Depois de um Julho atipicamente ameno, Agosto trouxe consigo uma abrupta onda de calor, com valores recorde de temperaturas máximas alcançados em vários locais do país.

Os espaços noticiosos fazem manchetes alarmadas com os olhos postos nos termómetros. O gelo, as ventoinhas e os aparelhos de ar condicionado esgotam, as filas de trânsito até à beira-mar e beira-rio aumentam, mas continuamos excessivamente concentrados em remediar o problema e muito pouco em antecipá-lo.

Já muito foi dito sobre o assunto, especialmente na relação entre este tipo de fenómenos extremos e as alterações climáticas decorrentes do aquecimento global do planeta. Perante a informação científica disponível, segundo a qual as ondas de calor deverão triplicar dentro de três décadas em Portugal, é muito provável que a ocorrência de ondas de calor intensas e mais prolongadas passe a ser o novo padrão dos verões portugueses (e mediterrâneos). Aumentarão os dias com registo de temperaturas acima dos 35o C e serão mais as noites tropicais em que o termómetro não baixa dos 20o C.

“É necessário investir em planos de adaptação municipal que lancem medidas para prevenir os efeitos das ondas de calor e de outros impactes das alterações climáticas, que variam consoante a cidade em questão”.

Nos grandes centros urbanos, cada vez mais densamente povoados e altamente urbanizados, agudiza-se o chamado Efeito da Ilha de Calor, que se pauta pelo registo de temperaturas mais elevadas no centro das cidades em comparação com áreas circundantes. Tendo em conta que 61% da população portuguesa vive em cidades e assumindo que crescerá ao ritmo global estimado pela ONU de 15% até 2050, a solução não pode passar pela corrida à ventoinha mais barata assim que os termómetros disparam. É necessário investir em planos de adaptação municipal que lancem medidas para prevenir os efeitos das ondas de calor e de outros impactes das alterações climáticas, que variam consoante a cidade em questão.

O mapeamento dos padrões de radiação térmica no território de cada cidade, por meio de fotografia aérea, é uma das medidas sugeridas pelo projeto ClimAdapt.Local, que envolveu 26 municípios portugueses. Este levantamento permitirá um melhor planeamento e gestão do espaço urbano.

Outra medida fulcral passa por valorizar e aumentar a área verde das cidades, escolhendo espécies vegetais resilientes e adaptadas ao clima local. Os espaços verdes são muito mais do que um elemento estético na paisagem urbana e as suas funções vão muito mais além da componente lúdica. A criação de mais jardins e parques verdes urbanos, com árvores e vegetação densa, pode, por um lado, ser uma resposta bastante eficaz no combate ao efeito da Ilha de Calor e também à concentração de dióxido de carbono em zonas muito poluídas. Estima-se que a sombra fornecida pelas árvores consiga reduzir a sensação térmica entre 7º C a 15º C. Por outro, os espaços verdes podem assumir novas formas paisagísticas para além das tradicionais. Os telhados e as paredes ajardinados são exemplos disso, com resultados significativos no conforto térmico dos edifícios, uma vez que protegem os envidraçados, as coberturas e as paredes exteriores da radiação solar. Alguns estudos calculam que o sombreamento através de vegetação pode resultar em poupanças de 20 a 30% na utilização do ar condicionado.

Não sermos reféns da sauna urbana a cada verão exige um tipo de atuação que não pode acontecer só depois de o problema surgir, nem estar à mercê das possibilidades económicas de cada família ou da eficácia dos serviços de saúde locais no atendimento dos grupos vulneráveis. Não podemos continuar a fingir que esta onda de calor foi uma exceção à regra. O caminho, que é longo e leva tempo a percorrer, passa por investir o quanto antes na prevenção e na adaptação, mesmo quando os termómetros baixarem.

As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.