Cento e vinte municípios europeus vão poder beneficiar de apoio gratuito no desenvolvimento de planos estratégicos de aquecimento e arrefecimento urbano (district heating and cooling; DHC). A iniciativa é do Act!onHeat, um programa financiado pela União Europeia que tem como objectivo a disseminação de projectos de redes urbanas de aquecimento e arrefecimento, incentivando a descarbonização do sector. Trata-se de um sistema de distribuição de energia térmica, sob a forma de vapor, água quente ou líquidos refrigerados, que permite aquecer ou arrefecer os edifícios de um quarteirão, de um bairro ou mesmo de uma cidade.

Até 31 de Julho, os governos locais e regionais, as agências de energia e os urbanistas podem candidatar-se ao aviso lançado no início deste mês, que anuncia a oferta de apoio técnico, através de serviços de consultoria e capacitação. Além disso, prevê também o acesso exclusivo ao Hotmaps e ao THERMOS, dois softwares de planeamento dedicados ao aquecimento e arrefecimento, que poderão ajudar a acelerar as transições energéticas locais.

Além de ajudar 120 municípios a iniciarem, completarem ou melhorarem os seus planos estratégicos, o Act!onHeat vai também apoiar 30 pré-estudos de viabilidade para projectos individuais no âmbito dos municípios e outros 15 com uma análise de performance adicional e apoio ao desenvolvimento de opções de financiamento. Lançado em 2021, este programa é liderado pelo Instituto Fraunhofer, com o apoio da ICLEI Europe, da Eclareon, da TU Wien, da e-think e do CSE – Center for Sustainable Energy.

O consórcio lembra que, todos os anos, a União Europeia desperdiça 2 860 TWh de calor por ano, o equivalente a 11 mil milhões de barris de petróleo e a 650 mil milhões de metros cúbicos de gás natural. Pelas contas da Danfoss (embaixadora do programa), “capturando o calor desperdiçado, a União Europeia poderia poupar 67 mil milhões de euros”. A este argumento junta-se ainda a necessidade de cumprir os objectivos de descarbonização e do REPowerEU, o plano da Comissão Europeia para tornar a Europa independente dos combustíveis fósseis da Rússia.

Uma boa alternativa para Portugal?

Actualmente, existem na Europa mais de 6 mil redes de frio e calor, que representam cerca de 12% das necessidades de aquecimento do Velho Continente. Em Portugal, a primeira infraestrutura deste tipo à escala urbana foi lançada em 1997 no Parque das Nações, Lisboa.

O coração da Rede de Frio e Calor do Parque das Nações é uma central de trigeração (situada no extremo Norte da antiga Expo) que distribui a energia térmica sob a forma de água arrefecida e água aquecida, através de um sistema de tubagens com 90 quilómetros de extensão que chega a mais de 150 edifícios. O conceito de trigeração consiste na produção simultânea de três formas de energia final – frio, calor e electricidade – a partir de uma fonte de energia primária.

Gerida pela CLIMAESPAÇO, esta rede dispensa o uso de equipamentos convencionais de ar condicionado, caldeiras e esquentadores, além de permitir reduzir em 40% as emissões de CO2.

Como explica a empresa, “ao contrário do que sucede nas centrais eléctricas convencionais, aproveita-se todo o calor disponível à saída da turbina, recuperando-se assim uma importante quantidade de energia que de outra forma seria dissipada no ambiente”. Este é, de facto, um dos mais eficientes sistemas de eficiência energética no nosso país, em que a energia “é totalmente recuperada e utilizada para aquecer e arrefecer os edifícios, bem como para produzir águas quentes sanitárias. É também utilizada para outros fins, como o aquecimento de piscinas ou o arrefecimento dos tanques do Oceanário”, pode ler-se no site da CLIMAESPAÇO.

Apesar da rede do Parque das Nações ser uma referência europeia, Portugal continua sem apostar no aquecimento e arrefecimento urbano. Para isso, dizem os especialistas, é preciso sensibilizar o poder político, os decisores e os urbanistas para as vantagens deste tipo de redes, já demonstradas em vários países.

Em entrevista à Edifícios e Energia, Juan Varo López, da consultora espanhola Creara (um dos parceiros do consórcio Act!onHeat), acredita que a reduzida difusão destas redes no Sul da Europa também se deve à menor necessidade de aquecimento desta região. Mas acrescenta que “desenvolvimentos tecnológicos recentes, como o armazenamento a frio, bem como um maior foco no sentido da sustentabilidade e da eficiência energética, tornaram o arrefecimento urbano uma alternativa interessante a considerar no desenvolvimento do planeamento estratégico do aquecimento e do arrefecimento”. Para o gestor de projecto, “isto é particularmente interessante para o Sul da Europa, uma vez que as suas necessidades tendem a estar mais relacionadas com o arrefecimento do que com o aquecimento”.

Fotografia de destaque: © Act!onHeat