Em algumas comunicações orais de sensibilização sobre as vantagens da utilização da bicicleta que tenho feito, apresento uma imagem da entrada de uma escola, com um parque de estacionamento cheio de bicicletas. Começo por perguntar se alguém sabe onde é a escola. Raramente alguém arrisca a dizer que é uma escola portuguesa. Mas, na realidade, a imagem que mostro é a de um parque de estacionamento de bicicletas de uma escola portuguesa, a escola secundária da Gafanha da Nazaré. Dos 770 alunos que ali estudam cerca de 550 chegam à escola diariamente de bicicleta (dados de 2014). É um caso raro no panorama nacional. A partir desta pergunta e da perplexidade após a confirmação de que é em Portugal, gera-se uma conversa interessante sobre o tema, com a qual me tenho vindo a aperceber de que há um reconhecimento pela maioria das pessoas (adultos e jovens) de que ir de bicicleta para a escola é algo positivo e desejável.
Então, o que nos impede de o fazer? Esta é outra provocação que lanço e de onde surgem impedimentos como: falta de segurança, distância, declive, clima, necessidade de transportar livros e material escolar, horários, condições de estacionamento na escola, etc. Parecem razões óbvias, não parecem?
“Quando um ou alguns pais levam os seus filhos à escola de bicicleta, não estão apenas a tomar uma opção com benefícios directos individuais e colectivos, mas estão eles também a cumprir um papel de agentes de mudança, contaminando ao demonstrar e relembrar através do exemplo a possibilidade de utilizar da bicicleta no dia-a-dia”.
A maioria destas respostas é um simples exercício de imaginação para encontrar os impedimentos que o justificam. A resposta, na verdade e na maioria das vezes, deveria ser: porque nunca experimentei. A experiência possibilitaria listar as dificuldades reais encontradas em cada caso, e, de acordo com a experiência individual de cada um, procurar soluções individuais ou colectivas. Paralelamente, também poderia levar a descobrir uma alternativa possível ou menos complicada do que se imaginava.

Esta pequena passagem das palavras à experiência não é fácil. Encontramos muitas resistências, sendo uma das maiores a de ultrapassar as rotinas familiares já instaladas.
No início de um ano escolar e no regresso à escola após um longo período de férias, é também altura de desenhar e ajustar novas rotinas familiares. Um momento oportuno para experimentar e criar novas rotinas. É normal e socialmente bem aceite que os pais levem os seus filhos à escola de carro, mesmo morando a menos de um quilómetro. Não se espera (socialmente e na generalidade, claro) que seja de outra forma, pois todos o fazem e é uma rotina instalada. Esta tomada de decisão de escolher ir de carro não é uma opção apenas individual e consciente, justificando-se por uma espécie de efeito mimético. O mesmo mimetismo acontece em qualquer escola na Holanda, onde os alunos chegam de bicicleta, como na escola da Gafanha da Nazaré.
Quando um ou alguns pais levam os seus filhos à escola de bicicleta, não estão apenas a tomar uma opção com benefícios directos individuais e colectivos, mas estão eles também a cumprir um papel de agentes de mudança, contaminando ao demonstrar e relembrar através do exemplo a possibilidade de utilizar da bicicleta no dia-a-dia. Acredito que demonstrar esta possibilidade aumenta a probabilidade de mimetismo, potenciando a criação de novos hábitos.
É importante que, neste caso, nas escolas, as bicicletas sejam bem-vindas, desejadas e incentivadas. É fundamental que as escolas relembrem continuamente que a bicicleta é um meio de transporte e que não serve apenas para passeios aos fins-de-semana. Que adiram ou promovam projectos e iniciativas de sensibilização e educação para uma mobilidade sustentável, transformando-os em experiências colectivas e positivas.
É preciso também educar os pais através dos filhos, estimulando-os a serem parte activa na mudança de paradigma para uma mobilidade sustentável.
É, sobretudo, a atitude de experimentar que provoca a mudança.
#CIDADÃO é uma rubrica de opinião semanal que convida ao debate sobre territórios e comunidades inteligentes, dando a palavra a jovens de vários pontos do país que todos os dias participam activamente para melhorar a vida nas suas cidades. As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.