Em Vila Nova de Gaia, uma iniciativa municipal abriu caminho digital aos requerimentos urbanísticos. Reconhecida como projecto de excelência pelo selo “A smart project for Smart Cities”, o NoPaper já poupou à autarquia 500 mil folhas de papel A4.

“Um folhear eterno de papelada, hesitações, demoras, todo um trabalho irregular, rangente e desconjuntado”, já escrevia Eça de Queirós, no romance Alves & Companhia, sobre a burocracia das instituições públicas. Rompendo com a tradição portuguesa de queixas sobre procedimentos administrativos, a autarquia de Vila Nova de Gaia ambiciona um ponto final nos documentos em papel em matéria de gestão urbanística. Lançado em 2013, o projecto NoPaper tem conseguido levar a câmara municipal à desmaterialização de processos.

Na prática, trata-se de um sistema que permite tratar de requerimentos urbanísticos de privados, por via digital, anteriormente apenas disponíveis nos serviços presenciais da Gaiaurb – Empresa Municipal de Urbanismo e Habitação. Hoje em dia, por exemplo, é possível pedir um licenciamento de uma nova construção em formato digital, de forma mais rápida e intuitiva. As vantagens, essas, são para os munícipes – menos tempo perdido, maior flexibilidade na entrega dos requerimentos –, mas também para a própria autarquia. Isto porque, contas feitas, os ganhos ambientais não são de menosprezar: foi evitada, desde o lançamento NoPaper, a produção de mais de 500 mil folhas de papel A4.

“Para além das evidentes vantagens organizativas, o NoPaper converteu-se num ecossistema em que todos os envolvidos nos processos urbanísticos se sentem confortáveis, poupando tempo e recursos e contribuindo, globalmente, para uma elevada eficiência da gestão urbanística de Vila Nova de Gaia”, considera o presidente da autarquia, Eduardo Vítor Rodrigues. A solução, que tem gerado interesse noutras autarquias e até está em processo de internacionalização em Angola, mais concretamente nos municípios de Cazenga e Sambizanga, em Luanda, faz parte da estratégia da autarquia para uma simplificação generalizada de processos. A partir de uma plataforma de Observatório Social, “associada a ferramentas de gestão como o NoPaper”, será possível “identificar oportunidades de simplificação de processos” promovendo o desenvolvimento sustentável da região, acrescenta o autarca.

100% digital

Mudam-se os processos, adaptam-se os comportamentos. Pelo menos, essa é a conclusão a tirar da adesão do NoPaper por parte dos munícipes de Gaia. Desde Agosto de 2014, todos os novos processos de obras particulares têm sido entregues em formato digital. “Tendo em consideração que o objectivo maior centra-se nos novos pedidos que dão entrada na empresa, os objectivos foram atingidos em pleno”, avalia Ângelo Estrela, responsável pela divisão de tecnologias de informação e comunicação da Gaiaurb. No geral, a contar com os novos pedidos e não só, a taxa de entrega de pedidos digitais ultrapassava os 75% do total, no ano passado. E, ao fim dos dois primeiros anos de NoPaper, cerca de 40% dos 6195 pedidos recebidos na Gaiaurb foram feitos por esta via.

As contas da autarquia são também positivas em termos do tratamento dos próprios processos. Com a recepção dos documentos em formato digital, o tempo da passagem dos pedidos entre serviços diminuiu em 20%, “para pedidos com tramitação total de 20 dias”, indica Ângelo Estrela.

Os ganhos alcançados pelo NoPaper não passaram, por isso, despercebidos a nível nacional. Em Março do ano passado, a autarquia foi uma das seis vencedoras do selo “A smart project for Smart Cities”, atribuído pela Inteli como reconhecimento de boas-práticas de inteligência urbana. E, mesmo sendo este “um motivo de orgulho para Vila Nova de Gaia e um incentivo de enorme importância para as equipas envolvidas”, nas palavras de Eduardo Vítor Rodrigues, não é sinónimo de descansar sob os louros. O projecto avançou para novos desafios.

Depois das obras particulares, a Gaiurb expandiu o ecossistema digital “para as restantes áreas de intervenção da organização”, segundo o responsável de TIC. Mas a ideia é também trabalhar a nível interno, para que os papéis sejam algo do passado, na empresa municipal. “Os trabalhos em curso permitirão que todos os procedimentos internos sejam executados de forma desmaterializada, através da utilização de fluxos de trabalho definidos para cada procedimento”, explica Ângelo Estrela.

A porta está também aberta a uma extensão do projecto a outros procedimentos autárquicos. Segundo o presidente da câmara, “será natural que assistamos à sua introdução noutras áreas de gestão”, já que este “é um sistema muito versátil, repleto de funcionalidades e potencialidades naturalmente aplicáveis a outras áreas”. Depois da experiência bem-sucedida nos requerimentos urbanísticos digitais, a aposta de Gaia na desmaterialização de processos aparenta estar em velocidade de cruzeiro.

Vila Nova de Gaia será um dos municípios que marcará presença na conferência ZOOM Smart Cities, a realizar nos próximos dias 18 e 19 de Maio. 

 

Artigo originalmente publicado na edição #6, aqui com as devidas adaptações.