O mundo vive um momento de transformação e, na Europa, as transições energética e digital são prioridades na agenda política. Para lidar com estas mudanças, a União Europeia precisa de definir estratégias transversais e concertadas que garantam a protecção e segurança dos seus cidadãos. O Pacto Ecológico Europeu é um dos instrumentos criados para colocar a Europa na liderança em matéria de energia e clima. Pode um instrumento semelhante aplicado aos dados servir os europeus naquilo que é também a sua soberania digital?
Vivemos tempos de profunda aceleração científica e tecnológica. No domínio digital, essa aceleração provocou uma disrupção nos processos de captura, processamento, armazenamento e transmissão de dados, abrindo novas oportunidades para o desenvolvimento de aplicações e serviços que estão a transformar a sociedade.
A mudança é uma oportunidade para embeber os valores e os princípios nos processos de transformação, colocando a tecnologia ao serviço das pessoas e não permitindo que, pelo contrário, a humanidade seja serva das máquinas, dos algoritmos e de quem os controla.
Para a União Europeia (UE) em particular, como parceria de valores e princípios partilhados, a capacidade de ser relevante e competitiva nos processos de transformação digital sem perder a sua identidade é uma condição de sobrevivência.
A UE tem de fazer face a dois desafios cruciais. Em primeiro lugar, permitir que os seus centros de investigação, empresas e serviços públicos acedam aos dados para o desenvolvimento de conhecimento e de produtos e soluções sem pôr em causa os direitos de protecção e privacidade consagrados na sua legislação. Em segundo lugar, conseguir ser competitiva globalmente através da diferenciação.
“Esta troca de acesso aos dados pelo acesso a serviços com valor específico para as pessoas constitui a base do pacto europeu de cidadania pelos dados que proponho.”
Para conseguir isso, é necessário um pacto europeu de cidadania pelos dados. Este não será o primeiro pacto europeu para dar sustentabilidade a uma transformação tecnológica e social de grande impacto. Para fazer face às alterações climáticas e liderar a transição energética, a UE lançou um Pacto Ecológico (Green Deal), no qual, através da aposta nas energias renováveis e na eficiência energética, se compromete a entregar aos cidadãos mais qualidade de vida, mais segurança e mais e melhores empregos.
Na transição digital, para que os cidadãos aceitem disponibilizar os dados que geram para alimentar a ciência, a indústria e os serviços, é preciso que lhes sejam proporcionadas garantias de segurança no uso desses dados e lhes seja disponibilizado um acesso generalizado a serviços de qualidade e úteis para melhorar a sua qualidade de vida. Esta troca de acesso aos dados pelo acesso a serviços com valor específico para as pessoas constitui a base do pacto europeu de cidadania pelos dados que proponho (Citizenship Data Deal).
Em muitas latitudes, o acesso aos dados é mais fácil, automática em muitos casos ou sem restrições legais noutros. Terá a UE capacidade de competir na nova sociedade a Gigabits sem colocar em causa a sua identidade digital? Haverá uma forma de sair da cauda do pelotão, mesmo que seja da cauda do pelotão da frente? Acredito que sim. Os serviços e soluções para os cidadãos terão cada vez mais mercado num mundo em que só essa conexão entre as instituições, as empresas e as pessoas pode evitar o controlo despótico proporcionado pela tecnologia e valorizar a cidadania, a democracia e a qualidade de vida.
As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.