Se, há 20 anos, estávamos a dar os primeiros passos na reciclagem, aprendendo a regra do amarelo para o plástico/metal, do azul para o papel/cartão e do verde para o vidro, hoje, a recolha seletiva dos resíduos sólidos urbanos extravasa a simples lógica do ecoponto.

Em muitas habitações, já se arranjou espaço para um quarto recipiente, destinado a acolher tudo aquilo que não são resíduos de embalagem e que diz respeito à fração orgânica do lixo que produzimos diariamente. Parecendo que não, esta última ocupa 40% do nosso caixote, o que demonstra o potencial desaproveitado ao não existir, na maioria dos casos, a recolha seletiva dos resíduos orgânicos. Este potencial ganha mais expressão quando pensamos em habitações com área de jardim ou horta, que tendem a gerar mais resíduos orgânicos que podem ser tratados de modo biológico na compostagem ou valorizados através da produção de energia.

Sem dúvida de que se pode sempre incentivar o cidadão a desenvolver o seu compostor caseiro e a produzir o seu próprio fertilizante, mas o certo é que nem todos o quererão ou poderão fazer. Daí que a solução de fundo passe pelos municípios adaptarem os seus circuitos de recolha porta-a-porta já existentes para possibilitar a recolha específica da fração orgânica dos resíduos. Dado esse passo, o chamado lixo indiferenciado tenderá a ser cada vez mais residual, bem como o volume de resíduos urbanos com destino a aterros ou à incineração.

“Uma das ideias motrizes da economia circular é, precisamente, a transição para sistemas de gestão de resíduos em que estes não sejam encarados como o culminar de um processo, mas, sim, como o início de um novo ciclo, graças ao seu potencial de transformação e reincorporação na cadeia produtiva enquanto ‘nova’ matéria-prima”.

No lote de metodologias que já provaram tornar mais eficaz a recolha seletiva dos resíduos urbanos está o sistema porta-a-porta, em que, como o nome indica, os resíduos são colocados pelos moradores à porta da sua residência em contentores específicos para o lixo indiferenciado, o plástico/metal e o papel/cartão, de acordo com dias pré-definidos. Apenas a recolha do vidro é feita no ecoponto. Este é um sistema com uma taxa de recolha de recicláveis comprovadamente superior à dos ecopontos e menos invasivo para o espaço público. Adicionalmente, ao incluírem a recolha dos recicláveis nos circuitos de recolha já existentes do lixo indiferenciado, os municípios reduzirão os custos e as emissões poluentes associados à circulação das viaturas da limpeza urbana.

Algumas cidades, como Funchal e Guimarães, já foram mais longe e implementaram o sistema pay as you throw (PAYT), em que a taxa paga pelos munícipes relativa à recolha dos resíduos sólidos urbanos é agravada ou bonificada em função da quantidade de lixo produzida ou da correta separação (ou não) das embalagens. Uma solução mais justa que recompensa quem tem um comportamento ambientalmente mais correto.

Uma das ideias motrizes da economia circular é, precisamente, a transição para sistemas de gestão de resíduos em que estes não sejam encarados como o culminar de um processo, mas, sim, como o início de um novo ciclo, graças ao seu potencial de transformação e reincorporação na cadeia produtiva enquanto “nova” matéria-prima. Por isso, quanto mais aperfeiçoados, eficazes e abrangentes forem os sistemas municipais de recolha seletiva de resíduos, mais valor acrescentado estaremos a criar. As cidades que mais bem conseguirem fazer esta transição serão, certamente, as primeiras onde a expressão “lixo indiferenciado” deixará de fazer sentido.

As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.