Braga prepara-se para ser a capital das Cidades Criativas da UNESCO, ao receber entre 1 a 5 de julho a XVI conferência desta rede internacional composta por 350 municípios de mais de uma centena de países.

A pouco mais de uma semana do início do evento, que envolve também outras três cidades do norte do país, a Smart Cities falou com a coordenadora geral e executiva da Braga Media Arts, Joana Miranda. A responsável lembrou a importância do encontro, levantou o véu sobre o programa e lembrou que “sem a criatividade, o risco e a cultura, é impossível que uma cidade se torne mais verde”.

Qual o significado e importância de Braga acolher a XVI Conferência Anual da Rede das Cidades Criativas da UNESCO?

Desde logo, é um importante reconhecimento dos pares, já que o processo de seleção é feito através do voto das 350 cidades que compõem a rede, e depois confirmado pela própria UNESCO. Por isso, trata-se do reconhecimento do trabalho que Braga fez desde que entrou na rede, em finais de 2017, do programa que apresentou e da sua capacidade de organizar um evento deste tipo. E não esqueçamos que se trata de uma reunião oficial dentro do quadro das Nações Unidas. Para nós, isso é muito relevante, porque valoriza o percurso de Braga, que é Cidade Criativa da UNESCO no domínio das Media Arts, e todos os programas que desenvolveu localmente, regionalmente, nacionalmente e internacionalmente.

Neste momento, a poucos dias da conferência se iniciar, representa também um grande desafio porque, sendo uma coorganização com a UNESCO, inclui ainda uma particularidade: convidámos a juntarem-se à nossa candidatura outras três cidades criativas: Amarante, Cidade da Música; Barcelos, Cidade do Artesanato; e Santa Maria da Feira, Cidade da Gastronomia. Isso implica que vamos fazer projetos conjuntos, apresentados em Braga, mas durante um dia da conferência, 4 de julho, os delegados também irão a estas cidades participar em programas específicos, alargando o impacto do evento à região norte.

Quantos conferencistas deverão passar por Portugal para participar no encontro?

Neste momento, temos 600 delegados inscritos e cerca de 20 convidados externos. Muitos destes delegados são representantes políticos, como presidentes, vice-presidentes ou vereadores das câmaras, e o resto são os chamados pontos de contacto, ou seja, pessoas que organizam e implementam os programas dessas cidades, enquanto Cidades Criativas da UNESCO.

Trazer a juventude para a mesa das negociações na próxima década é o mote do encontro. Porquê a escolha deste tema?

Escolhemos este tema por várias razões, entre elas o facto de estarmos a comemorar os 20 anos desta rede, que teve início em 2004 e cresceu muito nos últimos anos. Isto porque as cidades estão cada vez mais conscientes da importância da criatividade e da cultura nas suas estratégias municipais, seja de inclusão, turísticas ou outras. Neste momento são já 350, de todo o mundo, e só no ano passado entraram 53 novas cidades.

Além disso, as cidades criativas também estão muito ligadas à implementação da Agenda 2030, aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. E uma vez que 2030 é já ali, entendemos que podia ser um momento importante para olhar para trás e para as conquistas que a rede já teve, bem como para uma avaliação da UNESCO que iremos apresentar, onde se mede de forma qualitativa e quantitativa o impacto que esta designação tem para as cidades.

Vamos olhar para aquilo que somos hoje e, principalmente, para o futuro. O que será, para que serve uma rede destas e como tem cada vez mais protagonismo e mais possibilidades de implementação de políticas. Uma ação que, de facto, pode alterar a vida dos cidadãos. Isto, querendo ouvir a juventude e trazendo-a para a mesa da discussão. Não, não é um fórum da juventude, mas os jovens devem ser escutados, ouvidos e respeitados, na mesma medida em que estamos a ouvir os convidados, os presidentes de câmara, os representantes das cidades. E temos de começar a pensar no pós 2030, por isso é importante ouvir aqueles que vão viver esse tempo.

Braga é Cidade Criativa da UNESCO desde 2017. © Braga Media Arts

O que destaca do programa de cinco dias, tanto em Braga como nas outras três cidades?

Embora o programa ainda não seja público, destacaria o dia da high-level roundtable, em que há uma série de convidados internacionais, fora da rede, que vêm discutir connosco várias questões. E também outra sessão com os presidentes de câmara, em que vamos abordar um dos principais outcomes desta conferência: o Manifesto de Braga. Vamos propor a assinatura de um manifesto, muito relacionado com as conclusões de um outro documento assinado no México em 2022, promovido pela UNESCO e pelas Nações Unidas.

No fundo, o manifesto alinha-se com esse grande documento e une-se a essa voz, mas do ponto de vista das cidades. Consideramos que na próxima Agenda a cultura seja, em si própria, um Objetivo [de Desenvolvimento Sustentável]. Queremos que quando as Nações Unidas começarem a pensar no que será a Agenda pós 2030, tenham mais um conjunto de vozes a dizer que a cultura deve ser um objetivo. E mais do que isso, além dos presidentes da câmara promoverem e assinarem este manifesto, vamos também propor um caminho para lá chegar, dizendo aos representantes políticos que implementem um conjunto de ações para progredirmos de forma mais consequente. Para que a cultura, de facto, seja cada vez mais relevante e mais importante, de modo a fazer parte das estratégias distintivas das cidades.

É claro que também teremos sessões mais ligada à juventude e depois, na quinta-feira, cada uma das outras cidades irá abordar três temas diferentes. Barcelos vai tratar a questão da sustentabilidade e discutir o tema com todas as cidades inscritas e Santa Maria da Feira vai abordar as questões da inovação e de como é que as novas tecnologias estão a alterar os ofícios e as formas de nos relacionarmos com os cidadãos. Já Amarante trabalhará a questão dos espaços públicos e de que modo eles se podem tornar mais inclusivos e mais verdes. Estas três temáticas estão alinhadas com o programa geral, mas pedimos às cidades que desenvolvessem iniciativas a partir das suas experiências locais.

Que papel deve assumir a criatividade no desenvolvimento urbano e no processo de descarbonização das cidades?

Deve estar presente em tudo! A questão é a forma como essa criatividade deve ser assumida, porque ela está subjacente a todas as decisões. É fundamental, por exemplo, para mudar comportamentos. Sem a criatividade, o risco e, diria também a cultura, é impossível que uma cidade se torne mais verde, use mais transportes públicos ou reduza os combustíveis fósseis, por exemplo. Se não introduzimos novas formas de pensar, novas alternativas, não investimos em alterações de comportamento, não haverá mudanças.

Quando colocamos a criatividade no centro das decisões e permitimos risco, abertura e diálogo, é a única maneira de conseguimos mudar alguma coisa. Agora, temos de aceitar e perceber que a criatividade também tem muitas formas. No fundo, é ter um espaço aberto e de diálogo. Se ninguém me quiser ouvir, é impossível ser criativo ou ouvir a criatividade.