Meia centena de moradores em Lisboa reúnem-se durante dois dias, 25 de Março e 1 de Abril, para trocarem ideias e formularem propostas para a cidade que serão depois apresentadas à câmara municipal. É o regresso do Conselho de Cidadãos, uma iniciativa da autarquia lançada em 2022 e que, nesta segunda edição, volta a debater as sugestões e pontos de vista de 50 pessoas que vivem na capital.
A selecção dos participantes foi realizada por sorteio, depois te terrem sido enviados milhares de convites (aleatórios) para moradas da cidade, representativos das 24 freguesias lisboetas e da sua diversidade, nomeadamente a nível de género, idade, nacionalidade, freguesia, situação profissional e escolaridade.
“Queremos que este seja um exercício democrático em que os cidadãos têm a oportunidade de contribuir para a vida pública e de trabalhar directamente com os responsáveis políticos para melhorar a cidade”, diz a autarquia sobre esta iniciativa de participação cívica que vai decorrer durante dois sábados nos Paços do Concelho.
15 minutos que inspiram a cidade do futuro
Este ano, o tema principal do Conselho dos Cidadãos é a Cidade dos 15 minutos, conceito desenvolvido pelo professor de urbanismo franco-colombiano Carlos Moreno, segundo o qual os moradores de uma cidade devem ter a uma curta distância todos os serviços essenciais, como escolas, hospitais, comércio, espaços verdes, de lazer e cultura. Para isso, preconiza-se que seja possível chegar até eles (e também ao trabalho) em 15 minutos, seja a pé, de transportes públicos ou através de meios de mobilidade suave, como a bicicleta.
Com esta mudança de paradigma, assente num ideal de proximidade, procura-se combater o uso do automóvel e de outros transportes poluentes, melhorando a qualidade do ar, mas também os serviços, a economia local e a qualidade de vida das pessoas. Mesmo assim, este modelo não é totalmente consensual, com os (poucos) críticos a apelidarem-no de distopia urbana e a defenderem que se trata de uma nova forma de confinamento climático.
O conceito da Cidade dos 15 minutos chegou ao debate político em 2020, quando a presidente da Câmara de Paris, Anne Hidalgo, o utilizou como bandeira para a sua reeleição. Embora se trate de um processo gradual, as mudanças já se fazem sentir na capital francesa, por exemplo com o encerramento de várias zonas ao transito automóvel, nomeadamente em algumas marginais do Sena ou em ruas de acesso a escolas. O objectivo passa também por utilizar as escolas como elemento agregador da comunidade, tornando-as uma espécie de espaço multiusos, aberto à cultura e ao desporto, ao mesmo tempo que se dinamiza o comércio local, em contraposição aos grandes centros comerciais.

Ilustração: Micaël/Câmara de Paris
Várias cidades por todo o mundo já assumiram a inspiração nas ideias de Carlos Moreno, como Buenos Aires, que fecha várias ruas ao fim de semana para receber mercados de bairro e outros eventos, ou Barcelona, com os seus “superquarteirões” sem carros, onde se passaram a privilegiar os grandes passeios pedonais, as ciclovias, os espaços de lazer e as zonas verdes.
Em Lisboa, o conceito também encontra paralelismo em algumas acções, como o Programa Municipal de Comboios de Bicicleta, destinado a capacitar as crianças para a utilização utilitária e autónoma da bicicleta dentro da cidade. Outro exemplo dado pela própria autarquia é o programa “Teatro em cada Bairro”, que “permite criar uma oferta cultural em todas as freguesias da cidade, promovendo espaços de criação artística para os munícipes”. Com este Conselho de Cidadãos, deverão surgir outras propostas do mesmo âmbito, cabendo depois à autarquia a decisão de os concretizar.
Tendo como tema principal a Cidade dos 15 minutos, os participantes do encontro irão debater cinco grandes áreas relacionadas com a proximidade – saúde e bem estar, educação, comércio, cultura e serviços – que servirão de mote a três desafios: “como criar uma oferta mais completa e flexível?”, “como partilhar os recursos disponíveis?” e “como se deslocar de forma mais eficaz?”.
Um ano depois, o ponto da situação
A primeira edição do Conselho de Cidadãos aconteceu em maio de 2022 e teve como tema principal as alterações climáticas. Do encontro saíram cerca de 35 propostas, depois apresentadas à Câmara Municipal de Lisboa. Entre elas estava, por exemplo, o aumento da gratuitidade dos transportes públicos na cidade, o desenvolvimento de projetos de literacia ambiental, o surgimento do cargo de Provedor do Munícipe ou a criação de “um jardim em cada esquina” na cidade, proposta que já começou a ser trabalhada pelo programa Arrefecer a Cidade.
Um ano depois, alguns participantes do evento criticam a lentidão do processo e a alegada falta de diálogo da câmara. Em declarações ao jornal Público, por exemplo, defendem ter sido “usados em marketing político” e dizem-se decepcionados com os resultados práticos que a iniciativa produziu até ao momento.
Mas a autarquia prepara-se para responder com a implementação de uma proposta mediática: a criação de um superquarteirão na cidade. De acordo com o mesmo jornal, a Praça da Alegria servirá de projeto-piloto à ideia, encerrando (inicialmente) ao trânsito um dia por mês, ao domingo, para receber actividades culturais, desportivas e de lazer. É provável que no decorrer do segundo Conselho de Cidadãos seja feito um ponto da situação e apresentadas mais novidades sobre as propostas lançadas na edição de estreia.
Fotografias © C.M. Lisboa