Roland Busch, membro do Conselho de Administração da Siemens AG, revela os planos da empresa para alcançar uma pegada de carbono zero até 2030. Em Portugal, onde “as cidades são já muito activas no campo da sustentabilidade”, a Siemens assumiu um compromisso sério com a eficiência energética, estando envolvida em vários projectos.

 

A Siemens pretende ser a primeira grande empresa industrial a alcançar mundialmente uma pegada de carbono zero até 2030. Que impactos esperam ter ao nível das cidades?

Com o objectivo de reduzir as nossas próprias emissões de CO2, criámos uma série de oportunidades que podem ser utilizadas pelas cidades, a fim de abrir caminho para cidades energeticamente mais eficientes. Nos próximos três anos, a Siemens vai investir, a nível mundial, 100 milhões de euros nas suas maiores instalações de produção para implementar medidas de eficiência energética, que combinam investimentos tanto em edifícios como em processos de produção. Estes investimentos não ajudarão só a reduzir as emissões de CO2, temos a expectativa de que possam proporcionar poupanças suplementares na ordem dos 20 milhões de euros por ano em custos de energia. Os edifícios constituem uma importante fonte de emissões de CO2nas cidades, sendo, a nível mundial, responsáveis por mais de 40% do consumo de energia por parte dos utilizadores finais. Ao automatizar e integrar diferentes subsistemas nos edifícios, tais como tecnologia de ponta, podemos ajudar as cidades a alcançar as suas metas de CO2 e reduzir os custos.

Que estratégia têm definida?

No total, as nossas operações e 300 fábricas são responsáveis pela emissão anual de 2,2 milhões de toneladas métricas de CO2. Reduzir a nossa pegada em 50% significaria reduzir as emissões em cerca de 1,1 milhões de toneladas de CO2, ou seja, o equivalente às emissões de 90 mil lares norte-americanos. Para este objectivo, a fábrica de Krefeld, na Alemanha, por exemplo, onde são construídos e montados os nossos comboios de alta velocidade e de transporte suburbano, já implementou um pacote completo de medidas de eficiência energética, incluindo uma central de cogeração a gás para fornecer aquecimento e energia, e ainda um sistema de monitorização de energia.

Que outros exemplos podemos encontrar?

Também vamos utilizar as instalações da empresa para demonstrar os benefícios dos sistemas de produção de energia distribuída. Combinar, por exemplo, a produção de energia – centrais de produção distribuída de energia, energia eólica, energia fotovoltaica – com soluções de armazenamento e tecnologias inteligentes de gestão de energia é um cenário do futuro que já tem exemplos no presente. Estamos igualmente a analisar de que forma as soluções de produção distribuída de energia irão fazer parte integrante do fornecimento de energia para as nossas instalações e que papel a produção de energia pode desempenhar no novo parque eólico em Cuxhaven e no nosso Campus em Erlangen. Considerando que a frota de automóveis da Siemens (cerca de 45 mil veículos) é responsável por cerca de 300 mil toneladas de emissões de CO2 por ano, estamos a incluir os veículos da empresa na meta de chegar a uma pegada de carbono zeroPor fim, vamos mudar as nossas directrizes de compra de energia e avançar para um mix de energia significativamente mais limpo com um forte enfoque nas energias renováveis ​​e no gás. Podia até dizer-se que iremos comprar energia produzida nas instalações dos nossos clientes pelas nossas tecnologias.

Como é que a empresa está a reduzir a sua pegada em Portugal?

Estamos a aplicar activamente as nossas soluções nas nossas instalações para sermos energeticamente mais eficientes. Temos, por exemplo, um Green Building Monitor instalado na entrada principal da nossa sede [em Alfragide]. Esta solução fornece, em tempo real, informações importantes acerca do edifício, tais como os consumos de água e de energia, explica como o nosso comportamento pode impactar estes consumos, e indica, entre outros, as emissões de CO2 das infra-estruturas. Além disso, no telhado do edifício da cantina estão instalados colectores solares que asseguram o aquecimento das águas sanitárias. Para ajudar a reduzir a intensidade de iluminação e de temperatura em cada área e por piso em cada edifício, estamos a aplicar o Desigo Insight, que utiliza sensores que medem constantemente estes dois indicadores. Também instalámos sensores de presença em vários locais dos edifícios para reduzir os consumos de energia. Entre outras iniciativas, todas as lâmpadas convencionais, usuais no passado, foram substituídas por LEDs, que são mais eficientes e consomem menos energia. Em consequência destas medidas, conseguimos em 2014 reduzir o consumo de energia dos nossos edifícios em 4%. Estamos também, actualmente, a participar num projecto-piloto lançado pela ALD Automotive e pela ADENE – Agência Portuguesa para a Energia, que visa lançar as bases de um processo de Certificação Energética de frotas automóveis.

Como avalia o progresso das cidades portuguesas no campo da sustentabilidade?

As cidades portuguesas são já muito activas neste campo. Cascais, Lisboa e Porto, por exemplo, estiveram entre as 12 cidades europeias a concorrer ao European Green Capital Award 2017. No Green City Index, um estudo desenvolvido para a Siemens pela Economist Intelligent Unit, a cidade do Porto ocupava a 12a posição no ranking geral, e o primeiro lugar na categoria “Edifícios”. Lisboa estava em 18º lugar, com resultados particularmente bons nas categorias de Energia e Edifícios. A Siemens também está a contribuir para este esforço. Na cidade de Évora, por exemplo, estamos a cooperar com a EDP Distribuição no projecto-piloto Storage InovGrid, que se baseia num sistema de armazenamento com baterias estacionárias a integrar numa rede de distribuição de energia em média tensão. Este projecto reflecte os benefícios das redes inteligentes, incluindo uma maior eficiência operacional do operador da rede de distribuição.

Quais são os maiores desafios para o desenvolvimento sustentável  das cidades?

A urbanização é, definitivamente, um importante desafio e uma grande oportunidade. Enquanto as cidades crescem, a forma como construímos e gerimos infra-estruturas urbanas nunca foi mais crítica para o desenvolvimento económico e social global. No entanto, estas infra-estruturas encontram-se já sob enorme pressão. Nos mercados emergentes, questões como as falhas de energia e a falta de transporte adequado impedem o crescimento e o desenvolvimento. Enquanto isso, em muitas economias avançadas, as infra-estruturas estão a deteriorar-se. Em 2030, será necessário investir mais de 50 triliões de dólares para manter o PIB mundial e acompanhar o crescimento da população. Na maioria das cidades, comboios, sistemas eléctricos, edifícios, autocarros e estradas quase não mudaram ao longo dos últimos 20 a 30 anos. Foram implementados alguns sistemas digitais, mas estamos ainda no início de aproveitar em pleno o potencial de infra-estruturas totalmente digitais, electrificadas, informadas e inteligentes. A sua plena implementação será fundamental para responder aos actuais e futuros desafios do desenvolvimento sustentável das nossas cidades.

 

 

*O artigo foi publicado, originalmente, na edição #11 da revista Smart Cities. Aqui, com as devidas adaptações.