A eleição de Donald Trump como 45º Presidente dos Estados Unidos da América (EUA) apanhou o mundo de surpresa e levantou grandes incertezas a vários níveis, naquela que será certamente uma nova postura e relação dos EUA no contexto internacional.
Numa altura em que decorre, em Marraquexe, a Conferência do Clima da ONU sobre Alterações Climáticas, cujo grande objetivo é definir as bases para a implementação do histórico Acordo de Paris, as negociações ficaram inevitavelmente marcadas pela entrada de Trump na Casa Branca e o grande ponto de interrogação que isso veio trazer.
Apesar do discurso de esperança e optimismo mantido pelos responsáveis da ONU e vários líderes políticos, a verdade é que a análise dos factos deixa antever um caminho muito mais difícil para a implementação do Acordo de Paris, o primeiro tratado global com vista à redução das emissões de carbono para a atmosfera, com o grande objetivo de manter o aumento da temperatura média do planeta nos 1,5 graus Celsius face aos níveis pré-industriais.
À data de hoje, o documento tinha sido já ratificado por 109 das 197 partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC), incluindo-se aqui grandes poluidores como o Japão e a Austrália, que só recentemente o fizeram.
Os próprios EUA já tinham ratificado o Acordo de Paris a 3 de setembro, em simultâneo com a China, num passo histórico que antevia um caminho mais fácil para atingir os objetivos climáticos acordados. Contudo, Trump venceu e uma das suas promessas de campanha, agora novamente reafirmada, passa por tirar os EUA do Acordo de Paris e cortar o financiamento (de milhões de dólares) destinado aos programas da ONU de luta contra as alterações climáticas.
Por outro lado, sabe-se já que Trump escolheu Myron Ebell, um dos mais conhecidos cépticos do clima, para liderar a sua equipa de transição na EPA – Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, o que deixa antever uma intenção de reformular as políticas climáticas do país.
Se Trump pode travar a implementação do Acordo de Paris? Não, de acordo com Ségolène Royal, ministra francesa do Ambiente. Tendo já sido ratificado por um número de países que representa 70% das emissões globais de gases com efeito de estufa, o Acordo de Paris prevê que os mesmos o cumpram pelo menos durante quatro anos.
Contudo, existem cenários que podem não ser assim tão impossíveis, principalmente tendo em conta a maioria republicana na Câmara dos Representantes e no Senado. Uma eventual nova lei que venha a ser aprovada, exigindo a saída dos EUA do Acordo de Paris, é uma das conjecturas avançada por especialistas, segundo os quais a mesma lei poderá ter mais força, internamente, do que um tratado internacional.
Uma eventual saída dos EUA do Acordo de Paris ou até da UNFCCC terá certamente um preço político a pagar, numa altura em que a Rússia, cuja relação com os EUA poderá estar à beira de uma nova era, não ratificou ainda o Acordo de Paris.
Além de assumidamente descrente em relação às alterações climáticas, especialistas afirmam que é quase certo que Trump abandone ou enfraqueça o Plano de Ação Climática e o Plano de Energia Limpa, lançados por Obama, com base nas afirmações que foi fazendo nos últimos meses.
Será certamente uma nova era na política climática e energética dos EUA, com Trump no comando. Resta esperar para perceber que impactos isso poderá ter ao nível da comunidade internacional, nomeadamente no esforço global para descarbonizar as economias mais poluentes do planeta, sem esquecer a ajuda necessária às nações menos desenvolvidas para enfrentarem as consequências já visíveis das alterações climáticas.
A publicação deste artigo integra-se numa parceria entre a revista Smart Cities e a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, com vista à promoção de comportamentos mais sustentáveis.