No dia de arranque da COP 28, realizada no Dubai (Emirados Árabes Unidos), a Smart Cities falou com a secretária-geral da Associação de Bioenergia Avançada (ABA), Ana Calhôa, sobre as perspetivas que a cimeira traz ao setor. A responsável defende que o encontro é uma oportunidade para sublinhar a importância dos biocombustíveis e dos combustíveis verdes no caminho para a transição energética e lembrou ainda a necessidade de Portugal diversificar a matriz energética nacional.
Que expetativas tem a ABA para a COP28, nomeadamente no que diz respeito ao setor dos biocombustíveis e combustíveis verdes?
A expetativa da ABA para a COP28 é que haja uma maior consciencialização da importância do mix energético para a descarbonização da economia, da indústria e dos transportes. Esperamos que todas as fontes energéticas sustentáveis tenham um papel relevante nesta COP28, para que todos os países possam cumprir com os seus objetivos de descarbonização, onde os biocombustíveis e os combustíveis verdes façam parte da estratégia para a transição energética. Estas são as fontes de energia mais eficientes para uma mobilidade sustentável, pois permitem uma rápida e justa transição energética dos transportes, promovendo a economia circular e reduzindo a dependência energética de Portugal. Dados do mais recente relatório semestral da ABA, que visa compreender como tem evoluído o setor da bioenergia avançada no país e o que se perspetiva para o futuro da energia sustentável, revelam que o setor da mobilidade continua a ser um dos principais responsáveis pela poluição ambiental.
Sabemos que, nos últimos anos, os biocombustíveis têm sido responsáveis por mais de 90% da redução de emissões de CO2 na mobilidade nacional, mostrando como é importante encarar os biocombustíveis e os combustíveis verdes como alternativas eficazes e aplicáveis não só no setor dos transportes, mas também no doméstico, no industrial ou na agricultura, permitindo-nos reduzir a dependência de combustíveis fósseis, contribuindo para diminuir as emissões poluentes na atmosfera e valorizar o ciclo de vida dos resíduos com potencial energético.
É urgente consciencializar a população para o impacto positivo destes combustíveis de baixo carbono, tendo em consideração os seus resultados extremamente benéficos para o ambiente e para a economia. Estas fontes de energia derivam de resíduos, o que possibilita um maior aproveitamento dos mesmos, ao invés de serem descartados em aterros sanitários ou incinerados. O acesso a biocombustíveis e combustíveis verdes vem ainda comprovar que opções eco-friendly podem ser estendidas todas as pessoas, não tendo de ser necessariamente dispendiosas.
Acredita que na cimeira possa surgir um sinal político de incentivo à bioenergia avançada, como forma de acelerar a transição energética?
Esperemos que sim, acreditamos que o acesso a fontes de energia limpas e a transição energética devem estar na agenda de todos os países, de modo a responder às necessidades de todos os consumidores, sejam eles grandes frotas ou clientes individuais. Para além disto, o incentivo à utilização de biocombustíveis e outros combustíveis verdes é fulcral para garantir o cumprimento das metas estabelecidas pela União Europeia, que preveem a redução em 55% das emissões de gases com efeito de estufa até 2030 e alcançar a neutralidade carbónica até 2050.
É importante dar destaque a este tema, promovendo o acesso à informação e esclarecendo a comunidade para o impacto da bioenergia avançada na transição energética. Neste sentido, para além do relatório semestral que a ABA desenvolve todos os anos com o intuito de informar a população, temos ainda o objetivo de ajudar todos os representantes do setor no seu caminho rumo à descarbonização, para acelerar e atingir a neutralidade carbónica.
Como está o nosso país neste setor e que papel poderá ele desempenhar rumo a uma transição energética mais célere?
Segundo dados do último relatório semestral da ABA, a produção de biocombustíveis em Portugal aumentou 9% de 2021 para 2022, e, no primeiro trimestre de 2023, as matérias-primas mais utilizadas na sua produção foram as residuais, representando mais de 85%, onde os Óleos Alimentares Usados (OAU) representam 61% e as matérias-primas avançadas 25%. Estes OAU são óleos vegetais que já foram utilizados, por exemplo, na confeção de alimentos e refeições, posteriormente descartados e não tendo mais nenhuma utilização possível, caracterizando-se assim como resíduos. Já as matérias-primas avançadas são compostas por resíduos que derivam, por exemplo, de borras de café, margarinas e molhos fora de especificação, entre outros, que são utilizados como fonte para a produção de biocombustíveis.
Ao investir em biocombustíveis produzidos a partir destas matérias-primas residuais, Portugal pode diversificar a sua matriz energética, reduzir a dependência de combustíveis fósseis e trabalhar em prol da independência energética de Portugal em relação à Europa, utilizando energia endógena.
O biometano tem vindo a ganhar espaço na discussão das temáticas energéticas. Qual é a atual situação deste gás, tanto na Europa como em Portugal?
Este gás “verde” é produzido a partir de resíduos e pode ser utilizado também no abastecimento de veículos na rede de consumo, substituindo as fontes de energia convencionais, para além da sua injeção na rede de gás natural.
Na Europa, há vários projetos em desenvolvimento para valorizar o biometano no conjunto de energias sustentáveis, potenciados também pelo plano REPowerEU que, entre outras medidas e objetivos, visa diminuir a dependência energética da União Europeia de fontes fósseis externas e aumentar a produção de biometano de 3,5 bcm para perto de 150 bcm já em 2050. Em Portugal também estamos num bom caminho para esta transição, embora ainda se encontre numa fase muito inicial.