Estamos habituados a ver a nossa cidade transformada em sala de espetáculos, através de diversos eventos, festivais e concertos que ocorrem. Contudo, quando cabe a nós utilizar e ativar o espaço público, retraímo-nos. O afastamento entre o cidadão e o espaço público é cada vez mais notório, sobretudo devido à falta de escala humana e de sentimento de pertença nas cidades atuais.
Vivemos nas cidades sem perceber que somos parte da sua transformação. Parece que tudo está definido, com uma certa função para um determinado uso, e que nos devemos adaptar ao que é normal e habitual. Fazemos sempre as mesmas coisas, nos mesmos sítios e da mesma forma, porque é o normal. Andamos, passeamos e conversamos na rua, mas quase sempre com um destino, um sítio onde chegar. E é aí – na nossa casa, no café, no pavilhão desportivo, na escola, etc. – que vivenciamos experiências capazes de gerar dinâmicas, partilhas e trocas, tais como jogar futebol, estudar, brincar, ajudar os filhos a fazer os trabalhos de casa, tomar café com os nossos amigos, etc.
“Cada um de nós pode ter um poder metafórico na vivência da cidade, de forma simples, sem grandes custos e com grandes benefícios para toda a comunidade”.
E se a rua deixasse de ser apenas a ligação entre o ponto A e o ponto B, transformando-se no nosso destino?

E se organizasse um encontro com os vizinhos na rua do seu bairro? Poderia dar uma aula de tango, oferecer um café, organizar uma churrascada e proporcionar um momento de encontro e partilha entre a comunidade. Já imaginou se voltássemos a ter as ruas invadidas por crianças? Ao brincar livremente, elas iriam reforçar a sua criatividade, independência, comunicabilidade, incentivando à retoma de relações de vizinhança. Ou, ainda, o que seria se transformasse a escadaria do seu bairro num verdadeiro palco cívico? Bastavam algumas pinturas e escorregas para que um espaço utilizado apenas por necessidade se transformasse numa atração da cidade.
Tudo isto é possível e muito simples. Existem associações, organizações e coletividades que têm desenvolvido iniciativas como estas, capacitando e demonstrando à comunidade a sua importância para a criação de cidades mais inclusivas, colaborativas e construídas para e por todos.
Por exemplo, no Reino Unido, a organização Playing out promove espaços para brincar, fechando a rua do bairro por algumas horas. Simples não?
Já na Holanda, com a tomada de consciência do impacto que um banco público tem no desencadeamento de encontros e conversas espontâneas, a Benches Collective desenvolveu uma plataforma que permite a qualquer cidadão agendar uma atividade, um open air café ou testar conceitos de placemaking em espaço público. Um mar de oportunidades para usar e abusar do nosso espaço comum!
No Brasil, ativar a cidade pela mão do cidadão é a bandeira do Cidade Ativa, um projeto que desafia a comunidade a transformar espaços da cidade. O âmbito de intervenção deste projeto é vasto, tendo como objetivos reconhecer, cocriar e informar os cidadãos. Desde leituras urbanas, campanhas de sensibilização, palestras e workshops, até intervenções simples e participativas em escadarias públicas, que revelam o seu potencial como espaço de circulação e de permanência na cidade.
Estes exemplos comprovam o poder metamórfico que cada um de nós pode ter na vivência da cidade, de forma simples, sem grandes custos e com grandes benefícios para toda a comunidade.
Acredito profundamente que se torna cada vez mais importante o retorno à cidade, à praça e à rua! Por essa razão, gostava de lhe lançar um desafio: Comece por revolucionar a sua rua e verá que toda a cidade se transformará!
#CIDADÃO é uma rubrica de opinião semanal que convida ao debate sobre territórios e comunidades inteligentes, dando a palavra a jovens de vários pontos do país que todos os dias participam activamente para melhorar a vida nas suas cidades. As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Smart Cities.