Por:
Elsa Vilares, Direção-Geral do Território, e João Mourato, Institudo Ciências Sociais  

Vinte e oito municípios de todas as regiões de Portugal Continental e Insular apresentaram os seus Planos Locais de Ação Integrada para a Economia Circular, em resultado da sua participação em redes de cidades que se constituíram em 2021, através da Iniciativa Nacional Cidades Circulares – InC2.  

A InC2 foi lançada em 2019 pelo Ministro do Ambiente e da Ação Climática, com financiamento do Fundo Ambiental, com vista a apoiar processos de planeamento local colaborativo e de partilha e co-aprendizagem entre municípios na transição para a economia circular.  

Foram quatro as Redes Cidades Circulares que trabalharam nestes últimos dois anos, com a participação ativa dos oito municípios parceiros e o envolvimento das suas comunidades locais, em torno de quatro temas prioritários coletivamente definidos:   

  • A Rede CAPT2 – Circularidade da Água Por Todos e Para Todos, liderada pelo Laboratório da Paisagem de Guimarães, focou-se na dimensão da circularidade urbana da água e no desenvolvimento de um modelo de governança local participativo, integrando os agentes responsáveis pela gestão da água, mas também os cidadãos como indutores de transformação para um modelo circular e participativo. 
  • A Rede R2CS – Rede Circular para a Construção Sustentável, liderada pela Gaiurb, focou-se na dimensão do urbanismo e construção e na definição de diretrizes de apoio e suporte a todos os intervenientes no processo construtivo das cidades, na procura de um (re)uso sustentável e natural dos recursos potenciando a transição para uma economia circular e de baixo carbono com foco na durabilidade, adaptabilidade e redução de recursos em edifícios e espaço público. 
  • A Rede RURBAN Link – Ligações Circulares entre Áreas Urbanas e Rurais, liderada pelo município do Fundão, focou-se na dimensão das relações urbano-rurais, com o objetivo de promover ligações funcionais circulares entre áreas urbanas e rurais, enquanto alavancas do desenvolvimento territorial integrado e de processos colaborativos de base local, com particular enfoque no sistema alimentar.  
  • A Rede Circularnet – Plataforma para a Circularidade, liderada pelo município da Figueira da Foz, focou-se na dimensão da economia urbana dos resíduos com o objetivo de fomentar medidas que implementem uma economia circular nas cidades, utilizando a sua dinâmica para alteração de padrões de consumo e potenciando a reincorporação de resíduos como matérias-primas, diminuindo necessidade de recursos naturais e impactos ambientais. 


Concretizando simultaneamente medidas do
Plano de Ação para a Economia Circular e do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, a iniciativa, gerida pela Direção-Geral do Território, e com assessoria científica do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, assumiu uma natureza experimental, aplicando metodologias para o robustecimento das práticas de governança territorial e de planeamento local integrado e estimulando processos de reflexão conjunta e partilha e co-aprendizagem entre municípios em torno de desafios complexos comuns enquanto condições essenciais para alavancar a necessária transição verde e justa. 

De facto, a InC2 testou a aplicação em Portugal de uma nova abordagem na cooperação intermunicipal através da constituição de redes urbanas temáticas de planeamento de ação e do incremento da cooperação multi-regional e multinível em torno de uma agenda de transição. Para tal, tomou inspiração e adaptou para a realidade nacional metodologias firmadas em programas e iniciativas europeias existentes: 

  •           Do programa europeu URBACT, a iniciativa adaptou as redes de planeamento de ação e os métodos para a co-aprendizagem interurbana, a participação e envolvimento da comunidade local e o planeamento local integrado;
  •           Da Agenda Urbana para a União Europeia, a iniciativa aplicou as lições aprendidas sobre cooperação multinível, promovendo práticas de acompanhamento e apoio nacional e regional à implementação local de políticas europeias e nacionais.

Vinte e oito municípios das mais diversas dimensões e provindos de todas as regiões do país foram parceiros em uma ou duas destas redes e co-criaram com as suas comunidades locais e com os seus parceiros da rede novos planos locais de ação integrados para a economia circular. A diversidade territorial da composição das redes permitiu aos parceiros conhecer múltiplas perspetivas e abordagens em torno de um desafio comum de economia circular, mas igualmente refletir coletivamente sobre desafios e estratégias conjuntas e de modo relativo sobre as suas contingências e potencialidades.    

