A maioria das autoridades locais neglicencia as necessidades dos grupos vulneráveis nos planos de resposta às alterações climáticas. Esta é uma das principais conclusões do estudo europeu “Quality of urban climate adaptation plans over time”, publicado recentemente na revista Nature Urban Sustainability.

O trabalho foi liderado pela Universidade de Twente (Holanda) e contou com a participação de 35 investigadores de vários países, incluindo do LNEG, Laboratório Nacional de Energia e Geologia. Juntos, analisaram 327 cidades europeias, mas destas apenas 167 tinham planos urbanos de adaptação publicados entre os anos 2005 e 2020. Na lista de municípios portugueses, dos nove que serviram de amostra, só Lisboa, Funchal, Porto e Braga publicaram os respetivos planos (até à data da recolha da informação, em 2018).

Analisados todos os dados, o estudo constatou que cada vez há mais e melhores planos de adaptação às alterações climáticas, mas que estes consideram cada vez menos as pessoas vulneráveis, como os idosos, as crianças (ou os seus representantes), os cidadãos com baixos rendimentos ou as minorias étnicas.

“A grande preocupação das cidades europeias tem sido prevenir o risco e as consequências para um grande número de cidadãos, por exemplo ao nível das inundações, cortes de estrada e funcionamento de algumas atividades, como o turismo ou os resíduos. Os municípios tendem a olhar para os habitantes como um todo, não dando especial atenção aos grupos mais vulneráveis”, afirma Sofia Simões, coautora do estudo e coordenadora da Unidade de Economia de Recursos do LNEG. “Por exemplo, quando é dado um alerta meteorológico, há quem não o perceba porque, simplesmente, não entende a língua dos respectivos países ou cidades”, concretizou.

Relativamente às cidades portuguesas, à data da análise, apenas o Funchal não se referia especificamente às pessoas vulneráveis. Já os planos do Lisboa, Porto e Braga abordavam a importância de considerar os idosos, as crianças e as pessoas de baixo rendimento, e estes dois últimos municípios ainda se referiam as pessoas acamadas ou hospitalizadas. Mas apenas Lisboa e Porto apresentavam medidas de adaptação específicas focando estes grupos mais vulneráveis.

Apesar disso, “nenhum dos planos de cidades portuguesas referia o envolvimento de pessoas mais vulneráveis no seu desenvolvimento ou na sua comunicação. Na monitorização da implementação dos planos de adaptação, não estava previsto olhar para estes grupos mais vulneráveis em particular. Mas esta lacuna não se limita apenas a Portugal, uma vez que foi encontrada em quase todos os planos de cidades europeias analisadas”, sublinha Sofia Simões.

O estudo revela também que embora a maioria das cidades europeias identifique bem os riscos a que estão sujeitas com as alterações climáticas, depois não apresentam todas as acções e medidas necessárias para os combater. “Há alguma desconexão entre os riscos climáticos e a abrangência das medidas que são propostas, ou seja, ainda não há uma correta articulação”, diz a investigadora portuguesa.

Este trabalho deu ainda origem a uma ferramenta on-line que calcula os índices de avaliação da qualidade dos planos urbanos de adaptação às alterações climáticas, já disponível através deste link.

Foto de destaque: Unsplash