“Cidades inteligentes” (smart cities) e “cidades sustentáveis” são conceitos que costumam andar de mãos dadas, mas que têm, porém, significados distintos.

Graças aos projetos smart city bem-sucedidos que agora podemos encontrar por todo o mundo, o conceito de cidade inteligente está a ser rapidamente encarado como uma forma de apoiar o desenvolvimento de áreas locais. É esse o caso, em particular, do apoio a objetivos de sustentabilidade, como a redução das emissões de carbono ou a melhoria da eficiência energética. No entanto, surgiram algumas barreiras que complicam a visão de cidades inteligentes e sustentáveis. Por exemplo, surgiram algumas preocupações de que o conceito de cidade inteligente não presta atenção suficiente a fatores ambientais, bem como a ideias chave frequentemente integradas na transição para a sustentabilidade, como a equidade e a justiça social.

Outro aspeto a ter em conta é que os projetos smart city envolvem normalmente a adoção de tecnologia, o que poderá significar um aumento da utilização de materiais. Por exemplo, alguns projetos de “mobilidade inteligente” incluem novas instalações de sensores e câmaras por toda a cidade. O potencial aumento da utilização de materiais não é, muitas vezes, tido em consideração, e pode ter implicações ambientais e sociais ao longo das cadeias de fornecimento de materiais. Como resultado destas considerações, é importante compreender de que forma as cidades podem tornar-se simultaneamente inteligentes e sustentáveis.

Qual é a diferença?

Existem semelhanças entre o conceito “cidade sustentável” e o conceito “cidade inteligente”, mas há algumas diferenças importantes a salientar. Estudos realizados mostram que as cidades sustentáveis estão mais focadas em aspetos ambientais e sociais, ao passo que as smart cities dão mais destaque aos aspetos económicos e sociais de uma cidade (Ahvenniemi et al., 2017).

Efetivamente, as cidades sustentáveis são caracterizadas por um foco ambiental mais direcionado. Considera-se que as cidades sustentáveis têm necessidades que estão dentro da capacidade das respetivas áreas circundantes (Kennedy et al. 2007). As cidades sustentáveis também tentam reduzir o respetivo consumo, com vista a reduzir os impactos negativos que a vida urbana tem, muito para além do território em si (Höjer & Wangel, 2014). Isto leva a que as cidades sustentáveis prestem atenção a conceitos como justiça e igualdade, tanto a nível interno como externo, para além das preocupações ambientais.

Contudo, apesar do pouco peso inicial colocado na importância dos fatores ambientais, o conceito de cidade inteligente parece estar a direcionar-se para a abordagem de questões relacionadas com a sustentabilidade. Tradicionalmente, a smart city tem sido retratada como uma dicotomia entre uma concetualização mais focada na tecnologia versus uma concetualização holística.

Não obstante, uma visão holística das cidades inteligentes que inclui questões ambientais está a tornar-se mais difundida recentemente. Esta perspetiva é encontrada na literatura académica (Meijer and Bolívar 2016; Mora et al. 2019; Sharifi 2019) e em organizações internacionais ou regionais, como a Comissão Europeia.

De facto, a forma como a Comissão Europeia encara as cidades inteligentes aborda diretamente o modo como as cidades podem potenciar a tecnologia para melhorar a utilização de recursos, reduzir as emissões e atualizar os transportes urbanos e as instalações de eliminação de resíduos. Paralelamente, surgiu um conceito separado, mas estreitamente relacionado, da “cidade sustentável inteligente”, que pode ser definido como uma cidade que utiliza tecnologia para melhorar a sustentabilidade de uma área local.

Como criar cidades inteligentes sustentáveis?

Uma vez que todas as cidades têm contextos únicos, não existirá uma solução universal para se tornarem “cidades inteligentes e sustentáveis”. No entanto, alguns pontos ajudam a fornecer algumas sugestões. Em primeiro lugar, os municípios podem integrar mais indicadores ambientais nas respetivas estratégias de cidade inteligente. Para começar, os indicadores ajudarão as cidades a compreender algumas métricas ambientais básicas relativas à sua cidade, como a concentração de partículas finas (PM2,5), as emissões de gases de estufa per capita e os resíduos municipais produzidos per capita. De seguida, as cidades podem começar a acompanhar e a medir estes indicadores. Esta abordagem não só acompanha o progresso ambiental global, como também mostra se as políticas ou os projetos relacionados com a cidade inteligente estão a ajudar a melhorar os resultados de sustentabilidade na cidade.