Para além dos processos de co-criação e co-aprendizagem de base local promovidos no âmbito das Redes de Cidades Circulares, a InC2 procurou também fomentar a cooperação multinível promovendo o envolvimento das entidades de governação territorial de nível regional e intermunicipal. Desde o momento inicial de desenho e conceção e ao longo de todo o processo de implementação da iniciativa, as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional foram diretamente envolvidas na definição das opções críticas e no acompanhamento dos trabalhos das redes. Na fase de implementação, a integração de representantes dos governos regionais, das associações de municípios e das entidades intermunicipais no acompanhamento das redes e em atividades promovidas pela iniciativa permitiu construir uma estrutura de governança efetiva e fomentar o diálogo multinível de base territorial com vista ao desenvolvimento de sinergias e à concretização do planeamento local de ação para a economia circular. 

Combinando objetivos de transição verde das cidades para a economia circular com princípios de governança multinível, capacitação e participação local e valorização da diversidade territorial, a InC2 procurou contribuir para o aprofundamento da base territorial e de visões integradas do desenvolvimento sustentável e para a melhoria e aceleração dos processos de experimentação e aprendizagem nas políticas públicas orientadas para a transição verde e justa.  

Enquanto instrumento de política de cidades orientado para acelerar a transição verde através da mobilização criativa dos municípios e suas comunidades locais, a iniciativa procurou contribuir num sentido mais amplo para: 

  • Promover ativamente a coerência entre políticas num contexto desejavelmente multinível, procurando sinergias e complementaridades entre níveis de governação, sem um “nível ótimo”, mas inerentemente multinível, para apoiar a tradução no contexto local pelas autoridades e comunidades locais de desafios e agendas europeias e nacionais de transição verde; 
  • Reforçar as capacidades locais para lidar com desafios societais complexos, promovendo processos de experimentação, replicação e co-aprendizagem em rede entre municípios e incentivando o envolvimento de diversos departamentos municipais e das comunidades locais em processos de planeamento local integrado de ação como condições para uma adequada e justa resposta a desafios complexos; 
  • Expandir a cultura e o (re)conhecimento do território na política pública, procurando ir além da coerência vertical de base sectorial das políticas públicas para promover abordagens integradas de base territorial, que promovam o aprofundamento do conhecimento do território e a mobilização das capacidades concretas dos atores em torno de objetivos comuns de desenvolvimento sustentável, num contexto de valorização e reconhecimento da diversidade territorial.  

Dos eleitos e técnicos dos municípios parceiros das redes, até à multiplicidade de membros de cada um dos 32 grupos locais constituídos, aos peritos que apoiaram as redes e a iniciativa, passando pelos representantes do nível nacional, regional e intermunicipal que as acompanharam e apoiaram, a InC2 mobilizou, no decurso dos seus quatro anos de existência, mais de seis centenas de atores públicos e privados para o debate e planeamento em torno da transição urbana para a economia circular.  Foi o esforço conjunto e o trabalho colaborativo e criativo desta multiplicidade de agentes mobilizados para a economia circular e para metodologias de planeamento integrado que traduziu o potencial impacto desta iniciativa no médio e longo prazo enquanto instrumento para a transição verde e justa das cidades e territórios. 

Os resultados da InC2 foram recentemente apresentados numa conferência pública realizada em Lisboa, no dia 24 de Outubro, e em duas publicações síntese que se encontram disponíveis para descarregamento em formato digital no sítio da internet cidadescirculares.dgterritorio.gov.pt. Aqui poderá igualmente consultar os 32 Planos Locais de Ação para a Economia Circular e encontrar informação adicional sobre esta iniciativa.  

 

Este artigo resulta de uma parceria com a DIREÇÃO-GERAL DO TERRITÓRIO e foi originalmente publicado na edição n.º 41 da Smart Cities – Outubro/Novembro/Dezembro 2023, aqui com as devidas adaptações.
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