Inquieto por natureza, José Carlos Mota faz do ensino, do ativismo e da participação cívica os principais cavalos de batalha de uma vida dedicada ao planeamento do território. Habituado a “lutar contra moinhos de vento”, o investigador universitário sonha com cidades mais amigas das pessoas e acredita que o caminho até lá passa pela cidadania.
“Vão sem mim, que eu vou lá ter” canta o refrão de o “Movimento Perpétuo Associativo”, a música dos Deolinda que José Carlos Mota tanto gosta. O professor do Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território da Universidade de Aveiro diz que este tema o faz querer tomar a iniciativa, puxar pelos outros e lutar contra a ideia de que os portugueses não participam em atividades cívicas e associativas. Para ele, agora sim, é tempo de perceber que os cidadãos querem mesmo ter um papel ativo na construção das cidades.
“Quando se criam processos transparentes e consequentes, cujos temas interessam às pessoas, elas envolvem-se e empenham-se de uma forma absolutamente notável. É por isso que assumi a missão pessoal e profissional de desfazer um mito urbano antigo”, diz o professor, que tem centrado muito do trabalho de investigação nas estratégias de envolvimento dos cidadãos ou, como também gosta de dizer, em como tornar a cidade num espaço mais amigo das pessoas. Neste processo, ele é muitas vezes o primeiro a arregaçar as mangas e a dar o exemplo, mesmo que a faceta de “investigador ativista” não corresponda a alguns cânones habituais da academia. “Na realidade, preocupam-me muito mais os académicos pacifistas, que arriscam pouco e não se envolvem diretamente com a realidade”, responde José Carlos Mota.
Esta atitude ativista revelou-se em Aveiro, para onde foi estudar planeamento do território, faz agora 40 anos. Por lá se tornou protagonista do movimento “Amigos da Avenida”, que teve uma participação intensa na discussão da cidade e “mostrou ao poder político que há sempre um plano alternativo de construção do território”. Mas já nessa altura, garante, preferia um “ativismo proativo e de soluções” a uma atitude meramente critica.
Há décadas que faz parte de inúmeras iniciativas de planeamento colaborativo e promoção da mobilidade sustentável, mas houve dois projetos que o marcaram de forma indelével. Um deles foi o processo participativo do PDM da Maia, cujo envolvimento dos cidadãos deu origem a um mapeamento de memórias coletivas com ideias para o concelho, “de modo a que o futuro possa vir a ser uma reinterpretação dos referenciais que tivemos no passado, caso do brincar na rua ou do reencontro com os espaços naturais”. Destaca ainda o trabalho com a comunidade cigana do bairro da Anta, na Maia, no âmbito do Laboratório de Cidadania pela Inclusão, que “contribuiu para que uma população extremamente pobre deixasse de ser a destinatária da ajuda pública, como quase sempre acontece, para ser protagonista em ações de transformação que geraram mudanças profundas”.
Atualmente, o investigador também se dedica de corpo e alma à Casa da Participação, uma associação de Aveiro que tem por objetivo criar espaços onde os cidadãos possam estabelecer laços comunitários e participar na construção da comunidade. O sonho de José Carlos Mota é ajudar a abrir casas como esta por todo o país, fazendo delas “um ponto de encontro privilegiado que alimente colaborativamente os desejos de um futuro melhor”.
Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 43 da Smart Cities – Abril/Maio/Junho 2024.