Em segundo lugar, as cidades podem utilizar dados em tempo real, reunidos a partir de soluções das TIC, no sentido de fornecer elementos para a formulação de políticas baseadas em provas que apoiam a sustentabilidade. Por exemplo, numa zona de Estocolmo, os fluxos de energia e de materiais são medidos em tempo real para compreender as necessidades urbanas. Compreender estes fluxos pode ajudar a reduzir a utilização de energia, a poluição e os resíduos (Bibri & Krogstie, 2020). Em geral, as cidades inteligentes e sustentáveis podem utilizar este tipo de dados para tomarem as suas decisões e conduzirem a orientação do desenvolvimento da cidade inteligente.

Num terceiro ponto, as cidades que pretendem tornar-se inteligentes e sustentáveis podem ter ativamente em consideração os materiais que são necessários para qualquer solução tecnológica. O planeamento de uma utilização de soluções a longo prazo (sensores, telemóveis, novos métodos de transporte como um programa público de bicicletas partilhadas, etc.) ajuda a garantir que os materiais são aproveitados ao máximo para evitar resíduos desnecessários. A adoção de soluções com conceções inteligentes utilizando materiais reduzidos também pode apoiar este objetivo. Estas duas práticas podem ser aliadas a programas de retoma e reutilização patrocinados pela cidade, tendo em vista a eliminação adequada de materiais de dispositivos tecnológicos ou a tentativa de dar uma nova vida aos produtos usados.

Por último, as cidades inteligentes podem ser construídas de uma forma que apoie uma sociedade equitativa. Um exemplo disso é o desenvolvimento de soluções inteligentes e sustentáveis que sirvam a maioria da população, como Wi-Fi público gratuito em toda a cidade. Mais genericamente, as iniciativas de cidades inteligentes podem envolver contribuições do público desde as etapas iniciais do seu desenvolvimento, garantindo que são consideradas as várias opiniões da sociedade e contribuindo para resultados que melhoram a qualidade de vida dos cidadãos em geral.

Ao considerar estas sugestões, as cidades podem começar a repensar a forma como se podem tornar inteligentes e sustentáveis. Uma vez que as cidades contribuem significativamente para problemas ambientais prementes, como as alterações climáticas, mas também têm uma grande capacidade para combaterem estes problemas, as cidades inteligentes e sustentáveis podem ajudar a apoiar as transições para a sustentabilidade em todo o mundo. É recomendável que os decisores políticos e as partes interessadas locais tenham em consideração este tipo de iniciativas nas suas próprias áreas locais.

Referências:

Ahvenniemi, H., Huovila, A., Pinto-Seppä, I., & Airaksinen, M. (2017). What are the differences between sustainable and smart cities? Cities, 60, 234–245.

Bibri, S. E., & Krogstie, J. (2020). Smart Eco-City Strategies and Solutions for Sustainability: The Cases of Royal Seaport, Stockholm, and Western Habor, Malmö, Sweden. Urban Science, 4(11), 1–42.

Höjer, M., & Wangel, J. (2014). Smart sustainable cities: Definition and challenges. Advances in Intelligent Systems and Computing, 310, 333–349.

Kennedy, C., Cuddihy, J., & Engel-Yan, J. (2007). The Changing Metabolism of Cities. Journal of Industrial Ecology, 11(2), 43–59. Meijer, A., & Bolívar, M. (2016). Governing the smart city: a review of the literature on smart urban governance. International Review of Administrative Sciences, 82(2), 392–408.

Mora, L., Deakin, M., Reid, A., & Angelidou, M. (2019). How to Overcome the Dichotomous Nature of Smart City Research: Proposed Methodology and Results of a Pilot Study. Journal of Urban Technology, 26(2), 89–128.

Sharifi, A. (2019). A critical review of selected smart city assessment tools and indicator sets. Journal of Cleaner Production, 233, 1269–1283.

 

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