O BIM (Building Information Modelling) é um novo desafio que impõe metas às autarquias e coloca o sector público num papel crucial para o sucesso no incentivo à mudança. Apesar de estarem no papel de receptor (para licenciamento), as autarquias são um motor de um processo com enormes responsabilidades e, consequentemente, enquanto elementos fundamentais para apoiar um cluster dinâmico.
Em Vila Nova de Gaia, está a ser preparada uma recuperação verde e justa e a Gaiurb, sendo uma das estruturas de pensamento, relacionada com o urbanismo e reabilitação urbana, pretende responder às necessidades do cidadão, mas, ao mesmo tempo, pensar na cidade com medidas específicas que se focam na criação de empregos verdes, investindo em serviços públicos essenciais, protegendo o transporte público, a mobilidade suave, liderando acções em prol da saúde e do bem-estar e devolvendo o espaço público às pessoas e à natureza, apostando na recuperação das ruas e em garantir comunidades locais habitáveis.
Mais do que nunca, conceitos como eficiência de recursos, economia circular e conservação da biodiversidade deverão povoar o quotidiano de qualquer agenda pública. A Gaiurb, em conjunto com o município de Vila Nova de Gaia, compreende que planear a cidade tem impacto na vida de todos e, como tal, além de envolver os cidadãos como fizemos com as sessões participativas do PDM, estudamos soluções de implementação de BIM para o licenciamento de edifícios. Este pode ser um importante momento de optimização de recursos e de agilização na apreciação do processo, mas também facilitador para o técnico que submete o processo de licenciamento. Compete-nos encontrar soluções para resolver e para combater os problemas de raiz e cumprir com o nosso objectivo: realizar um serviço público de excelência.
É um tipo de investimento que não envolve uma aquisição física e é pouco visível, à imagem e semelhança da eficiência energética, e, portanto, torna muitas vezes difícil a concretização pelos decisores. É importante referir que, no nosso país, a digitalização de informações de construção está ainda numa fase embrionária. A falta de padronização, a formação de técnicos, o custo do projecto, o enquadramento legal e a incapacidade de partilhar informações precisas estão a prejudicar a eficácia do BIM.
“Mais do que nunca, conceitos como eficiência de recursos, economia circular e conservação da biodiversidade deverão povoar o quotidiano de qualquer agenda pública.”
É certo que o BIM usa modelos 3D, ricos em informações, baseia-se em processos de trabalho colaborativos para eliminar o desperdício e melhorar a qualidade das informações fornecidas nas fases de projecto e de construção. A capacidade do BIM em reduzir o custo do projecto, encurtar cronogramas, melhorar a compreensão colectiva do projecto e melhorar a qualidade geral do projecto está a potenciar a ferramenta para a fase de arquitectura/especialidades e construção.
O principal catalisador para a transição de um processo CAD 2D para BIM é o reconhecimento da indústria da construção da economia substancial a ser obtida coordenando a construção em 3D vs. 2D, aliás, como foi no passado, quando passamos do desenho em papel para o CAD. Um estudo da Universidade de Stanford identifica que, utilizando o BIM, o processo é até 10% mais económico do que o valor do contrato e com a vantagem de uma redução nos cronogramas até 7%.
No entanto, para além dos benefícios, há dificuldades na implementação. Um dos principais desafios da digitalização está relacionado com a reorganização e renovação dos processos e regulamentos existentes. A melhor forma de abordar este problema passa pela definição de uma estratégia comum para a digitalização, que terá vantagens na interoperabilidade, na optimização de procedimentos e dados, na padronização e boas práticas de implementação, legislação, códigos de contratação pública, credibilização do processo e evidências, que são métodos que, apesar de serem mais caros inicialmente, são potenciadores de uma melhor organização e com payback rápido.
A Gaiurb EM, enquanto entidade pública, tem como objectivo principal simplificar o procedimento administrativo, tornar o processo mais simples de submeter, de analisar e aprovar. Este é um trabalho contínuo – ir ao encontro de boas práticas e tecnologias mais recentes no sentido de tornar um processo mais simples e interactivo. Sinal disso foram o projecto Nopaper e o primeiro prémio no âmbito das smart cities em 2015. Desde 2018, estamos a possibilitar a submissão de projectos em BIM (formato IFC) e estamos em fase de análise paramétrica dos processos para efeitos de apreciação urbanística, assim como a integração em ambiente SIG destes modelos 3D. No final de 2020, demos passos para que o nosso regulamento municipal caminhe cada vez mais para user-friendly nas realidades digitais.
Automatização de processos de licenciamento com BIM, além de permitir a convergência de todo o projecto numa única linguagem, terá como vantagem as verificações automáticas e há, de facto, hoje – fruto dos impactos da pandemia –, uma maior sensibilidade para a automatização e digitalização de processos.
Uma cidade inteligente deve fornecer ferramentas ao cidadão para que este se envolva totalmente na transformação física da sua cidade, dando acesso a informações normalmente mantidas apenas por aqueles directamente envolvidos no processo de arquitectura e construção. Essa abertura também pode ser usada para facilitar a criação de aplicações móveis, por exemplo, um mapa de realidade virtual que oferece modelos de áreas urbanas que podem ser adaptados virtualmente pela comunidade para testar soluções no desenvolvimento urbano.
As possibilidades de envolvimento da comunidade oferecidas pelo BIM ainda não foram totalmente exploradas. É também uma ferramenta fundamental para os técnicos municipais, permitindo um melhor conhecimento e visualização das infraestruturas criadas, oferecendo a oportunidade de diferentes abordagens de planeamento urbanístico.
Tendo em consideração que, em Vila Nova de Gaia, temos evidenciado a abordagem para uma cidade sustentável e uma transição para uma economia baixa em carbono, é importante referir que, além dos benefícios económicos e sociais do BIM mencionados, existem benefícios ambientais. A capacidade de gerir o processo como uma orquestra onde a arquitectura, as especialidades e construção “tocam em sintonia” conduz a uma optimização de processo, o que leva a uma redução significativa de resíduos a ir para aterro, onde as aquisições de matérias-primas são mais precisas. É também relevante na simulação energética e, portanto, na optimização do consumo de energia, o que ajuda à redução de gases com efeito de estufa. Esta gestão de recursos e de energia é fundamental para uma cidade inteligente.
É, no entanto, importante referir que a mudança na forma como se planifica uma cidade orientada para o futuro não se faz apenas com a parte técnica. Essa é só uma parte da resposta, pois só mudamos com a ambição humana, ambição no nosso futuro colectivo numa cidade mais sustentável, inclusiva, participativa e orientada para o crescimento.
Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 32 da Smart Cities – Julho/Agosto/Setembro 2021, aqui com as devidas adaptações.