Numa altura em que decorrem cerca de 20 anos depois de ter sido publicada a Portaria 303-A/2004 que introduziu no Aeroporto de Lisboa exceções à regra geral de proibição de voos entre as 00h e as 06h (Decreto-Lei 292/2000), a ZERO contabilizou todos os voos de passageiros que nas duas últimas semanas descolaram e aterraram em período noturno entre as 23h e as 7h.

A referida Portaria estabelece máximos entre as 00:00 e as 06:00 de 91 movimentos aéreos semanais e de 26 diários. Porém, nas duas últimas semanas, foram contados pela ZERO no referido período, com base em informação pública disponibilizada pela ANA Aeroportos, 139 movimentos aéreos (mais 48 que o permitido) na semana compreendida entre 12 e 18 de agosto e 158 movimentos aéreos (mais 67) na semana decorrida entre os dias 19 e 25 do mesmo mês, violando os limites estabelecidos na legislação que abriu lugar a exceções em 2004.

No dia 20 de agosto foram registados 33 movimentos aéreos entre as 00h e as 6h, transgredindo o máximo diário permitido pela exceção à lei geral estabelecida na Portaria atrás referida, podendo ter existido mais dias durante as duas semanas avaliadas em que o máximo permitido tenha sido transgredido, uma vez que os voos de carga, charters ou os jatos privados não foram incluídos na contagem realizada.

O último número conhecido quanto ao valor global das coimas aplicadas nestes casos é de apenas 52.400 euros em 2022, o que desprezável face aos 206 milhões de euros em custos para a saúde pública que foram apurados em 2019 pelo Grupo de Trabalho da Assembleia da República no âmbito do Estudo e Avaliação do Tráfego Noturno do Aeroporto Humberto Delgado.

Mais de dois anos decorridos, as conclusões do referido Grupo de Trabalho, produzidas com a participação de todos os atores relevantes e entregue ao Ministério das Infraestruturas, não foram ainda aplicadas. Entre essas conclusões estava a necessidade de proibir todos os voos entre a 1h e as 5h da manhã, o que nestas duas semanas esteve longe de se verificar, como aliás é regra geral. Na primeira semana foram observados neste período 27 movimentos aéreos e na segunda 29 voos que perturbaram o sono de centenas de milhares residentes nos concelhos de Lisboa, Loures, Vila Franca de Xira e Almada, num período em que geralmente o descanso atinge a sua fase mais profunda, produzindo graves consequências para sua saúde.

Perante a gravidade da situação, a ZERO quer que as autoridades apliquem as conclusões do Grupo de Trabalho que analisou os voos noturnos no Aeroporto de Lisboa, garantindo que, num primeiro passo, no verão IATA de 2025 sejam totalmente proibidas as operações de aterragem e descolagem no Aeroporto Humberto Delgado no período entre a meia-noite e meia e as cinco da manhã.

Além desta medida absolutamente crucial, outras medidas devem ser adotadas com a máxima urgência, antes de se terminar completamente com os voos noturnos:

1. Instauração de um período sem voos agendados entre as 0h e as 5h da manhã, com flexibilidade para movimentos com atraso poderem ocorrer até à meia-noite e meia.;

2. Devem ser apenas permitidas aeronaves com os mais modernos sistemas de redução do impacto sonoro no denominado período noturno de acordo com a legislação do ruído (23h – 7h);

3. Obrigatoriedade, por parte do gestor da infraestrutura, da publicação mensal do número de pessoas afetadas por níveis de ruído noturno acima dos 45 dBA;

4. Definição de uma estratégia para o cumprimento da lei do ruído começando com o estabelecimento de um limite anual de voos e do alargamento progressivo do período horário em que vigore a proibição total de movimentos aéreos entre a 00.30h e as 5h da manhã até ao encerramento definitivo do Aeroporto Humberto Delgado, que deve ser acelerado;

5. Aplicação de uma taxa de ruído aos voos em função das suas emissões sonoras, que possa complementar o investimento crucial na mitigação do ruído, da responsabilidade da ANA Aeroportos, que tem de executar todas as medidas necessárias independentemente das receitas desta eventual taxa; o valor global das taxas de ruído deve, num prazo de cinco anos, aproximar-se dos custos anuais para saúde pública apurados por entidade independente;

6. Revisão das coimas por violação da legislação que regula os voos noturnos de modo a tornarem-se verdadeiramente dissuasoras.

Por fim, a ZERO apela à Autoridade Nacional para a Aviação Civil (ANAC) que disponibilize de forma transparente informação detalhada sobre os voos realizados entre as 0h e as 06h, identificado aqueles que violaram a legislação, quais as penalizações aplicadas e quais os valores cobrados às companhias aéreas.

De acordo com o contador da ZERO presente na página zero.ong, os custos do não encerramento do Aeroporto Humberto Delgado estão já perto dos 10 mil milhões de euros desde 2015, ano em que a infraestrutura deveria ter sido encerrada.

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