#CIDADÃO é uma rubrica de opinião semanal que convida ao debate sobre territórios e comunidades inteligentes, dando a palavra a jovens de vários pontos do país que todos os dias participam activamente para melhorar a vida nas suas cidades. As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.
A vivência, a consciência, o comportamento e a experimentação do tempo e do espaço do indivíduo na cidade moderna (industrial) foram – e são – elementos condicionados e moldados por uma realidade alienada instituída. Trata-se de uma realidade do urbano, à qual chamamos de ‘realidade do mundo moderno’.
Enquanto conteúdo das relações sociais orientadas por uma lógica do capital, o urbano (re)produz o espaço, organiza o tempo e os indivíduos para a relação produção/consumo e tudo que permeia essa relação.
A construção dessa realidade passou por uma diversidade complexa de elementos que conformaram a sociedade moderna, a ciência moderna, o homem moderno. Elementos que separaram o homem da natureza, o tempo do espaço. Elementos que fragmentaram o saber e a vida através da alienação e da espetacularização, e que contribuem – mesmo que este cenário esteja a mudar – para a criação de uma atitude que reflete a pacificação e o desinteresse por parte do cidadão; uma atitude “blasé”, como escreveu o sociólogo alemão Georg Simmel.
“Ao assumir-se enquanto possibilidade ideal de apoio ao ordenamento territorial e urbano, cabe perceber em que escala essa ‘Cidadania Ativa’ pode representar a intensificação das desigualdades económicas e sociais entre classes, mais especificamente entre uma classe informada e incluída e outra excluída por handicaps desiguais”.
Tem havido, no entanto, nalgumas sociedades contemporâneas, uma reconfiguração no que diz respeito às formas de participação, construção e desenvolvimento urbanos. Os contextos económicos, sociais e políticos de crise, aliados à intensificação das tecnologias e da facilidade do acesso à informação, têm criado pressões – as quais são reforçadas pelas estratégias mercadológicas, pelas políticas globais e locais e pelos meios de comunicação – no sentido de uma maior participação do indivíduo e dos grupos de mesmo interesse nas decisões inerentes ao ‘lugar’, indo ao encontro de uma “Cidadania Ativa”.
Ao assumir-se enquanto possibilidade ideal de apoio ao ordenamento territorial e urbano, cabe perceber em que escala essa “Cidadania Ativa” pode representar a intensificação das desigualdades económicas e sociais entre classes, mais especificamente entre uma classe informada e incluída e outra excluída por handicaps desiguais.
A participação dos indivíduos ou grupos, com interesses comuns, nas decisões à escala local, em que é possível opinar, aceitar, recusar ou negociar com outros poderes decisores, passa por um processo de rotulação e estigmatização, capaz de intensificar os obstáculos à inclusão social, visto a dificuldade das classes sociais desfavorecidas em superarem o rótulo que lhes confere um caráter de exclusão e incapacidade. Esse contexto apresenta, assim, um obstáculo ao exercício da cidadania plena por fração considerável dessas sociedades.
Assim, se se busca a participação dos cidadãos para a construção de sociedades mais justas, equitativas e coesas, é necessário que se faça um esforço no sentido de integrar os grupos mais desfavorecidos na vida municipal, sem o tratamento do “diferente” e a distinção negativa, que podem contribuir para o isolamento, como visto. A par disso, à medida que se reconhecem as especificidades locais e que estas são, também, reflexo e parte comum do sistema da cidade, o sentimento de “nós e eles”, muitas vezes conotado como o “bem e o mal” ou o “capaz e o incapaz”, tende a diluir-se e abre possibilidades para alcançar cada vez mais cidades plenamente cidadãs.