A seca e o cenário de escassez obriga a repensar o ciclo da água e pelo país este é o setor que concretiza mais projetos de circularidade. ETAR do Freixo fornece água para reutilizar na lavagem das ruas e dos contentores da zona de Campanhã. Após a fase piloto, projeto das Águas do Porto será alargado a outras partes da cidade. Loulé e Guimarães fazem reaproveitamento a partir da água descartada pelas piscinas municipais.

O depósito de água cor de beringela impõe-se num dos pátios da ETAR do Freixo, no Porto. Por estes dias, a Água para Reutilização que guarda concentra a curiosidade de técnicos, jornalistas e até dos portuenses que perguntam aos operadores da Porto Ambiente sobre a água que lhes limpa algumas das ruas da cidade.

Três carros para lavagem de ruas, equipamentos e contentores da Porto Ambiente enchem diariamente os tanques com Água para Reutilização (ApR), usada para lavar ruas e equipamentos da zona de Campanhã, próxima da ETAR do Freixo. A ApR resulta de água residual urbana tratada para ser usada em fins não potáveis, como atividades recreativas, lavagem de equipamentos ou veículos, controlo de poeiras e manutenção de caudal ecológico, enchimento de autoclismos, água de combate a incêndios e rega com água de classe A, que permite a utilização em espaços públicos.

A primeira unidade de ApR do município portuense resulta de um investimento de 750 mil euros, num processo coordenado a nível nacional pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), e funcionará seis meses como projeto de teste. “A ideia é aproveitar esta fase piloto para monitorizar os valores da água”, explica Rui Quintela, diretor de sustentabilidade da empresa municipal de ambiente do Porto. “Durará seis meses e servirá para fixar equipas, estabilizar a quantidade e a qualidade da água para depois alargar a mais áreas”, acrescenta.

“É uma porta aberta para ser o futuro, neste contexto de combate aos impactos ambientais. A Porto Ambiente quer alavancar esse combate”, afirma Rui Quintela.

“No contexto atual, de seca e de escassez de água, houve indicação para as 52 maiores ETARS do país reaproveitarem a água”, contextualiza Vânia Morais, uma das responsáveis pela estação de tratamento do Freixo.

“É um caminho para circularidade. Usamos tanta água para fins que não são potáveis… Esta é uma água com qualidade”, explica a engenheira que afinou processo de licenciamento para a produção de ApR, juntamente com Cecília Santos. A APA emitiu um total de 20 licenças para produção de ApR.

A água residual urbana tratada é retira de um tanque da ETAR, passa por um sistema de membranas complementar aos reatores biológicos, e é transformada em ApR, explicam as duas técnicas ao mostrar dois goblés, com água antes e depois do tratamento para reutilização. “Esta é uma água com qualidade. Há um programa de monitorização de parâmetros de qualidade rigorosos, para garantir qualidade”, detalha Cecília Santos.

Atualmente, são produzidos cerca de 40 mil litros por hora, o que representa um milhão de litros por dia (1000 m3/dia) de ApR de classe A.

A ApR produzida está apenas a ser utilizada para fins internos, esclarece a Águas do Porto. A empresa está a estudar a possibilidade de definir uma tarifa para este tipo de água e a fazer um estudo de mercado para identificar potenciais interessados na utilização deste produto específico.

À semelhança do que já se faz no Algarve ou em Guimarães, por exemplo, a Águas do Porto está também a estudar a utilização de águas pluviais, modelo que começará a testar “no campus da empresa enquanto laboratório vivo”.

No Jardim das Comunidades de Almancil, em Loulé, testa-se o aproveitamento da água da chuva, um projeto piloto desenvolvido em parceria com a Universidade do Algarve.  O lago está preparado para reter e armazenar água para posterior rega inteligente, diminuindo a dependência de água tratada para consumo humano. O município tem um outro projeto de reaproveitamento da água descartada pelas piscinas municipais, prática também já usada em Guimarães.


Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 41 da Smart Cities – Outubro/Novembro/Dezembro 2023.