Na sequência do anúncio do acordo entre o Governo e a Web Summit para prolongar a permanência desta conferência em solo luso por mais dez anos, iniciei uma sondagem no Facebook que difundi pela minha rede de contactos. Os resultados foram claros: 80% das pessoas consideram que, de facto, a Web Summit continuar em Lisboa por mais dez anos constitui uma boa notícia; 20% pensam que não.

Foi aqui que as coisas se começaram a complicar naquilo que, à partida, parecia uma ótima notícia para Portugal. Primeiro, pelo perfil das pessoas que responderam que não, claramente, um perfil de profissional ligado à inovação de base tecnológica, que já frequenta a Web Summit desde os tempos de Dublin e já percebeu até onde podem ir os benefícios que se podem retirar de um evento como este. Depois, surgiu a pergunta que, efetivamente, tem também resistido na minha cabeça desde 2016: é bom para Portugal ou é bom apenas para Lisboa?

 

Gostava de ver as contas para perceber como se chega a um impacto da Web Summit na economia nacional superior a 3 mil milhões de euros. E pergunto-me, ainda, que percentagem tem um destino diferente de Lisboa.

Não há dúvidas sobre o valor que a Web Summit aportou ao ecossistema de inovação de Portugal, mas que se refletiu, mais concretamente, em Lisboa. Veio reforçar uma dinâmica que já vinha a ser crescente, mas que com esta “vitamina irlandesa” foi substancialmente acelerada. Colocou Portugal na agenda digital e a agenda digital na ordem do dia nacional. Teve, com toda a certeza, responsabilidade no bom desempenho que o sector do Turismo tem apresentado. Seria fácil de antecipar, quando, em 2015, Portugal garante a realização da primeira edição em Lisboa, um boom de investimento no ecossistema nacional, mas, efetivamente, os dados indicam-nos que, de 2016 para 2017, este decaiu, ficando Portugal atrás de países como a Roménia, Polónia ou Estónia. O que terá corrido mal? Que oportunidades foram desaproveitadas? O que deve ser corrigido já na próxima edição em novembro?

Mas onde estaremos daqui a dez anos? Há dez anos, em 2008, Barack Obama era eleito o 44º presidente dos Estados Unidos da América, hoje, temos um cenário muito diferente com Donald Trump. Há dez anos, em 2008, o Governo de Portugal anunciava baixar o IVA de 21% para 20% para anunciar, dois anos depois, uma subida para 23%. Numa década, muita coisa muda nas conjunturas nacional e internacional. Dá que pensar, não dá?

O assumir de compromissos a dez anos exige convergência e consenso amplos e generalizados, assim como também exige dados concretos, tangíveis e objetivos para dissipar qualquer dúvida relativamente ao investimento previsto de 110 milhões de euros, para além do investimento na duplicação do espaço da FIL, onde é justo que, de imediato, surjam questões relativamente à sua sustentabilidade. Quantos eventos Lisboa já deixou de receber por limitação de espaço da FIL? Qual a base que levou a um investimento anual de 11 milhões de euros por ano (nos próximos dez anos) na Web Summit?

Já qualquer pessoa percebeu que a Web Summit é, antes de tudo, uma poderosa máquina de marketing e, como tal, não é totalmente surpreendente ouvir da boca de Paddy Cosgrave afirmações como “Espanhóis apresentaram ofertas incríveis, mas seria triste abandonar Lisboa” ou “Nos últimos meses, outras cidades, como Berlim, Londres e Valência, propuseram quantias maiores e espaços mais amplos, mas foi Lisboa a vencedora”. Acredito mesmo que uma cláusula indemnizatória superior a 3 mil milhões de euros em caso de incumprimento não assuste Paddy Cosgrave. Aliás, desresponsabiliza-o, porque passa a partilhar a responsabilidade de continuar a fazer crescer a Web Summit de forma muito mais confortável com o Governo.

Não sou, na vida, o Velho do Restelo, nem o quero ser neste tema, mas gostava de ver as contas para perceber como se chega a um impacto da Web Summit na economia nacional superior a 3 mil milhões de euros. E pergunto-me, ainda, que percentagem tem um destino diferente de Lisboa.

As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.