisso com estes projetos demonstra uma abordagem integrada aos sistemas alimentares urbanos, abordando as dimensões económica, ambiental e social. Ao alavancar o apoio e os recursos da Parceria para a Alimentação, a AML está bem posicionada para liderar o caminho da transformação do sistema alimentar sustentável.
Rumo a Sistemas Alimentares Urbanos Mais Sustentáveis
A Parceria para a Alimentação da Agenda Urbana para a União Europeia representa um avanço significativo na abordagem dos complexos desafios que os sistemas alimentares urbanos enfrentam atualmente. Ao incentivar a colaboração, alavancar uma vasta gama de conhecimentos e promover soluções inovadoras, esta parceria tem o potencial de implementar mudanças profundas e duradouras para a sustentabilidade alimentar urbana, não só abordando os desafios imediatos, mas também estabelecendo as bases para um futuro onde as cidades possam prosperar através de práticas alimentares inovadoras e sustentáveis. Através deste esforço colaborativo, as cidades europeias estão a moldar um futuro mais sustentável e equitativo, onde todos podem ter acesso a alimentos nutritivos e seguros.
As parcerias da Agenda Urbana para a União Europeia representam uma nova abordagem de trabalho multinível, para a política e a prática urbanas, promovendo a cooperação entre os Estados-Membros, as cidades, a Comissão Europeia e outras partes interessadas. No período de programação europeu 2021-2027, o apoio à Agenda Urbana é prestado pela Iniciativa Urbana Europeia. A Direção-Geral do Território (DGT) é o Ponto de Contacto Urbano da EUI em Portugal, constituindo um contacto direto para as partes interessadas nacionais, incentivando as autoridades de gestão, organismos intermediários e autoridades urbanas a beneficiarem do apoio e oportunidades oferecidos por esta iniciativa.
Este artigo resulta de uma parceria com a DIREÇÃO-GERAL DO TERRITÓRIO; Iniciativa Urbana Europeia; e URBACT e foi originalmente publicado na edição nº 44 da Smart Cities – Julho/Agosto/Setembro 2024, aqui com as devidas adaptações.
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